Em conversa com Alvaro Gribel aqui no Estadão (em 18/11), afirmei que corríamos o risco de transformar em realidade ruim uma sucessão de projeções cada vez mais pessimistas sobre câmbio e inflação, recorrentemente agravadas pela alta dos juros dos papéis do Tesouro americano e pela valorização do dólar no exterior, por choques de oferta e por sinais, cada vez mais claros, de excesso de demanda no sistema econômico.
Os choques de oferta vinham, especialmente, das tarifas de energia elétrica e do custo de alimentação. Os sinais de demanda aquecida decorriam da redução de exportações líquidas e da pressão nos preços de serviços. A robusta expansão fiscal dos últimos tempos, os sinais cada vez mais claros de perda de controle na concessão de transferências previdenciárias e a manutenção de elevados gastos tributários, aqui com a grande contribuição do Congresso na votação de um número cada vez maior de “jabutis”, sugerem que o nó só pode começar a ser desatado por ações mais decisivas na área fiscal.
E tudo se encaminhava, embora lentamente, para isso. Foi quando o presidente da República resolveu apoiar o populismo tão bem captado na frase “gasto é vida”. Desistiu assim de garantir um melhor horizonte para a economia que permitisse maior ancoragem das expectativas e a manutenção da trajetória de crescimento até 2026.
Embora não se saiba ainda o que vai sobrar do esforço fiscal, é certo que a política monetária ficou meio solitária no espaço de ajuste. Nele, o BC reagiu nesta semana com um choque de 300 pontos na Selic.
A questão chave é se haverá alguma ancoragem maior nas expectativas, coisa que só o tempo irá dizer. Mas é certo que continua indispensável um avanço na área fiscal, sob pena de continuarmos com este desarranjo. Temos de aguardar para saber o que será, afinal, aprovado no Congresso.
Seguro mesmo é que o crescimento do PIB irá desacelerar de forma expressiva. Isso porque, além de menor concessão de crédito novo, decorrente da elevação do risco, o que mais me preocupa é o mercado de capitais.
Nos dois últimos anos, assistimos a uma grande expansão dos fundos de crédito privado lastreados por inúmeras debêntures corrigidas pelo CDI. O custo financeiro desse passivo ficará insuportável para muitas empresas.
Ao mesmo tempo, o aumento do endividamento das famílias seguramente levará a uma elevação da inadimplência e à redução de novas safras de crédito para bens duráveis e automóveis.
Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.