Há tempos o setor elétrico brasileiro vem vivendo dias tumultuados, como resultado de decisões equivocadas tanto na legislação quanto na regulação executiva.
Apenas para recordar, a MP 579, de 11/08/12, alterou a regulação do setor e impôs uma insustentável redução de 20% nas tarifas, que resultou numa aguda perda no caixa das empresas. Esta levou as companhias a se protegerem com grande número de liminares, que resultaram na paralisação da liquidação das operações normais de compra e venda de energia. Configurou-se, então, um impasse, que só foi resolvido pela garantia dada ao setor na tomada de empréstimos para liquidação das operações. A dívida, então, foi transferida ao ilustre consumidor com a criação de um encargo tarifário que foi pago ao longo do tempo.
O caminho para acomodar a má regulação foi aberto: cria-se um encargo novo, vire-se o consumidor. A partir de então, uma robusta safra de “jabutis” começa a tumultuar mais o setor.
Nada mais exemplifica o que estamos dizendo do que os objetos estranhos incluídos na Lei da Privatização da Eletrobras: a prorrogação dos contratos do ProInfa, que contém estímulos que existem desde o tempo do racionamento de energia (2001/2002), concedidos a setores que já amadureceram e que deles não mais necessitam (eólica e solar), e a reserva de mercado, até 2GW para pequenas centrais hidrelétricas.
Mas o jabuti-rei é a obrigatoriedade da contratação de 8GW de termoelétricas a gás natural em regiões que não têm gás, gasodutos, mercados e que são exportadores de energia!
Ademais, o gás é do pré-sal, e a lógica mais elementar diz que as usinas deveriam ficar na costa do Rio de Janeiro e que parte do gás deveria ser oferecido para indústria.
O papel da regulação é, entre outros, o de estimular e garantir uma oferta crescente de energia ao longo do tempo. Para tanto, é importante gerar condições para atrair os investimentos necessários para atender o mercado, mas, definitivamente, não se trata de garantir taxas extraordinárias de lucro em certos segmentos, nem viabilizar projetos de precária base econômica. Simplesmente porque o investimento em energia não é um fim em si mesmo, é para servir ao consumo das famílias e contribuir para nosso crescimento, oferecendo tarifas que permitam explorar as vantagens comparativas de um país extraordinariamente rico em fontes sustentáveis de energia, como água, vento, sol, biomassa e outras.
Necessitamos ser um dos líderes na transição energética num mundo em crise e que precisa urgentemente descarbonizar suas atividades econômicas.
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