Juro: após Copom, aposta majoritária para Selic até o fim do ano segue em 10,5%

Expectativa para a taxa básica nos próximos meses divide analistas; a maioria dos ouvidos pelo ‘Projeções/Broadcast’ prevê manutenção do porcentual apesar dos temores sobre a inflação

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Atualização:

O comunicado da reunião de julho do Comitê de Política Monetária (Copom), que manteve a taxa Selic em 10,5%, nesta quarta-feira, 31, gerou avaliações distintas no mercado financeiro. Enquanto parte dos agentes avaliou o tom da comunicação como mais hawkish (austera) do que o anterior, alguns analistas aguardavam um posicionamento mais duro por parte do comitê, dada a deterioração das expectativas de inflação nos últimos meses e a pressão sobre o câmbio.

Ainda assim, o cenário não alterou a mediana das expectativas para o nível da Selic em 2024 e 2025, que seguem em 10,5% e 9,5%, respectivamente. A maioria das casas (24 de 41 instituições consultadas pelo Projeções Broadcast, ou 58,5%) vê o juro inalterado até dezembro deste ano e retomada do afrouxamento monetário em algum momento de 2025.

Os números

  • Após a reunião de julho do Copom, a ampla maioria do mercado (39 de 43 casas, ou 90,6%) prevê que a Selic deve ficar parada em 10,50% até o final do ano. Outras 12 de 41 casas (29%) avaliam que a taxa deve permanecer estável até o fim de 2025.
  • Para a reunião de setembro, todas as 44 casas consultadas preveem manutenção da Selic em 10,50%. O placar da reunião deve novamente ser unânime, avaliam em consenso 25 instituições — as demais instituições não responderam ao questionamento.
  • 24 de 42 casas (57%) projetam que os cortes da Selic devem ser retomados no ano que vem. Apenas uma casa prevê alta da Selic em 2025.
  • A mediana do mercado indica Selic em 9,50% ao final do primeiro trimestre de 2026, período mencionado ontem pelo Banco Central como o horizonte relevante da política monetária.
O Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central manteve o juro em 10,5% pela segunda vez seguida, em decisão da quarta-feira, 31 Foto: Dida Sampaio/Estadão

O que dizem os analistas

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A economista para Brasil do BNP Paribas, Laiz Carvalho, avalia que o BC optou por uma estratégia de “falar menos” no comunicado da última reunião para não se comprometer com movimentos futuros. “Foi algo que já esperávamos, mas parte do mercado tende avaliar como uma comunicação dovish (com ênfase no estímulo a economia), pela expectativa de endurecimento da comunicação”, detalha.

Carvalho destaca que o BC demonstrou que está acompanhando “de perto” os elementos que trazem incerteza ao cenário, como as expectativas de inflação desancoradas e o nível do câmbio, mas que irá segurar a Selic em 10,5% “o quanto puder”. “O BC vai agir com muita cautela”, diz.

Para 2025, a expectativa do BNP é de retomada do afrouxamento monetário, com a Selic encerrando o ano que vem em 9,50% e nesse nível dentro do horizonte relevante, no primeiro trimestre de 2026. Carvalho contextualiza, porém, que o retorno do ciclo de queda da Selic deve acontecer mais próximo do meio do que do início do ano. “Até lá, teremos os bancos centrais dos outros países, principalmente os desenvolvidos, continuando com os cortes de juros”, detalha a economista, que também cita a perspectiva de atividade econômica doméstica menos robusta em 2025.

O economista-chefe da Porto Asset, Felipe Sichel, por outro lado, prevê que a Selic deverá ficar parada no atual nível até o fim do ano que vem. Ele cita que o prognóstico está condizente com um ambiente de atividade doméstica resiliente, hiato do produto se fechando, expectativas de inflação acima da meta e a avaliação do BC de que o juro em 10,5% ainda é restritivo.

O juro nos EUA

Para ele, porém, é importante analisar como se dará o ciclo de afrouxamento monetário nos Estados Unidos, à medida que a retomada do ciclo de queda no juro americano se aproxima. “Uma coisa é o Fed (Federal Reserve, o BC americano) cortar juro porque quer, outra coisa é cortar se precisa”, diz o economista, citando a possibilidade de a economia americana desacelerar além do esperado.

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Este cenário em que o juro americano precisa cair mais rapidamente que o precificado hoje pelo mercado tende, na avaliação de Sichel, a interferir na função reação do BC. Ele aponta que uma economia dos EUA que desacelera mais fortemente, pode, por um lado, trazer riscos também para a atividade doméstica. “Ao mesmo tempo, um Fed que corta mais rapidamente, aumenta o diferencial de juro em relação à economia brasileira”, salienta.

Embora ainda não esteja no cenário-base da maioria das casas, uma possível alta nos juros ainda este ano está no radar de parte dos analistas. Para o economista-chefe para Brasil do Barclays, Roberto Secemski, há uma chance de 30% de haver elevação do juro básico em 2024, dada a “persistente fraqueza” da cotação do real em um ambiente de incertezas fiscais “remanescentes”.

Risco de alta

O UBS BB também vê uma possibilidade de 30% de alta na Selic, mas já na próxima reunião do Copom, em setembro, como efeito do fator cambial e, principalmente, de um fiscal “aquém das expectativas” do mercado. “Como a resposta fiscal teria demorado mais para responder, a política monetária teria de arcar com a carga perdida pela política fiscal”, argumenta o banco em relatório.

Já o estrategista-macro do BTG Pactual Portfolio Solutions, Alvaro Frasson, avalia que o BC já “preparou o terreno” para uma elevação da taxa Selic à frente, mas não se comprometeu com o timing para o movimento. “Nesse sentido, (o comunicado de quarta-feira, 31) pode soar dovish para parte do mercado”, comenta o economista.

A percepção de uma comunicação branda por parte do BC é compartilhada pelo economista Carlos Kawall, sócio-fundador da Oriz Partners e ex-secretário do Tesouro Nacional. Ele prevê juro parado em 10,5% até o ano que vem, mas considera que o viés é de alta. “Se for necessário subir, vai subir. Mas não há sinalização de que farão isso necessariamente”, salienta o economista que avalia que o BC está tomando um pouco mais de risco do que o mercado considera adequado. “Vejo uma tolerância quase excessiva dentro do intervalo de tolerância da meta”, diz.

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