É impossível abordar a sociedade contemporânea sem pensar na assinatura da Declaração Universal dos Direitos Humanos, em 1948. As relações econômicas, sociais e políticas que vivemos hoje são aquelas que emergiram do mundo após a Segunda Guerra Mundial. A própria noção de democracia moderna está intrinsecamente ligada à busca pela representatividade universal.
Embora a Declaração Universal tenha um valor jurídico limitado, não sendo vinculativa para os países, seu valor simbólico é imensurável. Sua assinatura representou um grande momento da humanidade. Naquela ocasião, nações unidas, ainda se recuperando dos horrores da guerra, reconheceram a importância dos direitos humanos como um meio para promover a paz.
É difícil elencar de forma causal a importância da Declaração. É um debate que contrapõe idealismo e materialismo na História. Sem os horrores materiais da guerra, teríamos tido o debate amplo sobre direitos humanos? Mas como teríamos pensado nisso sem que essas ideias tivessem sido incubadas por intelectuais durante séculos?
A recente escalada do conflito entre Israel e o Hamas reacende a importância do debate contínuo sobre direitos humanos. Isso acontece não apenas porque estamos testemunhando os horrores de mais um conflito, mas também devido à intensificação da polarização social, no Brasil e no mundo, no contexto do debate sobre a guerra. A guerra foi inserida no contexto polarizado do debate. Se a representatividade universal é o fundamento das democracias modernas, a polarização ideológica é sua Nêmesis.
Nas redes sociais, todos têm alguma opinião fortíssima sobre qualquer assunto. A cada acontecimento no mundo, nascem milhares, talvez milhões de comentários que subvertem a ideia de especialista. As pessoas não apenas opinam muito, como também discordam bastante.
Muitas vezes, a opinião de alguém sobre uma música, um evento ou uma novela pouco tem a ver com a qualidade percebida da coisa em si, mas, sim, com como “seu” grupo pensa a respeito daquilo. Em um mundo onde todos dão pitaco em tudo, a heurística substitui o pensamento crítico. Gosto da música que “meu” político gosta. Gosto da comida que os “meus” gostam. E odeio todo o resto.
Além dos horrores da guerra, estamos presenciando a contaminação da polarização política em outras esferas ideológicas. É a manifestação mais prejudicial da polarização, em que se defende a vida apenas daqueles que são considerados semelhantes. Como a construção de valores baseados nos direitos humanos, promovidos pela via política, faz falta.
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