Como uma oficina de eletrodomésticos virou uma das maiores revendas de ar-condicionado do País

Com a ajuda de um ecossistema com 1,8 mil instaladores fazendo vendas mensalmente, o Grupo Leveros, de Assis (SP), faturou R$ 1,5 bilhão em 2024 e quer chegar a R$ 2 bilhões no ano que vem

Foto do author Márcia De Chiara
Atualização:

À primeira vista, o nome é estranho: Leveros. A marca de uma das maiores revendas de aparelhos de ar condicionado do País é um anagrama da palavra “resolve”. Ela resume, segundo Tiziano Giordano Pravato Filho, CEO do Grupo e filho do fundador, o objetivo da empresa, que é resolver a vida de quem quer ter em casa um aparelho de ar condicionado funcionando.

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Em tempos de calor extremo, o ar-condicionado virou objeto de desejo dos brasileiros. No ano passado, as vendas bateram recorde no País. Foram comercializados, da indústria para o varejo, 5,88 milhões de aparelhos, com crescimento de 38% em relação ao ano anterior, segundo a Eletros, associação que reúne os fabricantes de eletroeletrônicos.

A Leveros, por sua vez, pegou carona no bom momento do mercado. Encerrou 2024 com faturamento de R$ 1,5 bilhão e crescimento de 35% ante 2023. No final de 2026, quer atingir R$ 2 bilhões. Além da conjuntura favorável à venda do produto, o executivo aponta a mudança do modelo de negócio da empresa para continuar impulsionando esse salto.

A transformação da maneira de comercializar os aparelhos começou em 2018, quando a companhia trocou de nome. A mudança ocorreu dois anos depois que o fundo de private equity 2bCapital, do Bradesco, comprou 49% de participação da empresa. Hoje a família Pravato detém 51% do negócio.

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Na época, a companhia, que se chamava Multi-Ar, faturava perto de R$ 300 milhões por ano e disputava o mercado com grandes magazines na venda de aparelhos de ar condicionado. Era uma concorrência muito focada em preço baixo. Seis anos depois da mudança de modelo de negócio, a empresa faturou cinco vezes mais.

Tiziano Giordano Pravato Filho, CEO da Leveros, criou um ecossistema para venda de aparelhos de ar condicionado apoiado nos instaladores Foto: Werther Santana/Estadão

O pulo do gato, segundo o executivo, foi implementar um modelo de vendas por meio de instaladores. A decisão veio após identificar as dificuldades que existiam na venda.

Ao contrário do tradicional aparelho de ar condicionado de janela, que, para começar a funcionar, basta colocar o fio do equipamento na tomada, o modelo split requer uma venda técnica. Por isso, as lojas de varejo em geral têm muita dificuldade de comercializar o produto. Foi exatamente por causa desse obstáculo que a empresa decidiu virar o modelo de venda e transformou os instaladores em peça-chave do negócio.

Como funciona o modelo

Por meio de uma plataforma, a companhia conecta os seus estoques aos inúmeros instaladores espalhados pelo País. Muitos deles são pequenos empreendedores que não têm recursos para comprar os aparelhos nem poder de barganha para negociar com os grandes fabricantes.

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Ligados à plataforma, os instaladores são treinados pela companhia e vendem os aparelhos com o projeto técnico de instalação. Em troca, recebem da Leveros um porcentual sobre a venda. Os produtos saem dos dois centros de distribuição da empresa que ficam em João Pessoa, na Paraíba, e em Vila Velha, no Espírito Santo, e seguem direto para o instalador que realizou a venda.

Cerca de 4,5 mil instaladores fizeram alguma venda para a companhia no ano passado e perto de 1,8 mil fecham negócios todos os meses. Eles não são funcionários da empresa nem têm obrigação de exclusividade. Mas, na prática, são representantes comerciais da loja.

Além da guerra de preços com o varejo tradicional e das particularidades do mercado de aparelhos split, que exigem instalação técnica, Pravato Filho destaca outro fator crucial para a mudança no modelo de negócio: a constatação de que o custo para adquirir um cliente final era significativamente maior do que o custo para captar um instalador.

“Hoje 60% do negócio é feito por meio de instaladores e 40% são vendas diretas ao consumidor final, por meio de e-commerce (15%), marketplace (20%) e consumidores indo direto à loja física (5%) ”, diz o executivo.

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Na análise do consultor de varejo Eduardo Terra, copresidente do Instituto Retail Think Tank (IRTT), o grande ativo dessa empresa é o ecossistema criado. A parceria com os instaladores, que é um misto dos modelos de franchising com venda direta, permitiu o salto nas vendas. “A base disso é construir boas relações com esses parceiros, que são os instaladores que atuam nos mercados locais”, afirma o especialista.

O risco desse modelo, diz Terra, é exatamente o seu ponto forte. Isto é, não manter azeitada a boa relação com os instaladores, que são a base do sistema. “O difícil é acertar o ponto”, diz Terra. É que o dono do negócio precisa ter resultado e margem, mas precisa fazer com que os participantes do ecossistema ganhem também.

Na análise do consultor, achar esse ponto de equilíbrio nem sempre é fácil. “Esses ecossistemas, às vezes, nas crises, apertam um pouco. Daí, o parceiro começa a perder dinheiro e a rede é desmontada.”

Volta às origens

O modelo de venda de produtos que tem como pilar a instalação de aparelhos de ar condicionado remete às origens da empresa. A Gelo Som foi fundada por Tiziano Giordano Pravato em 1978, em Assis, cidade do interior do Estado de São Paulo. Prestava serviço de manutenção de eletrodomésticos até o início dos anos 2000. Consertava geladeira e outros itens, além de som automotivo.

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“Começamos pequenininhos, meu pai, ele mesmo, consertava de tudo”, diz Pravato Filho. A prosperidade veio com o boom da Brastemp, quando a companhia se tornou um serviço autorizado da marca líder de eletrodomésticos.

Daí em diante, com a chegada dos aparelhos split de ar condicionado, passou a comercializar o produto, fomentada pela indústria. Como a venda do aparelho era técnica, os fabricantes, diante da necessidade de escoar a produção, começaram a dar crédito às empresas prestadoras de serviços para que começassem a revender os equipamentos. Foi assim que nasceu a Multi-Ar.

A partir de 2007, a companhia passou por um processo de digitalização. Abriu um e-commerce e começou a comercializar os produtos em marketplaces do Extra, da Cnova, por exemplo. Agora, no entanto, é cada vez mais uma empresa que depende da venda realizada nos moldes do velho varejo, isto é, na loja tradicional.

A valorização da venda física feita por um técnico tem ligação com o ponto frágil do negócio. Pravato Filho observa que as reclamações do pós-venda na compra de aparelhos pelos consumidores não estão ligadas a problemas do equipamento em si, mas à qualidade da mão de obra de instalação.

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Por isso, a companhia abriu grandes lojas, onde, além de ser possível ver os produtos funcionando em ambientes, existe uma área reservada para treinar os instaladores. A empresa informa que, desde o início da implantação do modelo, já treinou 5 mil instaladores.

Atualmente são quatro megacentros em funcionamento: São Paulo (SP), Ribeirão Preto (SP), Salvador (BA) e Fortaleza (CE). A quinta unidade está prevista para Recife (PE) em julho deste ano, com investimentos de R$ 4 milhões.

Os planos da companhia são ambiciosos no longo prazo. O hub de Recife será o primeiro de 12 programados para os próximos cinco anos, quando a companhia deve dobrar de tamanho, prevê o CEO Para o ano que vem, estão planejadas mais duas megalojas em capitais, provavelmente do Nordeste e do Sudeste.

Até o momento, o crescimento da empresa tem sido com a própria geração de caixa, sem endividamento bancário. O executivo não descarta a possibilidade de abrir o capital e buscar financiamentos para suportar o plano de expansão. “O endividamento e a abertura de capital são encarados como uma janela de oportunidade, olhamos com bons olhos, mas não é um objetivo.”

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