RIO - A confirmação da contratação da consultoria Laplace pela Light, a mesma que cuidou da recuperação judicial da Oi, em um momento em que o mercado ainda digere a crise da Americanas, levantou suspeitas sobre a distribuidora de energia elétrica carioca e sua saúde financeira. A concessão da companhia termina em 2026, e a percepção é que possa estar enfrentando problemas para rolar suas dívidas antes da renovação.
As ações da Light, já abatidas desde a mudança de comando há cinco meses, voltaram a despencar esta semana. A cotação caiu pela metade com a saída de Raimundo Nonato de Castro, em agosto do ano passado. Derreteu ainda mais com a notícia da contratação da consultoria sem comunicado ao mercado, o que a companhia fez na terça-feira, 31, após pressão da Comissão de Valores Mobiliários. Ontem, o papel perdeu mais de 10%, movimento repetido na quarta-feira.
O valor de mercado da Light, que chegou a atingir R$ 4 bilhões há um ano, hoje está abaixo de R$ 1,5 bilhão. O preço da ação da elética caiu de cerca de R$ 10 para um pouco mais de R$ 3 esta semana.
“Quando é feito esse tipo de contratação, o problema está na frente. O mercado viu uma possibilidade da Light não honrar seus compromissos. Mostra que está tendo dificuldade da Light em refinanciar prazos para além de 2026″, avalia o analista da Ativa Investimentos que acompanha a distribuidora, Ilan Arbetman.
Segundo ele, o balanço da companhia referente ao terceiro trimestre do ano passado indica que existe caixa suficiente para pagar as dívidas até 2024, de R$ 8,7 bilhõe , mas ficam mais dois anos em aberto.
“O problema é saber se a concessão vai ser renovada ou não, porque com essa dúvida os bancos não vão querer ficar com esse problema na mão. A renovação da concessão é o ponto chave”, diz o analista.
O analista explica que, principalmente depois da crise da Americanas, a presença do acionista comum às duas companhias, Carlos Alberto Sicupira, dono de 10% do capital da Light, aumentou o estresse do mercado, mas que ainda é cedo para se falar de um real risco financeiro para a distribuidora. A leitura é de que os bancos podem fechar as portas para o acionista, depois do prejuízo oculto que desencadeou a crise da Americanas ter deixado os credores menos tolerantes.
“Tanto na ação da empresa, quanto no crédito, não há dúvida de que as expectativas para os próximos eventos podem não ser dos melhores. O mercado está se preparando para tudo”, concluiu Arbetman.
CVM
Oficialmente, a empresa explicou à CVM que a Laplace vai assessorar a companhia na análise de estratégicas financeiras, visando, principalmente, a apresentar melhorias em sua estrutura de capital. No mercado, porém, a sensação é que o papel derrete porque a entrada da consultoria alerta que o problema pode ser muito maior do que parece. No terceiro trimestre de 2022, o lucro da empresa caiu pela metade, e as perspectivas para os trimestres seguintes também são não são boas, segundo fontes próximas ao assunto.
“O verão é péssimo para a Light, os gatos (ligações clandestinas) aumentam muito por causa do ar condicionado, inclusive de empresas, não só das comunidades. Tem até hotel que nessa época faz gato”, disse uma fonte pedindo anonimato.
Os “gatos”, maior problema da distribuidora, estavam sendo combatidos com força na gestão de Castro, o que agradou o mercado, mas com o novo presidente Octávio Costa, ex-presidente da Tok&Stock, os esforços passaram a visar a revisão da concessão, que se inicia em março deste ano. Na avaliação de outra fonte, tudo indica que a empresa vai tentar antecipar a avaliação da concessão, seja para devolver, seja para renovar. Procurada, a empresa não se pronunciou sobre o assunto.
Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.