O agrônomo, ex-ministro da agricultura, professor emérito da Fundação Getúlio Vargas (FGV) e colunista do Estadão, Roberto Rodrigues rejeitou por 15 anos os pedidos do jornalista Ricardo Viveiros, que queria escrever sua biografia.
Autor de mais de 50 livros, dentre eles 25 biografias, Viveiros caçava personagens interessantes que pudessem render uma boa história. Ele já biografou, por exemplo, o ex-governador de São Paulo, Laudo Natel, o ex-ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Sydney Sanches e o publicitário Rino Ferrari. “Mas o Rodrigues não queria de jeito nenhum”, conta.
Formado pela Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz da Universidade de São Paulo (USP) em 1965, Rodrigues foi ministro da agricultura do primeiro governo de Luiz Inácio Lula da Silva, de 2003 a 2007. Também foi, dentre outras coisas, professor do Departamento de Economia Rural da Universidade Estadual Paulista (Unesp), em Jaboticabal, e também presidente da Organização das Cooperativas Brasileiras e da Aliança Cooperativa Internacional (ACI), o mais importante órgão da atividade no mundo.
Sua contribuição para o cooperativismo foi tanta - foi ele, por exemplo, coordenou o movimento que colocou na Constituição de 1988 um artigo que deu isonomia às cooperativas de crédito em relação ao sistema financeiro - que, no começo desta década, o conselho da Organização das Cooperativas Brasileiras tomou uma decisão, votada por unanimidade: a entidade iria homenageá-lo com um livro. “Aí ele não teve mais como recusar e cedeu. Foram três anos de pesquisa e, pelo menos, 60 entrevistas com familiares, amigos, colegas, professores e especialista”, conta Viveiros.
Roberto Rodrigues, o Semeador - Quem planta colhe! (Editora Disruptalks), tem 400 páginas de histórias, não só da vida de Rodrigues, mas a história de uma época, desde o começo do século 20 até os tempos mais recentes. “Criei uma linha do tempo em que vou contando histórias e o biografado - o Roberto Rodrigues - é um personagem”, diz o jornalista. O livro foi lançado no início do mês e pode ser encontrado nas livrarias.
Por meio da obra, o leitor, além de conhecer a personalidade do ex-ministro, passeia por cenários brasileiros que mostram não só a economia e a política do Brasil, mas o mundo do agronegócio, do cooperativismo e as maneiras da sociedade e os meandros do poder. “Sou proibido por contrato com a editora de dar ‘spoiler’ das histórias do livro”, diz o autor.
Mas, nas páginas de O Semeador, Viveiros relata, por exemplo, como foi a escolha de seu nome por Lula para o ministério, com a missão de criar uma linha de interlocução com um setor da economia que não era - e ainda não é - muito amigo da esquerda. Também relata como foram seus quatro anos à frente da pasta, e sua saída do Planalto. “Ele sempre foi avesso à política. Nunca quis se envolver com o poder. Mas a vontade de criar políticas publicas de Estado, que perdurassem no tempo, e não de governo, o fizeram aceitar o convite.”
No prefácio, o autor mostra já um pouco de quem é Rodrigues, por meio de um acontecido recente. Em 2020, Rodrigues pegou um táxi num dia de chuva, com Carla Freitas, sua companheira há 15 anos. “Estavam acomodados no carro havia poucos minutos, e o motorista não parava de olhar de modo furtivo para o espelho retrovisor interno. Insistia em esquadrinhar o banco de trás, onde estava o casal. O homem não aguentou segurar a curiosidade.
“Com licença”, pediu o motorista, antes de dirigir o olhar a Roberto. “O senhor foi ministro, não é? Rodrigues...”
“Roberto”, acudiu o ex-ministro da agricultura.
O taxista ficou satisfeito.
“Isso! Roberto Rodrigues. Meu pai é um grande admirador seu. Ele tem um sítio no interior do Rio Grande do Sul, e até hoje conta sobre o seu trabalho pelo pessoal do campo.”
Roberto sorriu. Agradeceu a lembrança e pediu ao motorista que mandasse um abraço ao pai.
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Viveiros fala também em Roberto Rodrigues, o Semeador, do dom para diplomacia que o agrônomo sempre teve e exerceu por tabela. “Em sua atuação como autoridade na Organização Internacional das Cooperativas, ele viajou a países em conflito, tanto no Oriente Médio quanto no Leste Europeu, e ajudou a apaziguar crises, como essas que vêm ocorrendo atualmente com os agricultores europeus, que poderiam ter resultado em guerras. E o mais impressionante é que, mesmo em eventos políticos como esses, Rodrigues, ao final, se levantava e cantava. Ele é muito afinado e tem uma voz de Frank Sinatra”, elogia Viveiros.
Rodrigues fica acanhado com tanta admiração. Recusou-se, por exemplo, a falar sobre o livro com a reportagem. “Tenho fugido dessa conversa. Falar do livro é falar sobre mim, e não gosto disso”, disse.
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