Para comiseração de alguns economistas, que não percebem que a vida pode ser mais complexa e saborosa, nem tudo pode ser explicado pelos números. Tomemos a popularidade do governo Lula, por exemplo. Pesquisa da Genial/Quaest agora em setembro mostrou que a avaliação positiva caiu quatro pontos porcentuais em relação ao registro de junho, de 36% para 32%, a pior da série histórica. Isso colocou a nota do governo dez pontos abaixo de agosto de 2023. O porcentual de pessoas que consideram o governo Lula melhor que o governo Bolsonaro caiu para 38%, 22 pontos abaixo dos 60% no início do governo, em fevereiro do ano passado. Nada menos que 41% acreditam que a economia piorou e 61% afirmam que o poder de compra é menor em relação a um ano atrás.
O curioso é constatar que essa avaliação pouco lisonjeira se dá malgrado o suntuoso desempenho do mercado de trabalho. A taxa de desemprego em agosto de 2024 (6,6%) é a mais baixa desde dezembro de 2014. A população ocupada (102,5 milhões de pessoas) é a maior desde que começou o registro, ao passo que a população desocupada é a menor desde janeiro de 2015. Não se trata de emprego precário apenas. O número de pessoas com carteira assinada (38,64 milhões) também é o maior desde que essa estatística é coletada.
O rendimento médio efetivamente recebido cresceu 9,1% até agosto, em relação a igual período anterior – bem mais que a inflação que, pelas contas do Ipea, tem subido menos para as pessoas de renda mais baixa. Em termos reais, o salário mínimo dos últimos 12 meses é o maior da história e 91% mais alto que no primeiro ano da gestão petista, em 2003. Poderia ser um alento para o presidente Lula, mas esses indicadores preocupam o Banco Central e motivarão novas elevações dos juros – se o novo presidente da autoridade monetária mantiver os paradigmas teóricos atualmente adotados.
A pressão maior deverá vir da inflação de serviços. Modelo econométrico simples mostra que mais de 80% da inflação de serviços pode ser explicada pela taxa de ocupação, pela variação do salário mínimo e pela inadimplência das pessoas físicas. Por essa métrica, a inflação de serviços estimada seria de 6,8%, contra 5,2% medidos em agosto. A pressão é latente e deve se manifestar brevemente. A exuberância do mercado de trabalho, fomentada pela lassidão da política fiscal, tem fôlego curto. Isso vaticina uma deterioração ainda maior nos índices de popularidade do governo nas próximas pesquisas. Salvo, claro, aconteça alguma coisa que os números não consigam explicar. A conferir.
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