BRASÍLIA - O presidente Luiz Inácio Lula da Silva já aceitou e entendeu que as medidas em discussão para cortar gastos são estruturais, e é justamente por isso que o processo vem se prolongando nas últimas duas semanas. Segundo interlocutores a par das negociações, as reuniões comandadas pelo presidente já somam mais de 20 horas de debates, envolvendo ministros, secretários, economistas, dirigentes partidários e até sindicalistas.
Lideranças do PT também já admitem que o cenário para a economia é binário, com um forte impacto no dólar, juros, e crescimento econômico em caso de frustração com o pacote. Mas entendem que é preciso uma saída honrosa para o partido, com medidas que atinjam também o “andar de cima”. Isso facilitará a comunicação das medidas, para que elas não recaiam apenas sobre os mais pobres e não sejam vistas como uma traição por parte do eleitorado petista.
O anúncio ainda pode levar alguns dias, porque dependerá não apenas de Lula, mas de conversas entre o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, e os presidentes do Senado, Rodrigo Pacheco, e da Câmara, Arthur Lira. Essa seria a “fase 2″ da elaboração do pacote, que ainda está por vir.
Pessoas a par das negociações dizem, porém, que ninguém sabe exatamente o que será decidido pelo presidente da República, mas garantem que ele está bem informado para definir o que sai e o que fica. Se a discussão envolvesse bloqueios e contingenciamentos, por exemplo, o anúncio já teria sido feito. Como são medidas estruturais, que envolvem muitos anos de governo à frente, Lula se sente no direito e dever de ouvir todos os lados para tomar a melhor decisão, a despeito da pressão do mercado financeiro.
O alinhamento entre Fazenda e Casa Civil já foi tornado público por Haddad, depois de quase dois anos de desentendimentos entre os chefes das duas pastas. Isso dá mais segurança a Lula.
O que está em discussão
O seguro-desemprego em alta, mesmo com o mercado de trabalho aquecido, é um argumento que já sensibiliza integrantes do PT, assim como o fato de que os aposentados do INSS recebem o mesmo valor do salário mínimo de quem tem direito ao Benefício de Prestação Continuada (BPC), mas que não contribuiu para a Previdência.
A ideia em estudo pelo secretário Sérgio Firpo, de só conceder o salário mínimo ao BPC para quem fizer algum tipo de contribuição, é bem vista no PT, porque foca na arrecadação, e não na redução de gastos. Não ajuda a conter o aumento de despesas que forçará o teto de 2,5% do arcabouço, mas contribui para diminuir o déficit primário.
Outro ponto visto como crucial na estratégia de comunicação é conseguir explicar que o governo não está “reduzindo gastos sociais”, mas desacelerando o ritmo de alta. Nesse sentido, estabelecer o teto de 2,5% para o salário mínimo é uma medida palatável, porque dá ao partido o argumento de que a valorização está garantida ao trabalhador, mas de forma sustentável nos próximos anos.
No Ministério da Fazenda, apesar da viagem de Haddad a São Paulo, o sentimento ainda é de confiança, porque há a certeza de que esse ajuste é inevitável. O governo poderá adotar as medidas de forma planejada e negociada, com relativo controle do processo, ou abruptamente, com improvisos, em meio de uma crise de confiança. Isso tem sido levado a Lula.
No mercado financeiro, há ansiedade para o anúncio do pacote, mas também a compreensão de que não é fácil que ele seja implementado por um partido de esquerda. Por isso, a demora nas negociações é tolerada, mas desde que as medidas sejam “estruturais” e não aprofundamento de “pente-fino” como revisão de cadastros e biometria.
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