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Lula tentará protagonismo global mais uma vez em 2024. E poderá ter algum sucesso

À frente do G-20, presidente pode usar janela de oportunidade com economia verde para emplacar agenda internacional

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Foto do author Beatriz Bulla

O ano de 2023 mostrou a Lula que a ambição de se tornar um líder global, capaz de se posicionar como um agente de defesa da paz e da concreta redução das desigualdades ao redor do mundo, não é tão simples. As tentativas do presidente brasileiro para mediar uma solução para a guerra na Ucrânia foram ora ignoradas pelas potências envolvidas, ora fracassadas, com a produção de mais ruído do que de ajuda. Mas 2024 trará uma importante oportunidade ao brasileiro: o G-20. E ele parece disposto a aproveitá-la.

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Com o Brasil na presidência temporária do grupo que reúne as principais economias do mundo, de todos os continentes, Lula até pode ter dificuldade em implementar suas propostas, como é comum em qualquer fórum multilateral. O governo brasileiro, no entanto, tentará decidir quais temas são os mais relevantes para debate pelas economias mundiais, e Lula tentará, aí com mais chances de sucesso, imprimir sua marca.

A tríade de temas eleita por Lula para o G-20 de 2024, que acontecerá em novembro no Brasil, é composta por combate à pobreza, reforma da governança global e desenvolvimento sustentável. O último tópico dá ao Brasil (e a Lula) lugar de líder natural e uma janela de oportunidade para o brasileiro fazer sua voz ressoar mais longe também nos outros dois temas, que estão no coração da sua plataforma política.

Lula assumiu o Planalto com o compromisso de estabelecer o desenvolvimento sustentável como prioridade Foto: Seth Wenig/AP

Há consenso entre empresários e ambientalistas sobre a chance de o Brasil se beneficiar econômica e socialmente das transformações que virão da transição energética e de uma agenda de economia verde. E que o potencial brasileiro, com 80% da Amazônia em seu território, é tão grande que, mesmo largando atrás em regulações, o País tende a surfar bem essa onda.

Após um período no qual o Brasil foi visto como pária internacional quando o tema era preservação ambiental, Lula assumiu o Planalto com o compromisso de estabelecer o desenvolvimento sustentável como prioridade — e ter Marina Silva como ministra foi o selo de confiança esperado pela comunidade internacional. Fernando Haddad também adotou o discurso verde, no plano econômico, para alavancar investimentos. E o governo federal foi bem-sucedido na contenção do desmatamento.

O fracasso da última COP em conseguir uma declaração veemente para suspender gradualmente a produção de petróleo dá a Lula a chance de colocar o assunto de maneira mais assertiva no G-20. O terreno, no entanto, é bastante pantanoso para o governo federal, que precisará tratar com mais clareza o debate da exploração, pela Petrobras, do petróleo na Foz do Amazônia, se quiser convencer sobre sua coerência no discurso ambiental.

Lula tenta o difícil equilíbrio entre a defesa do desenvolvimento sustentável para alavancar sua pauta internacional e o desenvolvimentismo como solução imaginada para o crescimento econômico doméstico.

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O presidente deve cobrar no G-20, como tem feito, que os países ricos cumpram a promessa de destinar US$ 100 milhões anuais para a proteção ambiental, uma cifra nunca alcançada. E isso dá espaço a ele para entrar em suas outras pautas prioritárias.

A primeira, a reforma da governança global. Lula tem argumentado que, se não houver uma mudança no sistema de governança global, os acordos internacionais não serão cumpridos. Isso inclui a destinação de dinheiro à preservação do meio ambiente, mas também passa pela reforma do Conselho de Segurança da ONU e da governança de organismos econômicos como o Banco Mundial e o FMI.

De forma mais discreta, passa também pela ambição de Lula de encontrar moedas de referência para negociações comerciais no sul global, que não o dólar. A desdolarização no comércio é a proposta do presidente para os BRICS, que encontra respaldo na China e na África do Sul, mas resistência da Índia, e uma ideia para o Mercosul.

Iniciativas nesse sentido devem seguir numa crescente em 2024, como forma de apoio a um mundo multipolar — em oposição à disputa por hegemonia entre China e EUA —, e à ambição de Lula de se posicionar como líder do sul global.

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O ônus do fracasso mais recente do desfecho para o acordo comercial União Europeia-Mercosul recaiu sobre os europeus e sobre Javier Milei, embora o governo brasileiro tenha, também, tido sua parcela de culpa. Com o distanciamento dos europeus, o G-20 e as tentativas de desdolarização e formação de coalizões aparecem, portanto, como as mais importantes estratégias de Brasília para assumir destaque na pauta global.

A agenda de combate à pobreza também ganha força com a pauta ambiental. A questão da justiça social a partir da perspectiva climática ganhou importância na última COP e pode ser bem explorada pelo Brasil, se Lula passar a embalar a pauta de combate à pobreza no pacote de cobrança por investimentos em desenvolvimento sustentável e à resiliência climática em nações subdesenvolvidas.

Lula quer colocar todos os líderes à mesa no G-20 de 2024. “Não nos interessa um G-20 dividido”, disse ele. No ano que passou, Xi Jinping boicotou a cúpula, organizada pelo primeiro-ministro indiano, Narendra Modi, este cada vez mais próximo de Joe Biden e mais distante de Xi. O grande teste para o desejo do presidente brasileiro de assumir a liderança da pauta global e o lugar de contraponto à disputa entre EUA e China aparecerá em 2024, portanto, e logo: nas confirmações de presença no G-20 do Brasil.

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