As produtoras de audiovisual brasileiras estão se reorganizando para participar mais ativamente no processo criativo das peças publicitárias. Em vez de meros executores de ideias que chegam prontas das agências, muitas empresas querem criar seus próprios roteiros. E no portfólio delas já há vídeos que foram concebidos dentro de casa diretamente para seus novos clientes – as marcas.
No processo tradicional, as marcas contratam uma agência, que cria uma campanha e contrata uma produtora para executar o filme. “Geralmente o roteiro dos filmes publicitários vem pronto das agências. São casos pontuais em que temos a chance de desenvolver a ideia”, afirmou o diretor de criação da produtora Consulado, André Fiorini. Um deles foi a campanha de fim de ano do Shopping Vale Sul, de São José dos Campos (SP), feita pela empresa. O shopping não tem agência de publicidade e deu liberdade para a Consulado criar.
As produtoras já têm dentro de casa núcleos criativos, que vêm sendo reforçados por ex-diretores de criação das agências. Só na produtora YourMama, cinco dos dez diretores de cena vieram de agências.
Em geral, as equipes de criação atuam na construção de roteiros de séries para a televisão e filmes, segmento que hoje é a segunda fonte de receita das produtoras. Esse filão foi fortalecido após a lei que criou uma cota mínima para a produção nacional nos canais de TV a cabo.
Recentemente, o interesse das marcas em produzir conteúdo, uma tendência conhecida como branded content, trouxe novas demandas aos profissionais de criação das produtoras. “As marcas querem produzir conteúdo. Isso exige uma nova atuação das produtoras e abre um novo mercado”, disse Fábio Pinheiro, diretor de criação da HungryMan. Ele ressalta que a empresa não rouba o papel da agência, de pensar em um posicionamento para as marcas, mas atende a uma nova demanda de mercado.
Na Hungry Man, a demanda por conteúdo para marcas chegou mais forte em 2015. Há projetos em curso como produção de conteúdo para redes sociais de marcas e TVs de bordo de empresas aéreas.
Outra que vem atuando fortemente em branded content é a Barry Company, que tem na sua equipe diretores com experiência em cinema e TV. “As marcas nos procuram para fazer um conteúdo que fuja do formato de publicidade”, explica o sócio da empresa, René Sampaio. “Não substituímos o papel da agência, mas podemos, sim, ser mais atuantes do ponto de vista criativo e multiplicar as ideias.”
Ele cita como exemplo um documentário que a Barry fez para os Correios. Além de produzir um filme de TV a pedido da agência Artplan, a Barry sugeriu para os Correios um documentário com depoimentos dos atletas como peça complementar para divulgar em suas redes sociais.
Saia justa. Ao mesmo tempo em que vender uma peça publicitária diretamente para as marcas parece uma oportunidade, isso também gera um certo desconforto nas produtoras. O motivo é que a maior parte do faturamento delas vem da prestação de serviço para as agências. Na HungryMan, por exemplo, 70% da receita vem das agências, 20% da produção de séries e filmes para TV e cinema e 10% da venda de conteúdo para as marcas.
A YourMama, que tem 90% da sua receita na produção publicitária, diz que evita conflitos de interesse. A companhia já fez vídeos publicitários dentro de casa, mas a maioria foi para marcas que não têm agências de publicidade, como a empresa de malas alemã Rimowa.
Procurada, a Associação Brasileira de Agências de Publicidade (Abap) informou não ter porta-voz para comentar a questão.
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