O Brasil tem a chance, ao sediar a COP-30 em 2025, de restaurar uma nova era de confiança na diplomacia e na governança climática internacional. Ano após ano, as COPs, as conferências climáticas da ONU, têm sido marcadas por um paradoxo aparente: se de um lado, cada vez mais reúnem uma multidão de participantes de setores da sociedade civil; do outro, recebem críticas pela demora na materialização das decisões para frear as mudanças climáticas. O Acordo de Paris, firmado em 2015, anda de lado no seu objetivo primordial, que é evitar que a temperatura média global se eleve acima de 1,5ºC até o final do século. A realidade é que esse marco já foi ultrapassado, e, se os compromissos climáticos não se tornarem mais robustos, a humanidade caminha para enfrentar um aquecimento acima de 2,7ºC.
Outro exemplo da lentidão das decisões por consenso nas COPs é que, apesar das evidências da ciência, foram necessárias 28 edições da conferência para se chegar a um documento que abordasse de forma clara a necessidade de uma transição para longe dos combustíveis fósseis. Isso só foi possível ao final da COP-28, em Dubai, em 2023, mas sem maiores avanços no encontro seguinte, a COP-29, em Baku, Azerbaijão, um país cujo Produto Interno Bruto (PIB) é fortemente atrelado ao petróleo. Historicamente, a contribuição antrópica para as mudanças climáticas começou a partir dos processos de queima de carvão, petróleo e gás natural iniciados na Revolução Industrial.
Como anfitrião da COP-30, o Brasil já assume o papel de influenciar os países signatários do Acordo de Paris na direção de um novo ciclo de compromissos que mantenha viva a ambição do 1,5ºC. Na reunião de chefes de Estado do G-20, em novembro, o Brasil defendeu que as nações apresentem em 2025 suas Contribuições Nacionalmente Determinadas (NCDs) ajustadas com esse objetivo. Na posição de presidente da COP-30, o País terá a incumbência de resgatar o multilateralismo e conduzir os países na direção de um documento final robusto, que coloque o mundo definitivamente na rota da economia neutra em carbono com inclusão social.
Será preciso inovar sobretudo nas discussões difíceis - a principal delas é o financiamento climático. A cifra acordada em Baku, de US$300 bilhões/ano, é insuficiente para os países em desenvolvimento conduzirem sua transição energética e formularem políticas de adaptação aos eventos extremos que já estão ocorrendo - para isso, pleiteiam pelo menos US$1,3 trilhão/ano. O jogo político mudou, as maiores economias globais hoje não são as mesmas de três décadas atrás, quando as discussões sobre quem paga a conta do clima iniciaram, e as altas taxas de juros são um desafio extra na equação. As discussões de Belém terão de refletir essa nova realidade.
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Justiça climática também será um dos temas centrais da COP-30. Primeira conferência realizada na Amazônia, ela terá a cara dos povos da floresta, com um esperado recorde da representatividade de populações tradicionais e povos indígenas - 51% da população indígena do Brasil vive na Amazônia. A troika indígena, lançada na COP-29 e formada por lideranças dos povos originários do Brasil, da Austrália e das Ilhas do Pacífico, se mobiliza para uma participação ativa na organização e na co-presidência da COP-30, e busca ter o reconhecimento prático do papel dos povos indígenas na preservação da floresta. Como país detentor de quase 60% da floresta amazônica e de outros importantes biomas, o Brasil pode liderar pelo exemplo e colocar na mesa soluções únicas envolvendo clima, biodiversidade e conhecimentos tradicionais.
Para fazer Belém acontecer, será preciso o engajamento de todos os setores da sociedade - governo federal, governos locais, cidades, comunidades, iniciativa privada e sociedade civil organizada. Ainda há muito por fazer, com a superação de desafios sociais, logísticos, de infraestrutura, saneamento e conectividade, entre outros. As empresas podem colaborar com muitas dessas soluções, e já se mobilizam para reforçar o diálogo com o governo brasileiro, os governadores da Amazônia Legal e com entidades empresariais globais para construir um caminho ousado, à altura da tarefa que será realizar a COP-30.
A conferência de Belém representa para o Brasil a chance de redefinir o caminho da diplomacia climática, de modo a fomentar avanços concretos, capazes de acelerar o ritmo das transformações que precisamos rumo a um novo modelo de desenvolvimento, com impactos positivos para a natureza e as pessoas. O fato é que não temos tempo para errar: sem uma guinada nesse campo, o mundo caminha para um aquecimento global sem precedentes, e corremos o risco de enfrentar efeitos ainda mais nefastos da emergência climática, com perdas irrecuperáveis.