Uma semana após o início da guerra na Ucrânia, o avanço nos preços de algumas matérias-primas básicas indica que o impacto da inflação no bolso do consumidor deve ser forte. Desde 23 de fevereiro, o petróleo subiu 16,6%, de US$ 96,84 para US$ 112,93 o barril do óleo tipo Brent. Na Bolsa de Chicago, a cotação do trigo aumentou 19,7% (de US$ 8,85 para US$ 10,59 por bushel) e o milho, outros 6,5% (de US$ 6,81 para US$ 7,25 por bushel). Esses são os produtos nos quais Rússia e Ucrânia são mais fortes no comércio global.
A depender do desenrolar do confronto, analistas alertam que o avanço dos preços não deve parar por aí, e o impacto nas cotações dos produtos e de seus derivados no Brasil deve aparecer em breve.
“Tem tudo para piorar o cenário da inflação”, afirma o coordenador de índices de preços do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getúlio Vargas (FGV), André Braz. Ele projetava 5,8% para a inflação deste ano e começa a considerar um índice em torno de 6,2%. Na sua avaliação, os efeitos da guerra e das sanções comerciais sobre os preços deverão ser permanentes até o fim do ano na medida em que o conflito não deve se resolver no curto prazo.
Por enquanto, essa pressão das commodities não foi captada pelos IGPs (Índices Gerais de Preços) da FGV. Ele diz acreditar que a alta do petróleo, grãos, produtos químicos, fertilizantes e derivados deve ficar nítida no IGP-10 deste mês.
Sergio Vale, economista-chefe da consultoria MB Associados, diz que a tendência é de que a inflação deste ano fique entre 6% e 6,5%, apesar de a consultoria ainda estar com uma projeção de 5,8%. “O conflito adiciona um choque que afeta intensamente o preço das commodities.” Na opinião do economista Guilherme Moreira, coordenador do IPC da Fipe, “com certeza” a inflação vai subir. Ele acredita que o efeito da guerra sobre os preços das commodities deve elevar em ao menos meio ponto a inflação do ano. Ele esperava 5,5% para o IPC da Fipe e agora projeta 6%.
A ministra da Agricultura, Tereza Cristina, reconhece que os preços dos produtos agrícolas podem subir. Mas o nível, segundo ela, depende da duração do conflito. “Se a guerra acabar hoje, é um impacto. Se continuar por muito tempo, é outro. Temos de diminuir impactos, achando alternativas”, disse. Ela afirma que haverá abastecimento, ainda que, possivelmente, abaixo do potencial. “Temos certeza e garantia do abastecimento. Vamos produzir. Podemos produzir um pouco menos.”
Trigo
“O mercado está totalmente fora da normalidade, muito especulado porque o conflito acontece na região que mais tem trigo para vender no mundo”, afirma Élcio Bento, analista de trigo da consultoria Safras & Mercado. Ele diz que há muita incerteza. Se o conflito se estender, a cotação poderá ultrapassar o pico de US$ 12,52 por bushel, atingido em 2008, na bolha das commodities. Mas, se houver uma solução, toda essa alta será devolvida rapidamente também, explica.
Por enquanto, a disparada do preço internacional do trigo não bateu na cotação da farinha porque os moinhos estão estocados. “Mas agora vão começar a comprar trigo para o segundo semestre”, afirma o embaixador Rubens Barbosa, presidente executivo da Abitrigo, que reúne a indústria. Barbosa diz que faz dois anos que os moinhos não estão repassando integralmente altas de custo. “Com esse grande aumento, quando os moinhos forem às compras, certamente vai haver pressão.”
Quando o trigo sobe, o milho, que é o grão substituto, vai de carona, observa Paulo Molinari, analista de milho da Safras & Mercado. /COLABORARAM ISADORA DUARTE, LUCIANA DYNIEWICZ E THAÍS BARCELLOS
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