Detentor do sistema de cobrança do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) mais complexo do País, o governo de Mato Grosso tenta emplacar na Assembleia Legislativa um projeto que simplifica o tributo. Na falta de perspectiva de um acordo de reforma centralizada e nacional do principal imposto estadual – e um dos principais desafios para a reforma tributária –, o modelo a ser adotado pode servir de piloto para uma eventual iniciativa dos demais Estados.
Em fase de audiências públicas, a proposta se antecipa à discussão da reforma tributária no Congresso e propõe uma reforma geral na legislação e nas alíquotas do ICMS do Estado, que hoje, de tão complexas, vêm derrubando a participação do imposto no total da arrecadação nos últimos anos.
Pelo projeto, a legislação do tributo é reduzida de 1.000 para cerca de 65 páginas. Além de unificar as alíquotas e implantar o modelo de Imposto de Valor Agregado (IVA) de aproveitamento de crédito, a proposta acaba com a concessão de incentivos tributários, que deflagraram a chamada guerra fiscal entre os Estados.
Depois de aprovada a proposta, incentivos para serem concedidos terão de ser orçamentários, e não via redução do tributo. O projeto prevê alíquota única de 15% (hoje é, em média, de 18%) e outra de 25% para telecomunicações, energia e combustíveis. Atualmente, a alíquota desses três setores é de 35%.
Uber. Por trás do projeto, está a estratégia para que a aprovação da nova legislação em Mato Grosso sirva de modelo e leve outros Estados a seguirem o mesmo caminho, tirando de Brasília o centro das negociações e garantindo mais protagonismo na reforma aos governadores. É a reforma “Uber”, como define o coordenador do Núcleo de Estudos Fiscais, Eurico Marcos Diniz de Santi, autor do projeto e diretor do Centro de Cidadania Fiscal, um grupo de estudos de reforma tributária patrocinado por empresas.
“Como o Uber, o projeto de reforma nasce como uma alternativa, já que há décadas tenta-se reformar o ICMS sem acordo”, explica. O trabalho de consultoria foi doado ao Estado pelo movimento Brasil Competitivo e recebeu apoio do governador Pedro Taques (PSDB). Ele resolveu encampar politicamente o projeto e pretende aprová-lo a tempo de entrar em vigor em 2018.
Segundo De Santi, o projeto foi feito com base em dez premissas. A principal é a de neutralidade. Ou seja, de que não haverá aumento da carga tributária. Segundo ele, há o compromisso do governo em manter a mesma relação atual entre Produto Interno Bruto (PIB) e arrecadação do ICMS. Outro ponto básico é a isonomia, que pressupõe que as incidências da tributação sobre o consumo sejam uniformes em relação a todos os produtos e serviços. Além disso, é premissa que o governo não poderá fazer política industrial ou de redistribuição de renda com tributação sobre o consumo.
Resistência. A proposta está tramitando na Assembleia Legislativa, mas enfrenta resistência principalmente do setor de comércio. Segundo o secretário da Fazenda de Mato Grosso, Gustavo de Oliveira, o governo espera vencer essa barreira com negociação. Segundo ele, alguns segmentos empresariais questionaram a elevação da carga tributária para eles. O governo agora está avaliando todos os problemas que os setores apontaram. O maior deles é que, de quatro empresas no Estado, três estão enquadradas no Simples, sistema que não tem aproveitamento do crédito, premissa do modelo IVA. “Eles questionaram muito que teriam o ônus de pagar os impostos nas compras, mas na venda, na saída, teriam alíquota do Simples sem o aproveitamento”, afirma Oliveira.
Os autores do projeto tentam convencer o governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, a também adotar projeto semelhante para formar um corredor exportador entre Mato Grosso e São Paulo, dando o pontapé inicial para que outros Estados façam o mesmo. Eles avaliam que a mudança pode abrir o caminho para a reforma tributária em 2018 num cenário em que o peso dos impostos será tema central das próximas eleições.
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