BRASÍLIA - A equipe econômica ainda aguarda o aval do presidente Luiz Inácio Lula da Silva para fazer um anúncio de medidas de corte de gastos para reequilibrar as contas públicas e evitar que o arcabouço fiscal entre em colapso nos próximos anos. Na tarde desta segunda-feira, 4, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, irá se reunir novamente com Lula para discutir as propostas. Segundo Haddad, o governo está na “reta final” de ajustes e o anúncio deve sair ainda nesta semana.
A principal ideia do pacote é fazer com que as despesas do Orçamento cresçam no máximo 2,5% ao ano acima da inflação, que é o limite de aumento global dos gastos sujeitos ao arcabouço. Assim, todos estariam “andando na mesma velocidade” - o que evitaria que algumas despesas obrigatórias consumam o espaço destinado a outras, como investimentos e custeio, podendo levar a um “apagão” da máquina pública.
Por isso, uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) deve ser elaborada, o que aumenta a cautela com a redação do texto por parte da equipe econômica.
Em junho, o Estadão revelou que um “cardápio” de medidas com essa trava de 2,5% estava em preparação para ser apresentado ao presidente, logo após um forte movimento de alta da moeda americana. Quatro meses depois, as propostas amadureceram e estão próximas do anúncio.
“A dinâmica das despesas obrigatórias tem que caber dentro do arcabouço. Então, a ideia é fazer com que as partes não comprometam o todo e o arcadouço tenha sustentabilidade de médio e longo prazos, que é hoje a dúvida que provoca as incertezas no mercado. Ah, o que vai acontecer se as despesas obrigatórias continuarem crescendo nesse ritmo? Então, é uma fórmula que permite que esse encaixe aconteça”, afirmou Haddad a jornalistas na última semana.
As despesas com a Previdência, contudo, devem ficar de fora, diante das dificuldades técnicas para impor um limite de 2,5% para esses gastos. Isso só seria possível com alteração na regra de indexação de parte dos benefícios previdenciários à valorização do salário mínimo - o que não deve ganhar a autorização do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
Sobre as emendas parlamentares, o governo emplacou uma proposta para estabelecer o teto de 2,5%, em um projeto do Congresso, e também pode adotar a medida para os pisos de saúde e educação, que hoje estão atrelados à arrecadação.
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A equipe econômica também colocou o Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação Básica (Fundeb) no radar. A participação da União no fundo vai crescer nos próximos anos, em virtude de uma lei aprovada em 2021, que aumenta gradualmente esse patamar.
Uma das medidas em estudo é aumentar a parcela do Fundeb que serve para cumprir o piso da educação. Hoje, apenas 30% do fundo entra nessa conta. Conforme o Estadão mostrou, a medida pode abrir um espaço fiscal de R$ 33 bilhões em três anos. Quanto maior for a porcentagem, maior o impacto.
Outra medida em avaliação é colocar as despesas do Pé-de-Meia - bolsa para estudantes do ensino médio debaixa renda - para dentro do Fundeb, o que livraria o Poder Executivo de reservar recursos extras para o programa, que hoje fica de fora da regra fiscal.
O Benefício de Prestação Continuada (BPC), abono salarial e seguro-desemprego também podem ser redesenhados e ganhar travas para desacelerar o crescimento. Uma das dificuldades da ideia é que, nos últimos três anos, a concessão de BPC pelas vias judiciais triplicou para as pessoas deficiência, saltando de 48,4 mil em 2021 para 155,8 mil em 2024. O governo precisaria encontrar uma forma para endurecer as regras de acesso e fechar essa porta de entrada via decisões judiciais.
No caso do seguro-desemprego, a equipe econômica argumenta que os gastos estão em alta mesmo com o aquecimento do mercado de trabalho, o que indica problemas de desenho no benefício. Segundo o último relatório do Tesouro, foram R$ 52,44 bilhões gastos em 12 meses até agosto, o maior patamar desde maio de 2018, já corrigido pela inflação.
Na semana passada, o ministro do Trabalho, Luiz Marinho, se rebelou e afirmou que “não há discussão” sobre alterações em medidas vinculadas à sua pasta, como abono salarial e seguro-desemprego, “a menos que o demitam”.
“Se nunca discutiu comigo, essas medidas não existem. Se eu sou responsável pelo tema trabalho e emprego, esse debate não existe, a não ser que o governo me demita”, disse Marinho.
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