O início da pandemia fez o mercado de luxo recuar em todo o mundo. As empresas da área encolheram 40% em 2020, indo de um faturamento de 966 bilhões de euros para 581 bilhões de euros, em relação a 2019. O luxo pessoal caiu 22% e o de experiência, o mais afetado pelas restrições, praticamente à metade. Em 2021, o mercado começou a se recuperar e o Boston Consulting Group (BCG) projeta crescimento entre 41% a 50%, no comparativo com 2020.
No Brasil, porém, o movimento deve ser contrário. Apesar de o consumidor ter deixado de comprar fora do País num momento inicial e movimentado as grife locais, agora as lojas devem desacelerar as vendas.
"Há uma perspectiva no mundo de repatriação de consumo de luxo: as pessoas deixam de comprar fora de seus países", diz Flavia Gemignani, diretora do BCG e especialista em varejo e consumo. "O Brasil é o único, dos 10 países que pesquisamos, que tem a tendência oposta."
Em 2020 e parte de 2021, as vendas de lojistas de shoppings de luxo aumentaram no País. "Foi muito associado ao consumo que, antes, era feito fora, passando a ser feito dentro do Brasil", diz ela. As marcas de luxo nacionais também se beneficiaram. O aumento do dólar fez com que seus preços, quando comparados aos das estrangeiras, se tornassem mais acessíveis.
Além disso, diz Gemignani, as marcas internacionais tiveram problemas com importação e falta de produtos na pandemia. Mas as grifes estrangeiras aproveitaram a onda. "Teve uma questão de descasamento do preço do dólar de quando alguns produtos foram importados e de quanto a moeda passou a valer ao longo dos meses", diz ela. Além disso, os lojistas também seguraram as margens para não repassar o aumento do câmbio. "Arrisco dizer que houve aumento de volume de vendas", afirma. "As grifes seguraram os preços e exploraram o parcelamento de do pagamento."
Gemignani afirma ainda que a presença das filiais das grifes estrangeiras no território nacional serve como uma ação de marketing. "A conta que se faz é mais ou menos essa: uma venda aqui, para três vendas lá fora", diz. A lógica é que o consumidor passa a se relacionar e criar desejo pela marca, ao vê-la no shopping local, e a adquire mais quando viaja. Na pandemia, porém, perdeu-se essa perspectiva. "Quando se tira esse link (com as vendas em outro país), para se mostrarem viáveis, essas lojas tinham de ter aumento de volume de vendas", afirma.
No mundo
Segundo o relatório, a recuperação do segmento de luxo no mundo pode não ser suficiente para que retorne aos níveis de antes da pandemia, ainda em 2021. Mesmo com o crescimento, o mercado deve ficar entre 10% a 15% abaixo do resultado de 2019, com queda de até 5% no luxo pessoal e de 15% a 20% no de experiência. A recuperação só deve ocorrer em 2022, com crescimento de 5% na comparação com 2019, o que representaria mais de 1 trilhão de euros em faturamento. O BCG projeta ainda que o mercado de luxo pode faturar 1,22 trilhão de euros em 2025, caso seja mantido o ritmo de crescimento a partir de 2021.
Um dos motores dessa recuperação são os millennials e a geração Z. É a população que mais acredita na recuperação da economia: 53% dizem que será rápida, contra 20% das outras gerações. As faixas etárias mais jovens representaram 39% do consumo de luxo em 2019. Em 2025, serão pelo menos 60%.
O BCG também credita o crescimento ao que chama de efeito rebote: o desejo de consumir o que foi reprimido durante a pandemia. Para a consultoria, China e Estados Unidos vão liderar a retomada. Gemignani afirma também que as faixas de acesso ao consumo de luxo só devem voltar a crescer com uma real retomada econômica que permita a pessoas de classes sociais mais baixas comprarem produtos aspiracionais. De acordo com o levantamento, o grupo de consumidores mais resiliente à crise foi o de renda superior a 20 mil euros por ano, que gastaram em média 17% mais em 2020 - cerca de 70 bilhões de euros contra 60 bilhões de euros, em 2019.
Para o estudo, foram consultados, entre março e abril de 2021, 12 mil consumidores dos 10 principais mercados de luxo do mundo - Estados Unidos, China, Japão, Coreia do Sul, Brasil, Reino Unido, França, Alemanha, Itália e Rússia - com gasto médio de cerca de 33 mil euros por ano. O estudo dividiu o mercado em duas categorias principais: luxo pessoal (roupas, acessórios, joias, relógios, perfumes e cosméticos) e de experiência (hotéis, restaurantes, vinhos e destilados).
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