Indicadores econômicos decepcionantes no fim de 2018 e em janeiro, além da queda de braço entre Executivo e Legislativo adiando a tramitação da reforma da Previdência, levaram economistas a rever suas projeções de crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) para este ano. Na segunda, 1º, pela primeira vez desde que Jair Bolsonaro assumiu a presidência, as estimativas de crescimento da economia ficaram abaixo dos 2%.
Segundo o relatório Focus, feito pelo Banco Central com projeções de instituições financeira, a alta em 2019 deverá ser de 1,98%. No começo de janeiro, a estimativa era de 2,53%.
Mesmo bancos e consultorias que já estão com números menores para o PIB dizem que poderá haver novas revisões para baixo. Para o ex-presidente do Banco Central Afonso Celso Pastore, a tendência é que as projeções comecem a convergir para 1,5%.
“O quarto trimestre de 2018 frustrou. Corrigindo a projeção de 2019 só por causa disso, o PIB viria para 2%. Acontece que o primeiro trimestre foi muito ruim e tem cheiro de crescimento nulo. Então é muito difícil crescer 2%”, disse.
A análise de Pastore leva em conta somente os indicadores econômicos e não as perspectivas para a Previdência. “A aprovação da reforma só criaria otimismo para ter efeito na economia no ano que vem. Para 2019, com ou sem reforma, o quadro é de crescimento muito baixo.”
O economista-chefe da Nécton Investimentos, André Perfeito, é mais pessimista que Pastore e já espera 1,1%. Caso esse número se confirme, o País crescerá pouco mais de 1% por três anos consecutivos – 2017, 2018 e 2019 –, que seguem dois anos de recessão.
De acordo com Perfeito, a expectativa de retomada dos investimentos neste ano tem sido frustrada e piorou após os ruídos políticos recentes, que colocaram em dúvida o avanço da reforma previdenciária. O economista se refere às trocas de críticas entre Bolsonaro e o presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia.
Conforme o debate entre Maia e Bolsonaro foi avançando, a confiança do empresariado foi se deteriorando. Ontem, a Fundação Getulio Vargas (FGV) informou que o nível da confiança empresarial caiu 2,7 pontos em março, atingindo a menor marca desde outubro de 2018. Dados de confiança dos setores da indústria, de serviços e do consumidor também apontam para uma perda de ímpeto.
Viés
Assim como a Nécton, o Banco Fator também está entre os mais pessimistas. A instituição começou o ano prevendo alta de 2,8% na economia, mas reviu para 1,7%. “No geral, tudo está pior do que no quarto trimestre do ano passado. Se há um viés, é negativo”, afirmou o economista-chefe do banco, José Francisco de Lima Gonçalves. Segundo ele, as expectativas dos empresários em patamar inferior ao do fim do ano passado indicam que o nível de investimentos será fraco em 2019, podendo recuar até 0,4%.
Para o economista Alex Augustini, da Austin Rating, a confiança – consequentemente o investimento – deve continuar caindo caso não haja uma mudança no cenário político. “A briga (entre Bolsonaro e Maia) mexeu com as expectativas de crescimento da economia. À medida que o tempo passa e não há encaminhamento da reforma, as expectativas se reduzem e o investimento vai minguando”, afirmou o economista, que “muito provavelmente” reduzirá sua estimativa atual, de 2,6% – uma das mais altas do mercado.
Para Fabio Ramos, economista do banco UBS, a aprovação da reforma previdenciária indicaria que o governo é capaz de se organizar e de discutir no Congresso outros pontos importantes para a economia, como a reforma tributária. “Isso faria o mercado externo apostar no Brasil.”
O UBS começou 2019 prevendo uma alta de 3% no PIB e já atualizou o número duas vezes. Agora, a estimativa é de 2,4%. “O cenário econômico do começo do ano era de uma aprovação rápida da Previdência. Agora, se percebeu que não é tão fácil. Há um conserto no nível de otimismo”, acrescentou Ramos. /COLABORARAM ANDRÉ ÍTALO ROCHA, ALTAMIRO SILVA JR, DANIEL WETERMAN e MATEUS FAGUNDES
::: 3 PERGUNTAS PARA :::
Lucas Nobrega, economista do Santander
1. O Santander reviu sua projeção de PIB para 2019 de 3% para 2,3%. Por quê?
O primeiro fator é o resultado do ano passado, que foi menor do que se esperava e gera um efeito estatístico. Depois, a indústria está mais lenta, em parte por causa da Argentina, que é uma grande importadora, e também devido ao acidente da Vale em Brumadinho, que tem um impacto menor, mas também afeta. O terceiro fator é a retomada da confiança, que esperávamos que fosse mais rápida.
2.O Santander está com uma estimativa maior que a mediana do relatório Focus, de 1,98%. Há possibilidade de revisão no curto prazo?
Por enquanto, mantemos a projeção, mas o viés é negativo. A velocidade (de crescimento do PIB) no primeiro trimestre deve continuar como no fim de 2018, que é um ritmo lento. Quatro fatores poderiam acelerar a economia: o consumo das famílias, o gasto do governo, os investimentos e o setor externo (exportações). O governo não vai aumentar os gastos, nem é bom que faça (dada a crise fiscal).No setor externo, o cenário também é desafiador. O resultado é que ficam apenas duas pernas, mas o investimento está muito ligado à aprovação da reforma da Previdência. Foi esse ponto que motivou a maioria das revisões de estimativas.
3. Enquanto a reforma não for aprovada, a economia estará, então, com apenas o consumo das famílias funcionando como propulsor?
O crédito tem impulsionado o consumo, mas o desemprego ainda é alto e vai demorar para diminuir. Acelerando de verdade, nem o consumo está.
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