Depois da divisão do Copom na reunião de maio, na qual quatro diretores indicados pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva abriram divergência e votaram pelo corte maior dos juros, o mercado financeiro entende que o encontro de junho será decisivo para a credibilidade do Banco Central.
Desde 8 de maio, quando a Selic caiu para 10,5%, as expectativas de inflação para 2024 subiram de 3,73% para 3,8%, enquanto para 2025 foram de 3,64% para 3,74%. Em ambos os casos, as projeções ficaram mais distantes da meta de 3%, o que indica perda de confiança na autoridade monetária.
Economistas e investidores ouvidos pelo Estadão estão divididos sobre se o BC fará uma parada técnica nos cortes de juros ou se irão votar por mais uma redução de 0,25 ponto porcentual (pp.). Mais do que a decisão, porém, o que será analisado com lupa serão as escolhas dos diretores Gabriel Galípolo, Paulo Picchetti, Ailton Santos e Rodrigo Alves Teixeira, os quatro indicados de Lula.
Daniel Miraglia, economista-chefe da Integral Group, entende que a próxima reunião será determinante na batalha das expectativas. Ele avalia que os novos diretores terão em mente que manter a divergência levará a um aumento dos juros longos negociados pelo mercado, com impacto direto sobre os empréstimos de longo prazo, como os financiamentos imobiliários.
Leia também
Isso também levaria ao risco de novas altas da Selic em 2025 e 2026, um calendário mais próximo ao das eleições presidenciais. Por isso, ele acredita que a Selic vai parar de cair, em decisão unânime, como uma espécie de freio de arrumação na política monetária.
“Na época do Alexandre Tombini (presidente do BC no governo Dilma Rousseff), ele baixou muito a Selic, o mercado achava que ele estava errado, e o custo do dinheiro explodiu. O efeito sobre o crédito foi o contrário. Entendo que os diretores sabem disso e terão que ser duros em excesso agora”, disse.
Ele avalia que os sinais dados pelo diretor de Política Monetária, Gabriel Galípolo, já têm sido nessa direção. Galípolo é o principal cotado para assumir a presidência do Banco após a saída de Roberto Campos Neto, em dezembro. Com a indicação de mais três diretores por Lula até dezembro, o Banco Central no próximo ano terá sete dos nove indicados pelo atual presidente.
“Entendo que o Galípolo já tem demonstrado o que eles vão fazer. Desde a ata (da reunião do Copom), ele vem adotando tom mais duro em relação à inflação. Acho que vão ter que ser mais duros do que o necessário, em junho, dado o que ocorreu em maio. Meu cenário básico é de decisão unânime, com parada nos cortes, para mostrar força”, afirmou.
O professor Luiz Roberto Cunha, da PUC-Rio, avalia que o cenário de inflação permite mais um corte de 0,25 ponto na Selic, em junho. Os chamados núcleos (que excluem itens mais voláteis) do setor de serviços estão bem comportados, sem mostrar aceleração. Porém, como vem crescendo as apostas no mercado pela interrupção nos cortes, uma nova divergência poderá ter um efeito ainda pior sobre as expectativas.
“Uma decisão de parar de cortar, como parece ser a posição predominante no mercado, vai significar outra divergência no Copom, e desta vez até um ruído maior por parte do Lula e do PT. Isso vai ser muito pior para o mercado e para os longos meses de mandato do Roberto Campos Neto no cargo”, afirmou.
Luis Otávio Leal, do G5 Partners, aposta em redução em 0,25 ponto da Selic, em decisão unânime, ou no placar de 7 a 2, com divergências feitas pelos diretores Diogo Guillen e Renato Gomes, considerados mais conservadores dentro do colegiado.
“Entendo que os quatro diretores indicados pelo Lula já abraçaram um discurso mais duro, e não há como voltar atrás no curto prazo. Ainda acho difícil que o Copom tenha maioria para parar de cortar. Ou vai ser unânime ou vai ser 7 a 2 pelo corte”, explicou.
O economista-chefe da Acrefi, Nicolas Tingas, subiu sua projeção para a Selic de 9,75% para 10%, por isso, ainda prevê mais duas quedas de 0,25 ponto na taxa básica de juros. Ele enxergou a divisão na última reunião como um posicionamento político dos quatro diretores, mas entende que haverá uma busca pela convergência agora.
“Qualquer que seja o próximo presidente do Banco Central, é operacionalmente danoso começar um mandato após um conflito expressivo. Entendo que seja melhor já mitigar isso agora”, afirmou.
Na reunião de maio, o Banco Central cortou a Selic de 10,75% para 10,5%, mas com um placar dividido, com cinco votos dados por diretores herdados do governo anterior, em 0,25 pp, contra quatro votos dos diretores indicados pelo governo atual, em 0,50 pp.
Na ata da reunião, esses quatro diretores afirmaram que o cenário havia piorado, mas que era preciso seguir o “guidance”, ou indicação dada na reunião anterior, sob pena de perda de credibilidade na comunicação oficial do banco. A decisão provocou ruído entre os investidores, que passaram a temer que o BC, sobre o governo Lula, seja mais leniente no combate à inflação.
Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.