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Opinião|Mercado regulado de carbono para já

Instituição de um mecanismo de precificação em solo nacional configura um dos principais instrumentos regulatórios na necessária transição para uma economia de baixo carbono

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Foto do author Marina Grossi
Atualização:

A regulamentação do mercado de carbono brasileiro tem sido uma promessa recorrente nas últimas Conferências sobre Mudanças Climáticas da ONU, as COPs. Batemos na trave nos encontros de Dubai, nos Emirados Árabes Unidos, no ano passado, e em Sharm El-Sheik, no Egito, em 2022. A aprovação da proposta legislativa que tramita desde 2021 (ainda que em diferentes textos), alvo de grande expectativa por parte da sociedade civil e da vanguarda do setor empresarial, contudo, não se concretizou a tempo de ser um trunfo brasileiro nas últimas COPs. Agora, às vésperas da COP-29, em Baku, no Azerbaijão, estamos correndo o risco de que a falta de novidades nesse campo se repita. Mas há tempo para fazermos diferente.

Já foi sinalizado pelo governo federal que é do seu desejo que o mercado de carbono seja uma das grandes entregas brasileiras para a COP-29. Isso depende do destravamento do PL 182/2024, que tramita no Senado e trata da criação do Sistema Brasileiro de Comércio de Emissões de Gases de Efeito Estufa (SBCE). Desde 2021, o tema tem sido debatido de forma contínua, com deliberação ampla e oitiva de diversos atores da academia, do setor produtivo e da sociedade civil, através de audiências públicas realizadas tanto na Câmara dos Deputados, quanto no Senado Federal. O PL aguarda despacho formal desde o início do ano, com discussões intensas ocorrendo nos bastidores, com possibilidade de votação após o período eleitoral, que se encerra com os pleitos de segundo turno, no dia 27 de outubro.

Às vésperas da COP-29, Brasil corre risco de ainda não ter novidades no mercado de carbono Foto: Tofik Babayev/AFP

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O setor empresarial brasileiro aguarda o marco legal para o SBCE com grande expectativa, pois a instituição de um mecanismo de precificação de carbono em solo nacional configura um dos principais instrumentos regulatórios na necessária transição para uma economia de baixo carbono, e está entre as principais demandas em termos de políticas públicas de ação climática para o setor empresarial.

Com o Brasil à frente da presidência do G-20 e futura sede da COP-30 em Belém, no próximo ano, temos a ambiência necessária e competência para estar à frente em práticas e regulações referentes a iniciativas de desenvolvimento sustentável. Diversas lideranças empresariais têm vocalizado o interesse em que o tema avance rapidamente - em junho, por exemplo, o Conselho Empresarial Brasileiro para o Desenvolvimento Sustentável (CEBDS) reforçou seu posicionamento, endossado por 54 grandes empresas, pela célere tramitação da matéria no Senado brasileiro.

O grande tema da COP-29 em Baku será o financiamento climático, tão necessário para cumprirmos a ambição de 1,5ºC, e para a adaptação às mudanças climáticas que já estão em curso. Ainda, é esperado que a conferência avance rumo à implementação de um mercado global de créditos de carbono, retomando as negociações em torno da regulamentação do Artigo 6 do Acordo de Paris, que prevê o uso de mecanismos de mercado, como os sistemas de comércio de emissões, para facilitar o cumprimento das NDCs - as Contribuições Nacionalmente Determinadas dos países.

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Trata-se, portanto, de um momento propício para que o Brasil, que assumirá a presidência da COP-30, regulamente o mercado de carbono no País. Além de marcar a primeira década do Acordo de Paris, o próximo ano será o momento de atualização das NDCs dos países, que têm até fevereiro de 2025 para submetê-las à Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima. O Brasil está empenhado na tarefa de atualizar seu compromisso - e, nesse cenário, o SBCE pode ser um instrumento fundamental para o cumprimento da ambição climática brasileira.

O sistema, em si, não aumenta necessariamente a ambição dos compromissos nacionais, mas fortalece a implementação e a transparência, além de mobilizar investimentos e incentivar alocação de capital para atividades de baixo carbono. Assim, o mercado regulado de carbono e a nova NDC caminham juntos na governança climática multinível, incorporando os atores do governo, sociedade civil, setor privado e financeiro na política climática brasileira.

De Baku podem sair avanços, a partir das discussões sobre o Artigo 6, para a construção de um mercado global de carbono, debate que pode vir a ser um dos grandes eixos da COP-30. O Brasil pode encabeçar esse movimento e catalisar fluxos de investimentos para tecnologias limpas, mas precisa fazer a lição de casa antes - a aprovação pelo Legislativo e a sanção pelo Executivo de um mercado regulado de carbono é o primeiro passo nessa direção.

Opinião por Marina Grossi

Economista, presidente do Conselho Empresarial Brasileiro para o Desenvolvimento Sustentável (Cebds)

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