BRASÍLIA – Apesar da avaliação do mercado de que a meta de déficit zero em 2024 já tem um encontro marcado com uma revisão, ainda que no segundo semestre, o secretário do Tesouro, Rogério Ceron, reafirma o compromisso da equipe econômica com o objetivo fiscal e diz que, hoje, o governo não trabalha com outro cenário.
“Nós queremos cumprir a meta sem mudá-la e estamos trabalhando para criar condições para isso”, diz Ceron ao Estadão. “Então, não é que é no segundo semestre que a gente vai discutir a alteração da meta. Cada dia com a sua angústia. Hoje, não há uma discussão sobre isso.”
Nesta sexta-feira, 22, a equipe econômica irá apresentar o primeiro relatório bimestral de receitas e despesas do ano, em que terá de apontar, formalmente, se o alvo fiscal caminha para ser cumprido ou não e se, diante do atual cenário, há necessidade de bloqueio de despesas.
A data vinha sendo considerada pelos especialistas em contas públicas como “a hora da verdade” sobre a meta fiscal e o grande teste de Haddad. Mas, como mostrou o Estadão, uma arrecadação mais forte no início do ano e indefinições dentro do Congresso e na negociação com empresas empurraram esse teste para frente, afastando a necessidade de um bloqueio mais expressivo neste primeiro momento.
Ceron, no entanto, não vê a manutenção do alvo fiscal apenas como uma “sobrevida”. “A meta deste ano está definida. Não tem incerteza sobre ela. Existem inúmeros desafios ainda em curso, acho que é inegável, mas é igualmente inegável que os indicadores estão melhorando dia após dia – alguns sendo mais fortes do que a gente imaginava”, afirma.
Ele destaca que o mercado, apesar de ainda ver com ceticismo a meta zero, tem diminuído a projeção de déficit para este ano – no último boletim Focus, do Banco Central, a previsão era de um rombo de 0,75% do PIB. Pelo novo arcabouço fiscal, a meta zero tem uma banda de tolerância de 0,25 ponto porcentual. Ou seja, o governo poderia ter um déficit de até 0,25% do PIB sem descumprir a meta.
O secretário reconhece, porém, que há desafios relevantes. “Depende de medidas que estamos discutindo com o Congresso: como vai ficar a reoneração da folha, como vai ficar o Perse, como vai reagir a arrecadação... tudo isso importa e está sendo acompanhado”, afirma. “Não dá para garantir, mas o objetivo é ficar o mais próximo possível de fato desse equilíbrio. Isso é um sinal importante e a sociedade já compreendeu que nós estamos buscando isso.”
‘Cereja do bolo’
Ceron destaca que a persistência na meta é importante para a chamada ancoragem das expectativas, que se traduz em mais investimentos. Ele afirma que o mercado passou a prever uma estabilização da dívida pública em 2030 em 87% do PIB, começando um processo de queda em 2031.
“Isso é um grande ganho, já muda a perspectiva de investimento, porque desde a época eleitoral você tinha um processo de desancoragem: a dívida passava de 90% em 2030 e continuava crescendo 2% ao ano”, diz.
Ele reconhece, porém, que é preciso melhorar essa perspectiva. Na apresentação do novo arcabouço fiscal, a expectativa era estabilizar a dívida em 2026, num patamar de 75% do PIB.
“A próxima etapa é puxar isso para baixo: o pleno sucesso é estabilizar antes e abaixo de 80% (do PIB). Essa é a cereja do bolo. Eu estaria muito satisfeito se a gente conseguisse chegar em 2026 com a dívida/PIB abaixo de 80%. O importante é o equilíbrio fiscal”, diz.
TCU
Questionado sobre o parecer da área técnica do Tribunal de Contas da União (TCU), que vê risco de infração à Lei de Responsabilidade Fiscal na proposta do governo Lula de estabelecer um limite para o contingenciamento de despesas, Ceron afirma que é preciso aguardar e que “ter segurança é bom”.
O parecer é resposta à consulta feita pelo Ministério do Planejamento e Orçamento à Corte de contas no final de janeiro, questionando se dispositivo incluído na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) de 2024, que estabelece um valor máximo de contingenciamento de R$ 25,9 bilhões em despesas, poderia ferir as regras fiscais.
A avaliação da área técnica vai na contramão da interpretação do ministro da Fazenda, Fernando Haddad, de que o dispositivo incluído na LDO limita o governo a um contigenciamento menor, mesmo em caso de frustração de receitas para o cumprimento da meta.
“É um posicionamento ainda não validado pelos ministros, não é um posicionamento do TCU. É um processo que está em curso lá. São leituras possíveis. Eu vejo um debate técnico que está sendo feito e vai ser validado pelo plenário do TCU”, diz o secretário.
“Temos nossas posições sobre o assunto, mas precisamos aguardar. A consulta foi uma construção do governo, para dar esse conforto técnico e para que não haja nenhuma surpresa lá na frente. Eu acho que o importante é a gente ter alguma segurança de caminho – o que não dá para ter é surpresa depois”, afirma.
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