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Doutor em Economia

Não adianta propagandear o valor de R$ 600 de Auxílio Brasil para quem recebe zero

Se nunca se gastou tanto com pagamentos aos mais pobres, por que há tantos nos semáforos? Porque muita gente que precisa não acessa o benefício

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Foto do author Pedro Fernando Nery
Atualização:

Começando na capital gaúcha, a fila tem 4 mil quilômetros. Do frio de 12 graus do Sul ela atinge Belém do Pará e seus 33 graus.

Na BR-101 ela sobe, passando por Tubarão e chega a Florianópolis. Mais pessoas se enfileiram no caminho até Joinville. Depois, na 376, chega a Curitiba.

Aplicativo do Auxílio Brasil; fila para receber benefício já acumula 2 milhões de famílias  Foto: Marcello Casal Jr/Agência Brasil

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Pela BR-116 atravessa o Estado de São Paulo. Há muitas crianças na fila. Frequentemente só com a mãe. Pela BR-050 mais famílias, uma atrás da outra. A carreira vai por Jundiaí e Campinas.

Corta Minas na 153 e chega em Itumbiara. Há moradores de rua e pedintes, mas também pessoas que têm teto e tiveram azar. A linha humana sobe por Goiânia e conquista o Tocantins. Mais crianças, juntos de pais que perderam o emprego ou que simplesmente não fecham o mês com o trabalho que têm.

A maioria dos enfileirados é negra. Na BR-010, mais pessoas esperam pacientemente. Com fome, a multidão se arrasta pelo Nordeste via Açailândia e Imperatriz. Muitos estão ali há meses. Outros já estiveram anos atrás e regressaram.

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O percurso do renque alcança a Amazônia e chega a Belém.

Milhões de brasileiros reconhecidamente pobres aguardam o pagamento do Auxílio Brasil. O governo atesta sua pobreza mas não paga o benefício. São mais de 2 milhões de famílias.

É fácil se acostumar com o número e perder sua dimensão. Se a fila, virtual, fosse física, ela atravessaria o Brasil do Sul ao Norte. Imagine isso.

O governo gasta como nunca na Assistência Social, mas prioriza o valor do benefício – agora chegando a R$ 600 – em vez da cobertura – o que seria mais efetivo para o combate à miséria.

A fila será reduzida com a nova PEC do Auxílio, mas pode voltar a aumentar por erros no seu desenho. Na verdade, desde o ano passado a Constituição garante transferências de renda como um direito de todos que precisarem, e as filas não deveriam existir.

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O problema da fila explica o paradoxo dos pedintes nas grandes cidades. Se nunca se gastou tanto com pagamentos aos mais pobres, por que há tantos nos semáforos?

Porque muita gente que precisa não acessa o benefício. Além disso, o governo precisa se dedicar à busca ativa, por exemplo ajudando os que têm problemas com documentos a superar a burocracia e comer. Nem na fila esses estão.

Não adianta propagandear o valor de R$ 600 para quem recebe zero. O ganho histórico no orçamento da Assistência Social exigirá mudanças para que a pobreza extrema possa ser erradicada e a desigualdade caia mais substancialmente. Há gente demais no acostamento.

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