Área técnica da Aneel sugere rejeição do plano dos irmãos Batista de assumir Amazonas Energia

Nota técnica vai na contramão de decisão judicial que obriga Aneel a transferir controle da distribuidora para a Âmbar Energia; empresa do Grupo J&F defende proposta

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Foto do author Daniel  Weterman
Atualização:

BRASÍLIA – A área técnica da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) recomendou a rejeição do plano da Âmbar Energia, empresa do Grupo J&F, dos irmãos Joesley e Wesley Batista, de assumir a Amazonas Energia, distribuidora do Estado. A recomendação vai na contramão de uma decisão judicial que obrigou a Aneel a transferir o controle da companhia para os irmãos Batista e do interesse do governo Lula de finalizar o processo com a transferência.

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A Âmbar reiterou nota emitida na segunda-feira, 23, em que defende o plano apresentado. A empresa argumentou que demonstrou, na proposta protocolada na Aneel, “sua capacidade técnica e econômica para adequar o serviço de distribuição e contém as condições necessárias para reverter a histórica inviabilidade econômica da distribuidora”. O Ministério de Minas e Energia afirmou que não cabe à pasta se manifestar no momento por ser um processo em análise na Aneel. A Amazonas Energia não comentou.

A análise foi elaborada no âmbito do processo que analisa o plano de transferência da Amazonas Energia após uma consulta pública. A Aneel diz que vai cumprir a decisão judicial, independentemente da conclusão técnica. A agência se prepara, porém, para recorrer da determinação da Justiça e seguir com o processo de avaliação da concessão até a próxima semana. Conforme o Estadão revelou, a cúpula da Aneel desenhava um cenário de intervenção na Amazonas Energia antes da decisão judicial.

Presidente Lula recebeu Joesley e Wesley Batista em reunião no Palácio do Planalto com ruralistas. Na foto, Joesley é o segundo da fila lateral à esquerda e Wesley é o primeiro da fila lateral à direita. Foto: Wilton Junior/ Estadão

A nota técnica da Aneel concluiu que o plano da Âmbar não atende aos requisitos da medida provisória assinada pelo governo Lula para permitir a transferência da Amazonas Energia porque não é suficiente para solucionar os problemas da companhia com o menor impacto para o consumidor. Portanto, a proposta foi apontada como ilegal. Além disso, a avaliação é que poderá haver prejuízos para o serviço de distribuição de energia à população do Amazonas.

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Os técnicos da agência continuam com a avaliação, feita no mês passado, que os consumidores brasileiros vão arcar com um custo de R$ 15,8 bilhões na conta de luz para manter a operação se a proposta dos irmãos Batista for aceita, sendo que o ideal seriam R$ 8 bilhões. A diferença existe porque a Aneel exige prazos menores para a empresa resolver os problemas da companhia e um impacto menor para o bolso dos consumidores. Os custos envolvem, por exemplo, o índice de furto de energia (o chamado “gato”) e o valor necessário para manter a empresa de pé e pagar as contas em dia.

A empresa dos irmãos Batista argumentou, no âmbito do processo, que não é possível se adequar às exigências da Aneel porque os custos operacionais envolvem a distribuição de energia em uma das regiões mais complexas do País, com vastas áreas remotas, dificuldade de logística e toda a complexidade ambiental do Estado amazônico. Para a área técnica da agência, no entanto, é preciso adotar uma trajetória de redução dos custos porque o prazo é de 15 anos, considerado longo e mais do que suficiente.

Além disso, os técnicos rejeitaram a proposta da empresa do grupo J&F de resolver o endividamento da Amazonas Energia, calculado em R$ 10 bilhões, no prazo de 15 anos ancorada nas flexibilizações que serão bancadas pelo consumidor. Os consultores da Aneel insistem na necessidade de determinar prazos e montantes específicos para equacionar a dívida e tornar a distribuidora sustentável. O prejuízo se isso não for feito é calculado em R$ 1,2 bilhão por ano só de juros por até 15 anos, montante equivalente à diferença entre o custo do plano da Âmbar e a proposta da Aneel.

“A não reversão do cenário de endividamento nessa magnitude, pelos impactos financeiros que este pode imputar à concessionária, poderia manter ou levar, novamente, à deterioração do equilíbrio econômico e financeiro, o qual motivou as flexibilizações previstas em Lei, com prejuízos à qualidade, à continuidade e à expansão dos serviços concedidos”, diz a nota.

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A Aneel concluiu também que a empresa dos irmãos Batista não demonstrou capacidade técnica no segmento de distribuição, que é o negócio da Amazonas Energia, ao apresentar o plano. A empresa argumentou que a medida provisória não exige experiência prévia na área de distribuição e apresentou seu histórico no setor de geração para se adequar à exigência. Nesse ponto, a área técnica do órgão recomendou que, caso a diretoria da Aneel aprove a transferência, seja exigido a contratação de profissionais qualificados no segmento de distribuição e a comprovação dessa condição em um prazo de 90 dias.

A empresa fez uma oferta pela Amazonas Energia após ser beneficiada pelo governo Lula com uma medida provisória (MP) que socorre o caixa da distribuidora e repassa o custo para a conta de luz dos consumidores brasileiros por até 15 anos. A medida não deve ser votada pelo Congresso e perde a validade no dia 10 de outubro, não gerando os benefícios autorizados pelo Executivo e aumentando as chances de uma intervenção, o que motivou a decisão judicial de obrigar a Aneel a aceitar a proposta dos irmãos Batista.

A cúpula da Aneel aposta na derrubada da decisão judicial por meio de um recurso, mesmo após cumprir a determinação e transferir o controle da Amazonas Energia para a Âmbar. Nesse caso, seria criado um impasse jurídico, na visão de integrantes do setor, porque a empresa já estaria nas mãos dos irmãos Batista e a medida provisória poderia já não estar valendo. Em decisão de agosto, a Justiça Federal do Amazonas intimou a Advocacia-Geral da União (AGU) a intermediar um acordo entre o governo e a Aneel para resolver o conflito, o que ainda não aconteceu.