O e-commerce nacional encerrou o final de semana da Black Friday de 2022 com o faturamento bem abaixo do resultado visto em 2021. O desempenho negativo ficou claro nos números das pesquisas de consumo da Neotrust e da NielsesIQ, em parceria com a Bexs Pay, que mostram uma queda de 28% e 23%, respectivamente, no faturamento do setor na data. Mas, afinal, o que pode ter colaborado para esse desempenho?
Para especialistas ouvidos pelo Estadão, o desempenho mais fraco em comparação ao ano anterior é resultado de uma junção de fatores como a antecipação de promoções feitas pelas empresas do comércio digital, a confluência da data importante para o varejo com a Copa do Mundo no Catar, realizada pela primeira vez nesta época do ano, a baixa disponibilidade de ofertas nos dias de promoção e até o aumento na inadimplência no País.
Ulysses Reis, da Strong Business School (SBS), explica que, apesar da ideia de que a Black Friday no Brasil é um momento de compras por impulso, presente desde a importação da data de descontos dos Estados Unidos para o País, nos últimos anos os consumidores têm demonstrado que se preparam o ano todo para aproveitar as ofertas. Por isso, Reis acredita que a baixa disponibilidade de ofertas pode ter levado o brasileiro a consumir menos na última sexta-feira, 25, e agora espera por oportunidades no Natal. “Este ano, as promoções foram muito tímidas. Como o brasileiro estava esperando grandes ofertas, ele acabou comprando bem menos do que poderia”, afirma o especialista da SBS.
Mudança no perfil de compras
As ofertas mais escassas no mercado também influenciaram diretamente o perfil de consumo dos brasileiros, o que, por sua vez, reduziu o tíquete médio gasto na data no varejo virtual. Segundo o levantamento da Neotrust, na sexta-feira, o tíquete médio das compras feitas pelo brasileiro em 2022 foi de R$ 733,07, o que representa uma queda de 5,9% em relação ao ano anterior.
Com menos dinheiro para gastar, o consumidor brasileiro acabou escolhendo comprar itens mais baratos, o que impulsionou, segundo a pesquisa da NielsenIQ, o consumo no segmento de Alimentos e Bebidas, que registrou aumento de 13,8% na Black Friday deste ano, em comparação a 2021.
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Compras adiantadas
Apesar das divergências entre os especialistas sobre o impacto da Copa nos resultados do dia 25 de novembro, a convergência dos jogos com a data de descontos fez com que os gigantes do e-commerce se adiantassem para oferecer promoções ao longo do mês, o que pode ter reduzido as vendas no comércio eletrônico no período.
Segundo um levantamento da NielsenIQ|Ebit, o faturamento do varejo digital em 2022 teve queda de 23% ante o mesmo período de 2021. Contudo, o estudo mostra que, ao comparar os 25 dias anteriores à Black Friday dos dois anos, a diferença de faturamento foi de apenas 1%. Na avaliação da empresa de fornecimento de dados, o resultado demonstra uma estabilidade nas vendas do setor.
“Ao considerarmos que a economia brasileira vive um momento desafiador e que, em 2022, as lojas físicas estão de volta, em peso, para competir com o e-commerce, é interessante perceber que a queda demonstra, na verdade, estabilidade”, afirma Marcelo Osanai, responsável pela área de e-commerce da NielsenIQ. “É como se o e-commerce, por ter uma força extra, se mantivesse vivo e forte na data especial.”
Inflação e inadimplência atrapalharam o setor
Um ponto de convergência entre os especialistas é o impacto dos fatores macroeconômicos no País na data de compras. Para Reis, da SBS, a alta da Selic, a inflação e o aumento na inadimplência entre os brasileiros podem ter deixado os consumidores mais receosos na hora de finalizar suas compras. Como resultado, o especialista destaca o aumento nas compras feitas com meios de pagamento instantâneo, como débito e Pix. “A junção desses fatores freia o consumo das famílias, que estão com a grana mais curta e mais medo de se endividar, preferindo pagar à vista”, afirma.
De acordo com dados de pagamentos online do Mercado Pago - braço financeiro do Mercado Livre-, as compras feitas com Pix no e-commerce durante a semana da Black Friday cresceram 52% no comparativo entre 2021 e 2022, enquanto as operações via cartão de crédito aumentaram 8% para o mesmo período. O boleto, por sua vez, de um ano a outro, teve queda de 28%, conforme a financeira do gigante argentino do e-commerce.
Para o diretor de operações da Paschoalotto, Guilherme Busch, além de estar menos propenso às compras, o consumidor brasileiro também teve dificuldade de aproveitar a Black Friday para reaver o crédito no mercado. Busch conta que, apesar de quase 100% dos clientes da companhia terem lançado campanhas de descontos e parcelamento de dívidas, os clientes têm demonstrado uma maior dificuldade de honrar com as negociações. “Antes nós ligávamos com uma oferta e o cliente aceitava e pagava os débitos. Hoje em dia, é preciso um esforço muito maior para recuperar o crédito e efetivar o negócio”, aponta.
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