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Por que a Braskem virou alvo de disputa, após anos à venda sem atrair interessados

Combinação de fatores, que inclui uma clareza maior em relação aos custos com indenizações em Maceió, tornou empresa mais atrativa aos investidores

Por Carlos Eduardo Valim
Atualização:

São Paulo - Anteriormente uma operação que parecia improvável e de difícil concretização, a compra do controle da Braskem passou a interessar a diversos grandes grupos - brasileiros e estrangeiros. Tudo por conta de uma combinação de fatores que tornou a petroquímica brasileira mais atraente do que era no passado recente. O cenário envolve um melhor posicionamento no mercado petroquímico brasileiro, mais clareza com relação aos custos de indenizações para compensar o afundamento do solo causado pela empresa em Maceió e investimentos considerados bem feitos para diversificar as matérias-primas usadas em sua produção.

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Pelos próximos dias, as operações da Braskem deverão passar por escrutínio, no momento em que se intensificam as negociações para a venda da participação da Novonor, a ex-Odebrecht, na empresa. O grupo detém 50,1% das ações com direito a voto e 38,3% do total.

A brasileira Unipar, do empresário Frank Geyer Abubakir, recebeu, no começo deste mês, o aval da Novonor para ter acesso a informações mais aprofundadas e fazer uma avaliação da petroquímica, a chamada “due diligence”. A empresa já chegou a fazer uma proposta de R$ 10 bilhões pelo controle da Braskem, mas o prazo dessa proposta venceu no domingo, 9. As negociações entre as partes continuam.

Fábrica da Braskem em Santo André (SP) Foto: HELCIO NAGAMINE / ESTADÃO

Depois, no dia 10, foi a vez de a Petrobras, sócia da Novonor na Braskem – com 47% do capital votante e 36,1% do total – , informar ao mercado ter pedido o acesso à sala de dados virtuais da empresa para também ter mais informações sobre as operações e poder avaliar se pretende exercer o seu direito de preferência pelas ações da Novonor ou fazer um “tag along” - ou seja, também vender suas ações pelo mesmo valor conseguido pela Novonor.

Além de Unipar e do possível interesse da Petrobras em ampliar sua fatia na empresa, uma oferta para a compra total da empresa foi feita em conjunto pelo fundo Apollo e a petroleira Adnoc, de Abu Dhabi. A proposta chegava a cerca de R$ 37 bilhões, por toda a companhia. Outro grupo que analisa o negócio, mas sem ter feito uma proposta formal, é o J&F, dos irmãos Batista, dono da JBS.

O cenário é bastante diferente dos últimos anos. Uma possível alienação do controle da empresa é discutida desde a década passada. Tudo começou com estudos para desmembrar a empresa em duas, uma para o mercado nacional e outra para o global, com a Petrobras vendendo as suas ações, mas fechando contrato de fornecimento de nafta para a empresa, lembra o chefe de pesquisas e analista de petróleo e gás do UBS BB Luiz Carvalho.

Depois, foi a vez de a Odebrecht – que assim como a estatal do petróleo também foi afetada financeiramente pelos escândalos revelados pela Operação Lava Jato – se interessar mais pela venda de sua participação, como forma de sair de sua recuperação judicial. A venda do ativo é visto pelo grupo de construção como a melhor chance de diminuir significativamente o seu endividamento de cerca de R$ 15 bilhões com os bancos.

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Uma venda para a petroquímica holandesa LyondellBasell quase foi fechada em 2019. Mas, naquele momento, uma série de fatores complicou o negócio. Entre os principais deles estavam os relatos da responsabilidade da Braskem no afundamento do solo de bairros de Maceió. Diante das incertezas dos impactos financeiros que as indenizações trariam, o grupo estrangeiro recuou.

Os problemas em Maceió começaram no dia 3 de março de 2018, quando um tremor de terra na cidade causou rachaduras e o afundamento do solo em cinco bairros: Pinheiro, Mutange, Bebedouro, Bom Parto e em uma parte do Farol. Mais de 55 mil pessoas foram forçadas a deixar suas casas naquele ano. O abalo foi causado pelo deslocamento do subsolo por conta da extração de sal-gema, um cloreto de sódio que é extraído para produzir soda cáustica e policloreto de vinila (PVC), pela Braskem, que atuava na região desde 1976. A companhia encerrou a extração do minério na região em 2019. No total, mais de 200 mil pessoas foram afetadas pelo desastre.

“A Braskem fala, em comunicados e conferências com o mercado, que grande parte dos recursos acordados para tratar da questão já foi provisionada”, diz o analista de petróleo e gás do Citi, Gabriel Barra. “Ainda há alguns pontos em aberto, mas hoje é mais fácil prever o gasto total.” A empresa já se comprometeu a pagar R$ 13 bilhões pelo desastre ambiental causado por sua operação de sal gema. A conta, no entanto, não está fechada. Este mês foi revelado que ela negocia com a prefeitura de Maceió o pagamento de R$ 1,7 bilhão adicional.


Troca de matéria-prima

Um segundo ponto que está sendo levado em conta pelos grupos interessados na petroquímica é que ela possui uma operação menos frágil frente às flutuações dos preços do mercado de energia, em relação ao passado. Anteriormente, a sua produção estava muito baseada no nafta como matéria-prima para sua produção. Em 2015, o derivado do petróleo respondia por 47% dos insumos, enquanto o gás representava apenas 10%. “No período por volta de 2016 e 2017, houve uma forte produção de gás de xisto, de baixo custo, nos Estados Unidos, e o preço do petróleo não acompanhou essa tendência”, diz Barra.

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Por conta dessa dinâmica de mercado, a Braskem perdeu competitividade frente a rivais internacionais, que utilizavam o gás como principal matéria-prima, e as suas ações caíram. Hoje, a empresa alcançou maior flexibilidade na operação. No período entre 2020 e 2022, segundo a empresa, a participação do nafta baixou para 36% e a do gás subiu para 21% entre as suas matérias-primas.

Além dessa decisão estratégica que favoreceu a empresa, também conta a favor de sua atratividade para potenciais comprados o seu domínio do mercado petroquímico brasileiro, que supera os 65%. " O valor estratégico de uma empresa com essa participação num mercado com uma população de mais de 200 milhões de habitantes faz da Braskem um ativo muito bom”, diz Luiz Carvalho, do UBS BB. “É impossível uma outra companhia montar do zero esta capacidade.”

Por isso, a compra da empresa é considerada uma oportunidade única, mesmo numa época de baixa do setor mundialmente, com menor demanda internacional por conta de crises econômicas na China, Estados Unidos e Europa, e com um excesso de capacidade construída nos últimos anos nos Estados Unidos, China e Oriente Médio. A recuperação econômica prevista para os próximos anos deve compensar o investimento feito agora, avalia Barra, do Citi.

Plástico verde

Outros motivos também podem entrar na conta para os interessados em fazer a aquisição, como o investimento feito no plástico verde, produzido a partir da cana de açúcar, que pode ajudar o setor a cumprir a sua parte na transição energética global da próxima década, além de outras apostas recentes relevantes. Por exemplo, a empresa se dedicou nos últimos anos a aprimorar a infraestrutura logística das operações que possui no México, que permite trazer via dutos o etano importado, do porto para a fábrica da empresa.

O governo brasileiro também demonstra interesse em manter o ativo sob controle nacional. Integrantes do corpo executivo da Petrobras têm dado declarações indicando que o plano é manter a estatal diversificada além da exploração de petróleo, em contraste com as vendas de negócios durante os governos de Michel Temer e Jair Bolsonaro, e que desejam manter ou até aumentar a participação da estatal no setor petroquímico.

Isso poderia acontecer por meio da compra de mais ações da Braskem ou de outras companhias do setor, diz um especialista do setor que prefere não se identificar. No entanto, existe um fator político que dificulta o negócio com os papéis detidos pela Novonor. Isso traria de volta memórias de pagamentos ilegais da Petrobras para a Odebrecht, investigados pela Operação Lava Jato, um tema bastante sensível para o governo petista.

Dessa forma, alguns observadores da empresa acreditam que a proposta feita pela Unipar pode se fortalecer, recebendo o apoio do governo Lula, como forma de garantir a permanência do controle da empresa no País, ao mesmo tempo que evita que ele precise dar explicações à oposição. Ou seja, a questão política ainda pode ter um papel importante no destino da petroquímica. / Colaborou Cynthia Decloedt

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