Em menos de seis meses, grupos chineses adquiriram dois negócios de metais não ferrosos no Brasil, como parte de uma estratégia para assegurar o fornecimento de minerais e metais estratégicos para a indústria de transformação da China. O desembolso foi de cerca de US$ 840 milhões (R$ 4,7 bilhões).
O país asiático é o maior consumidor mundial de matérias-primas metálicas, como minério de ferro usado na fabricação de aço, e metais como cobre, níquel, estanho e alumínio. O avanço de negócios bilionários chineses no Brasil acontece em meio a uma corrida mundial por metais essenciais à transição energética e à indústria de carros elétricos. Sob a nova gestão de Donald Trump, os Estados Unidos mostraram planos agressivos para garantir a posse de reservas desses tipos de materiais.
Em novembro, a estatal China Nonferrous Metal Mining (CNMC) comprou da peruana Minsur a mineradora Taboca, no Amazonas, que explora estanho, por US$ 340 milhões (R$ 1,9 bilhão). A mina, localizada a 100 km de Manaus, no município de Presidente Figueiredo, tem enormes reservas de estanho para exploração por muitas décadas à frente. Na extração de estanho são obtidos também nióbio, tântalo e háfnio,
Nesta terça-feira, 18, novo movimento foi feito por outra companhia chinesa, a MMG Singapore Resources, subsidiária integral da MMG Limited (MMG), por sua vez ligada à gigante China Minmetals, uma organização estatal e uma das maiores mineradoras do país.

A empresa firmou com a Anglo American a aquisição de seus ativos de níquel no Brasil por valor que pode chegar a US$ 500 milhões (R$ 2,8 bilhões). O negócio envolve as duas unidades operacionais de ferro-níquel que estão situadas em Goiás, nos municípios de Barro Alto e Niquelândia. A capacidade de produção das unidades vendidas é de 40 mil toneladas de níquel contido em ligas ao ano.
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O negócio dos ativos de níquel entre a Anglo e a MMG inclui dois projetos minerais de níquel para desenvolvimento futuro de novas minas do metal no Brasil. Um deles, Morro Sem Boné, em Mato Grosso; o outro, Jacaré, no Estado do Pará.
A transação envolvendo os ativos de ferro-níquel faz parte da estratégia de saída de mineração de bens considerados não mais estratégicos no portfólio da Anglo American anunciada no ano passado. Foi lançada logo após a companhia, sediada em Londres, receber uma oferta hostil de aquisição por parte da rival anglo-australiana BHP. A transação foi rejeitada pela Anglo.
A empresa decidiu se concentrar em três produtos: minério de ferro premium (Brasil e África do Sul), cobre (Chile e Peru) e nutrientes agrícolas (fertilizantes). Está saindo do controle de operações de carvão metalúrgico na Austrália, metais do grupo da platina e diamantes (África) e níquel, que opera somente no Brasil.
Corrida global por metais
Há uma corrida mundial pelos metais considerados críticos, como lítio, níquel, cobre, cobalto, nióbio, grafita e manganês, ligados à transição energética e à indústria de mobilidade elétrica.
Trump, que completa nesta semana um mês de seu segundo mandato, iniciado em 20 de janeiro, anunciou a intenção de anexar o território da Groenlândia, onde se estima haver vastas reservas minerais. Ele ainda propôs ao presidente da Ucrânia ajuda na guerra com a Rússia em trocas de acesso a jazidas de bens minerais. Os movimentos dos Estados Unidos sinalizam um contra-ataque ao avanço chinês no mundo.
A China é o maior consumidor de minério de ferro do Brasil. O país importa cerca 1,2 bilhão de toneladas da matéria-prima do aço por ano, além de deter recursos minerais de carvão, estanho, ferro e alumínio. Segundo especialistas que acompanham operações no setor mineral, a participação de um único país na produção de minérios é motivo de preocupação para outros países, como os Estados Unidos e Europa.
Há quase 20 anos, os chineses tentaram comprar o controle da CBMM, maior produtora mundial de nióbio pertencente à família Morteira Salles, que fica em Araxá (MG). Como uma decisão estratégica, a empresa decidiu vender 15% do capital a um consórcio chinês e outros 15% a um grupo de companhias do Japão e Coreia do Sul.
Assim, a CBMM atendeu aos anseios de “gregos e troianos” da Ásia em garantir suprimento do metal para sua siderurgia. O nióbio, na última década, no entanto, ganhou mais relevância, além do aço, em aplicações da transição energética e da mobilidade elétrica. É visto como material crítico e também estratégico.

Em 2016, a chinesa CMOC (China Moliybdenum Company Limited) comprou, também da Anglo American, as operações de nióbio e fertilizantes (fosfato) com mineração localizada em Catalão (GO) e industrialização do fosfato em Cubatão (SP). O investimento foi de US$ 1,5 bilhão (R$ 8,5 bilhões). Com isso, segundo a empresa, tornou-se a segunda maior produtora mundial do metal (11% da produção). No ano passado, sua produção de nióbio atingiu 10.024 toneladas, maior volume desde que assumiu o negócio nove anos atrás.
Recentemente, a montadora de automóveis BYD confirmou que adquiriu direitos de exploração de reservas de lítio — mineral essencial para as baterias de carros elétricos — no Vale do Jequitinhonha, onde estão as principais reservas de lítio conhecida do País e onde já há produção da Sigma Lithium e da CBL (Cia. Brasileira de Lítio), além de outros projetos em andamento. A BYD é uma das maiores fabricantes mundiais de carros elétricos.
Na primeira década deste século, a Honbridge Holdings, de Xangai, comprou a Sul Americana de Metais, detentora de uma mina de ferro no norte de Minas Gerais, que era do grupo Votorantim. O projeto ainda se encontra na etapa de implantação, dependendo essencialmente de logística (ferrovia e porto) para escoamento da produção. A empresa também adquiriu a Xianglan Brazil, detentora de jazidas de manganês na Bahia.
Em 2017, dois grupos chineses das áreas de construção e logística chegaram a avaliar uma parceria no projeto de mineração de ferro da Bahia Mineração (Bamin), controlado pelo grupo ERG, do Cazaquistão. O plano, que não foi adiante, era formar um consórcio da ERG com a China Communication Construction (CCC) e a China Railway Engineering Corporation (CREC), duas gigantes de logística.
Atualmente, o projeto da Bamin (mina-ferrovia-porto) está orçado em cerca de R$ 30 bilhões para sair do papel, com desenho para produzir 26 milhões de toneladas anualmente. A Vale, em parceria com BNDESPar e o grupo Cedro, de Minas Gerais, negocia com a ERG a compra do empreendimento.
Segundo informações da Agência Nacional de Mineração (ANM), a China tem presença em projetos de mineração nos Estados de Minas Gerais, Goiás, Pará, Amazônia, entre outros, muitos em fases de parcerias e prospecção. São tocados principalmente por CNMG (China Metal Mining Group) e China Nonferrous Trade (CNT).
A MMG, segundo a Anglo American, opera e desenvolve projetos de cobre, zinco e outros metais básicos na Austrália, Botsuana, República Democrática do Congo, Peru e Canadá. A empresa tem sedes em Melbourne e Pequim e está listada nas bolsas de valores de Hong Kong (HKEX) e da Austrália (ASX).