A saída de Leonel Andrade da CVC ocorreu por causa de divergências entre as intenções do executivo para a empresa e os planos do conselho de administração, de acordo com fontes ouvidas pelo Estadão. Nome respeitado pelo mercado, Andrade - que acumulava interinamente o cargo de diretor financeiro - deixou a companhia na quarta-feira, 24, sem que um processo de transição tivesse sido iniciado.
Segundo apurou a reportagem, o executivo queria aproveitar o momento, em que as concorrentes estão frágeis, para fazer a empresa ganhar participação de mercado. O conselho, no entanto, sobretudo o presidente, Valdecyr Maciel Gomes, e o conselheiro Sandoval Martins Pereira, prefere ser mais conservador e focar na geração de caixa. Apesar dessa divergência, não houve desentendimentos, afirmaram as fontes.
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Sob o comando de Andrade, a CVC havia renegociado títulos de dívida que somavam R$ 665 milhões e que venceriam em abril deste ano. Após acordo com os credores, o prazo para o pagamento foi alongado em três anos e meio. A empresa também havia se comprometido a fazer, ainda neste ano, uma operação para aumentar seu capital. Parte dos recursos levantados em um follow-on (oferta subsequente de ações) seria destinada para pagar dívidas.
Diante da divergência entre seus planos para a empresa e os do conselho, Andrade avisou que deixaria a CVC assim que as dívidas foram renegociadas. Houve, porém, uma demora na seleção de seu substituto.
Ainda segundo fontes, o executivo disse que não poderia esperar a conclusão do processo de seleção diante da urgência em fazer o follow-on. Isso porque a pessoa que vai estar à frente da companhia no momento da captação dos recursos teria de ser a mesma que vai conduzi-la posteriormente.
Em seu perfil no LinkedIn, Andrade escreveu na quinta-feira, 25, que os desafios na CVC foram “enormes”. “Desde a chegada enfrentamos graves distorções contábeis, a troca quase completa do management e completa do conselho de administração, quatro aumentos de capital, duas renegociações de dívida, um ataque cibernético gigantesco, a quebra de uma cia. aérea, a construção e troca completa de sistema… e tudo durante a pandemia do covid, o evento mais danoso que a indústria do turismo já enfrentou.”
O executivo destacou que a empresa continua liderando o turismo no Brasil e na Argentina e que nunca deixou de honrar seus compromissos. Agradeceu aos funcionários que estavam na CVC antes de sua chegada e aos que chegaram depois - “um grupo de pessoas que aceitou o convite de vir para a Cia no pior momento da sua existência, que saiu de empresas de primeira linha, acreditando que liderança e aprendizados são oportunidades únicas na vida”.
Andrade deixa o grupo em um momento ainda difícil. Apesar do alívio financeiro após a renegociação da dívida e do aumento das vendas no início deste ano, a CVC registrou queda na taxa de faturamento que a empresa tem a cada embarque realizado. O número caiu de 9,7% para 7,4%. O cenário futuro também é delicado devido à taxa de juros elevada e à pressão nos custos.
Na quinta-feira, 25, as ações da companhia recuaram 4,63%. Na quarta, antes do anúncio da saída do executivo, os papéis já haviam caído 7,57%. Na manhã desta sexta, 26, eles recuperam 3,36%.
Ontem, a CVC divulgou que Carlos Wollenweber será o novo diretor financeiro. O executivo tem passagens por Grupo GPS, BR Properties, Direcional e Even Engenharia. Por ora, quem comanda a empresa é o conselheiro Sandoval Martins, que está à frente de um comitê de transição.
Procurado, Andrade não quis comentar o assunto. A CVC negou “qualquer tipo de divergência” entre o ex-presidente e os conselheiros. “Pelo contrário. Reconhece que Leonel Andrade foi fundamental para o crescimento da companhia nos últimos três anos, sendo a decisão de saída motivada por questões de ordem pessoal”, afirmou em nota.
“A companhia reitera ainda que segue seu plano de crescimento e que, nos últimos anos, passou por intensa transformação organizacional, que culminou na ampla digitalização dos negócios, com maior investimento da história em tecnologia, inovação, governança, pessoas e sustentabilidade, e na renegociação de dívidas, com atingimento do menor nível de endividamento dos últimos cinco anos.”
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