Empresas disputam craques de tecnologia demitidos por ‘unicórnios’

Companhias têm usado até as redes sociais para monitorar os passos de profissionais que estão deixando seus empregos em meio ao ‘inverno das startups’ para fechar posições que têm em aberto

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Foto do author Fernanda Guimarães
Atualização:

Depois de uma corrida pela contratação por profissionais de TI (tecnologia da informação) nos últimos dois anos, uma onda de demissões pelos “unicórnios”, como são chamadas as startups que valem mais de US$ 1 bilhão, colocou de volta ao mercado um grande número de profissionais, mudando o balanço de forças entre empregados e empregadores. Os recém demitidos, por sua vez, começaram a ser absorvidos por outras empresas, muitas da economia tradicional ou startups menores, que estavam com dificuldades de atrair “craques” para seu time de tecnologia.

O movimento ocorre após um longo período de grande competição pelos profissionais com formação em tecnologia, em um momento em que empresas de todos os setores da economia tiveram de correr atrás da digitalização, por imposição da pandemia de covid-19, que em seu momento mais crítico obrigou a restritos isolamento social. Com o trabalho remoto, a busca por profissionais rompeu fronteiras, mas um senso de normalidade começa a ser observado, apontam empresas e consultorias de recursos humanos.

Na Sinqia e suas subsidiárias, como a Simply, a equipe de RH vem monitorando as redes sociais para caçar bons profissionais desligados. ”Nos últimos meses, percebemos certa instabilidade no mercado de tecnologia nacional, com um alto número de empresas tech realizando demissões em massa. Nós vemos isso como oportunidade de canal de recrutamento, já que há muitos profissionais bastante qualificados entre os desligados”, conta o responsável pela área de RH da empresa, Caio Abreu.

Nós vemos isso (demissões por startups) como oportunidade de canal de recrutamento, já que há muitos profissionais bastante qualificados entre os desligados.

Caio Abreu, responsável pela área de RH da Sinqia

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Foi se mantendo atenta às vagas postadas nas redes sociais que Giulia Romanini se recolocou rapidamente após passar pela demissão em massa recente por uma empresa de tecnologia. “Naquele momento (da demissão) fiquei sem chão e comecei a buscar um novo trabalho. Já acompanhava a Sinqia pelo LinkedIn e achei uma oportunidade dentro da minha área de atuação”, conta Giulia, que agora ocupa a vaga de analista de employer branding (profissional que cuida da reputação do negócio como empregador) e comunicação interna na Sinqia.

Giulia conta que o processo de contratação foi rápido e que, ao final, o fator decisivo para que ela fosse escolhida foi exatamente o fato de estar fora do mercado, com a possibilidade de começar mais rapidamente do que um concorrente que estava empregado. A possibilidade do trabalho remoto também permitiu Giulia a conquistar o empresa: ela mora em Itatiba, interior de Paulo, e a sede da Sinqia está na capital.

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Após ser demitida em um corte em massa, Giulia Romanini se recolocou rapidamente na Sinqia Foto: Felipe Rau/Estadão

O mesmo tem sido observado na Supersim, fintech de microcrédito. Por lá o momento tem sido de contratação e a startup tem aproveitado o momento para fortalecer seu quadro de desenvolvedores. “Antes havia uma competição maior, com um profissional sênior recebendo um salário de gestor”, comenta a líder da área de pessoas da empresa, Carolinne Volpato. Segundo ela, muitos profissionais muito qualificados estão sendo cortados das empresas, na onda de demissões.

“Muita gente acredita que as empresas não cortam os melhores profissionais, mas não é necessariamente o que está acontecendo. Às vezes algumas demissões passam por um mal planejamento de contratações”, explica. Ela lembra que antes para se fechar uma contratação de um profissional de tecnologia se demorava de quatro a cinco meses. Hoje o prazo caiu para um mês.

Na Supersim, Carolinne Volpato conta que tempo para contratar um profissional de tecnologia caiu de cinco para um mês. Foto: Alex Silva/Estadão

De olho na renovada disponibilidade de profissionais, Márcio Kogut, presidente da Mycon, da área de consórcios, pretende contratar mais cem pessoas da área de TI até o fim deste ano. “Vários unicórnios e empresas de tecnologia demitiram um pessoal da área de tecnologia porque diante de um período mais difícil tiveram que segurar caixa. Eles contrataram de forma muito acelerada”, comenta.

No dia a dia da contratação, afirma o executivo, a mudança tem sido, além da maior disponibilidade de pessoal, uma acomodação das exigências por parte desses profissionais – algo que tem ajudado a formar o time. “Esse profissional recebe oferta todo dia e era assediado constantemente. Hoje, ele não troca o certo pelo duvidoso”, diz.

Demanda segue alta

Apesar das milhares de demissões nas empresas de tecnologia, reflexo da forte alta dos juros e ambiente mais difícil para novas captações, a demanda por profissionais do ramo segue elevada. Segundo a diretora associada da consultoria de recursos humanos Robert Half, Maria Sartori, dada a necessidade de digitalização das empresas, a disputa por esse tipo de mão de obra qualificada continua intensa.

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“Acredito ser importante frisar que existem essas startups que estão passando por momentos complicados, mas ainda vemos muitas outras em movimento crescente, intensificando negócios e contratações. É claro, no entanto, que os segmentos tradicionais estão de olho nesses profissionais, que não ficam muito tempo à solta no mercado”, afirma. Os setores que mais estão contratando são os de tecnologia, mercado financeiro, varejo e logística.

De acordo com Brasscom (associação das empresas da tecnologia da informação), o Brasil terá um déficit de 500 mil profissionais de tecnologia até 2025. Isso porque, segundo a entidade, o Brasil forma por ano apenas 53 mil pessoas com perfil tecnológico. O relatório da entidade estima que apenas as empresas de tecnologia irão demandar cerca de 800 mil profissionais com esse perfil até o fim desse prazo.

O presidente da Koud, plataforma de RH especializada em profissionais de tecnologia, Frederico Sieck, confirma que ainda há mais vagas do que profissionais do setor. “Atualmente no mercado existem muitas vagas para serem preenchidas, então mesmo com essa onde de desligamento das grandes empresas e startups existem vagas o suficiente no mercado”, diz.

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