A fabricante de celulose Suzano atingiu nesta semana uma marca restrita a poucas indústrias brasileiras: 100 anos de fundação. E, segundo o presidente da companhia, Walter Schalka, sempre com o olhar voltado para o longo prazo. Isso se reflete em um plano de investimentos robusto, que inclui uma nova fábrica em Mato Grosso do Sul, prevista para entrar em operação ainda este ano, que vai adicionar 2,5 milhões de toneladas de capacidade de produção para o grupo (hoje em torno de 11 milhões de toneladas por ano).
Segundo Schalka, um dos principais diferenciais do grupo está na competitividade, e a nova fábrica deve melhorar ainda mais esse quadro. “O custo médio da nossa celulose é de US$ 180 por tonelada. O Projeto Cerrado terá um custo de US$ 100 por tonelada. Nossos concorrentes na Ásia, na América do Norte e na Europa têm um custo médio de US$ 550 por tonelada. Somos muito mais competitivos do que eles e essa é a nossa maior defesa”, diz o executivo. “Continuamos trabalhando para melhorar o custo e, se eventuais competidores entrarem no negócio, entrarão com custos mais altos e terão piores resultados do que nós.”
A seguir, os principais trechos da entrevista:
A Suzano anunciou investimento de R$ 16,4 bilhões no Brasil em 2024. Como esses recursos serão utilizados?
Esse valor é uma composição de investimentos na área florestal, em uma nova fábrica de tissue (para papel higiênico em Aracruz, ES) e no projeto Cerrado (fábrica que está sendo erguida em Ribas do Rio Pardo, MS), que trará uma capacidade adicional de 2,5 milhões de toneladas.
No interior de São Paulo, vocês anunciaram a conversão de uma máquina em Limeira para elevar a capacidade de produção de celulose fluff. Essa é um negócio importante?
Em Limeira, faremos a conversão para produzir fluff, produto que vai nas fraldas e absorventes femininos. Fizemos uma primeira fábrica em Suzano, que está operando em plena capacidade e operando super bem. Precisamos fazer a expansão e optamos por Limeira. Com isso, vamos quadruplicar a capacidade de produção de fluff.
Há uma oportunidade global de venda de fluff, mesmo diante da redução de nascimentos no mundo?
Quase tudo na Suzano é baseado na migração de fibras. Até cinco anos atrás, a celulose fluffy era 100% de fibra longa e era feita principalmente na América do Norte. A Suzano resolveu entrar nisso utilizando fibra curta, feita a partir do eucalipto. Evoluímos nisso ao longo do tempo e agora precisamos expandir. A demanda cresce 2,5% ao ano, assim como a população mundial. A substituição de fibra vai dar um produto melhor para os clientes.
Olhando para o balanço, a Suzano teve redução de receita de 37% e queda na margem Ebitda no terceiro trimestre do ano passado. Por que esse é o momento certo para investir em expansão?
A empresa tem uma política diferente da média das indústrias brasileiras. Reinvestimos 90% da nossa geração operacional de caixa. Todos os anos, a companhia reinveste no negócio e isso dá uma dinâmica importante para o futuro. Nos últimos quatro anos, de 2021 a 2024, são R$ 60 bilhões investidos no País.
Como está a questão do preço da celulose atualmente? E qual a perspectiva para os próximos anos?
Hoje, o preço da celulose está por volta de US$ 650 (a tonelada) na Ásia. O preço é adequado para rentabilizar o nosso produto, apesar de o nosso custo de caixa ser muito baixo. Mesmo em cenários em que o preço cai, a geração de caixa da companhia é positiva. Nos últimos dez anos, o preço médio da celulose foi de US$ 620. A empresa está muito bem preparada para um preço médio nessa magnitude. Há dois anos, o preço atingiu US$ 860 e, há um ano, chegou a US$ 470. Houve muita oscilação de preços, mas a companhia está muito bem preparada para lidar com isso por causa do baixo custo.
O Brasil é o maior exportador de celulose atualmente, mas há uma competição forte com outros países. Como a empresa lida com isso?
A maior proteção da companhia é a competitividade de custos. O custo médio da celulose é de US$ 180 por tonelada. O Projeto Cerrado terá um custo de US$ 100 por tonelada. Nossos concorrentes na Ásia, na América do Norte e na Europa têm um custo médio de US$ 550 por tonelada. Somos muito mais competitivos do que eles e essa é a nossa maior defesa. Continuamos trabalhando para melhorar o custo e, se eventuais competidores entrarem no negócio, entrarão com custos mais altos e terão piores resultados do que nós.
A empresa está completando nesta semana 100 anos de fundação. Quais os desafios enfrentados para se chegar a tal marca?
Como brasileiros, a empresa chegar com vigor ao centenário é motivo de muito orgulho, já que é algo muito difícil. A Suzano passou por diversos momentos da história, como revolução, guerras, diferentes planos econômicos, inflação elevada, crescimento da economia, recessão e repressão econômica, além de volatilidade de câmbio e preços. Como é uma empresa eminentemente exportadora, essas duas últimas variáveis são muito sensíveis ao nosso negócio. Ao longo do tempo, nos preparamos para operar em um regime de muita volatilidade. Nos 11 anos em que estou à frente da companhia, houve quatro momentos de baixa expressiva de preços. Em uma empresa de commodities, é sempre um momento de tensão mais elevada quando os preços ficam menores.
Manter a família fundadora envolvida na empresa ajudou a manter o foco do negócio ao longo dos anos? Isso deve se manter?
A longevidade da empresa tem a ver com uma característica fundamental dos acionistas de referência: a visão de longo prazo. Eles olham muito para o negócio sob essa perspectiva. Obviamente, sempre tentamos maximizar os resultados no curto prazo, mas nunca em detrimento do longo prazo. Hoje, nós plantamos árvores que iremos colher daqui a sete anos. Portanto, olhamos para um horizonte longo. Outra característica importante da família fundadora (Feffer) é a resiliência. Em 100 anos, a família aguentou de tudo. Sem acionistas de referência assim, seria comum as pessoas saírem do negócio por causa da volatilidade. A família quer estar presente na companhia nos próximos 100 anos.
Qual é a influência do ambiente político-econômico nos negócios da Suzano?
Mais de 95% do nosso volume de venda de celulose é para o exterior. Nós somos pouco dependentes da economia local no dia a dia. Há, porém, duas variáveis importantes: a inflação do custo e o câmbio. Para lidar com isso, a empresa faz proteções cambiais. Temos um modelo voltado a reduzir a volatilidade e, portanto, ter uma taxa contínua ao longo do tempo.
A questão da taxa de juros, que está em trajetória de queda, tem impacto na operação?
A queda de juros vai acontecer, mas 100% da dívida da Suzano é externa. Sendo assim, não é ligada à taxa de juros interna. Se a dívida é tomada no Brasil, é convertida para dólar imediatamente. Nós somos muito influenciados pela taxa de juros externa, que também acreditamos que irá cair, apesar de, por proteção, a companhia ter travado a taxa de juros antes da subida da inflação e dos juros. Nossa dívida é muito longa e na ordem de 5%, o que é muito barato para os termos brasileiros.
Qual tem sido a estratégia usada para ampliar a plantação de eucalipto minimizando os impactos ambientais e sociais?
Só plantamos em áreas que tenham sido abertas antes de 1994. Portanto, há 30 anos, a companhia não entra em áreas desmatadas depois dessa data. A gente entra para competir com pastos degradados. Então, geralmente, não conseguimos competir com soja, com milho. Entramos em áreas que tenham sido áreas plantadas para pasto e que estejam em más condições. Muitos falam do eucalipto porque não têm conhecimento técnico sobre ele. Um dos tabus do eucalipto é que ele seca o solo. Isso é um absurdo e é muito fácil demonstrar que não é verdade. Se fosse verdade, nós teríamos uma empresa nômade, porque eu ia plantar o eucalipto em um lugar, o solo secaria e teríamos de nos mudar para outro lugar de tempos em tempos. Isso não acontece, basta ver a história da Suzano. Nós temos áreas com oito ou nove ciclos de operação e nada afetado foi em relação à seca do solo. O outro tabu é de que eucalipto é um deserto verde, porque tem pouca diversidade, biodiversidade - algo que é verdade, tem mesmo. Mas é a mesma coisa que acontece em outras plantações. A soja também tem pouca diversidade, assim como o milho, o algodão e assim sucessivamente. Nós somos 100% baseados em árvores plantadas por nós. Portanto, estamos muito tranquilos nessa questão do impacto ambiental. Nós somos negativos em carbono.
O que mudou na estratégia da Kimberly Clark desde a aquisição e o que a empresa trouxe de principais benefícios para a Suzano?
A marca Neve é importante para nós. Estamos fazendo alterações na fábrica em Mogi das Cruzes. Estamos muito satisfeitos com a aquisição, excedendo as sinergias inicialmente estimadas. Temos hoje o menor custo do Brasil, um portfólio de marcas e uma distribuição de produtos muito boa.
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