Quando abriu as portas, no início da década de 1960, o Grupo Cortel – abreviatura de Consórcio Riograndense de Terraplanagem – tinha foco na construção civil. Chegou a entregar, na época, um loteamento imobiliário com 2 mil casas, em Porto Alegre. Em pouco tempo, porém, o negócio mudou de cara, quando o fundador José Elias Flores fez uma permuta com um terreno com a prefeitura da capital gaúcha. Ali seria construído um cemitério, e o acordo previa que Flores recebesse parte das receitas. Foi a gênese do negócio que é visto como a primeira grande empresa do setor funerário brasileiro, que ainda é dominado por pequenos negócios.
A mudança do Cortel da construção para o ramo funerário veio quando a construtora contratada para erguer o cemitério quebrou, e Flores assumiu a obra. Ali nasceu o Cemitério Ecumênico João 28, primeiro empreendimento do gênero vertical e feito em concreto armado do País. A Cortel não abandonou o nome, mas deixou a terraplanagem e nunca mais saiu do segmento funerário.
“Meu pai viu que era um bom negócio”, afirma Rafael Azevedo, que há dez anos comanda a empresa – ele é o terceiro de quatro filhos de José Elias, já falecido. Seu irmão mais velho, que tem o mesmo nome do pai e ganhou o apelido de “Zé do Caixão” na escola, hoje é presidente do conselho de administração. Já Rafael, formado em administração e chamado de “coveiro” por colegas de um antigo emprego, diz que a empresa da família sempre fez parte do seu dia a dia. “Sempre gostei muito do negócio.”
Todos os irmãos, ainda pequenos, sempre trabalhavam no Dia de Finados, com a entrega de folhetos ou ajudando os visitantes a encontrar as sepulturas – trabalho que hoje não é mais necessário. “Hoje isso é feito via geolocalização”, conta.
Apetite para aquisições
Com a empresa hoje mais robusta, Rafael Azevedo tem agora a missão de consolidar um setor que possui um faturamento anual estimado no Brasil em R$ 3 bilhões e verticalizar a companhia da família, que já possui mais de dez cemitérios, além de funerárias e crematórios (incluindo um para animais de estimação).
Além disso, vende o chamado plano funeral, espécie de seguro que a pessoa paga em vida o custo de um enterro. Apenas neste ano, utilizando dívidas e troca de ações, ingressou em três novos Estados, por meio de quatro aquisições.
Para dar velocidade a esse processo, o Cortel abriu uma área só para analisar oportunidades de compras. Há, neste momento, outras cinco transações na mesa, sendo que duas estão em estágio avançado e podem ser fechadas neste ano. E há bastante espaço para aquisições.
Setor pulverizado
O setor funerário é muito pulverizado: o Brasil conta com mais de cinco mil funerárias, 750 cemitérios, 147 crematórios e 250 empresas de plano funeral – de acordo com pesquisa que acaba de ser feita pela consultoria RGF, que considera apenas os ativos da iniciativa privada. Assim como o Grupo Cortel, a maior parte das empresas tem perfil familiar.
Em sua busca por crescimento, o Cortel chegou, no ano passado, a protocolar uma oferta inicial de ações (IPO, na sigla em inglês) na Bolsa brasileira, mas decidiu aguardar. Isso porque não identificou um ambiente favorável para a estreia.
Como ainda não há empresas do setor listadas, há falta de capacidade de análise para balizar as decisões dos investidores. “Ficava mais tempo explicando o que a gente não é. Éramos entendidos como um negócio imobiliário, o que não somos”, lembra Azevedo.
Por isso, o plano de fazer a estreia na Bolsa acabou sendo colocado na gaveta.“O novo alvo é sermos o principal consolidador do setor. Se o IPO acontecer ele será um passo para isso.”
Na agenda dos fundos de investimento
Gisela Adissi, sócia da consultoria especializada Flow Death Care, ressalta que o processo de consolidação do segmento está apenas no início. “O interesse pelo setor está crescendo, incluindo por fundos de investimento. O processo de consolidação está ajudando, inclusive, pequenos empresários que estavam com dificuldade de continuar investindo no negócio”, diz.
O holofote se virou ao setor funerário no Brasil com o investimento da Crescera, ex-Bozano, no Grupo Zelo, que também está consolidando o setor. Com o setor mais profissionalizado, fundos tradicionais de private equity (que compram participação de empresas), como Pátria, Carlyle e Kinea, passaram a estudar oportunidades no setor, apurou o Estadão.
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