A farmacêutica Hypera informou nesta quinta-feira, 24, que seu conselho de administração rejeitou a oferta pública de aquisição de ações e combinação de negócios proposta pela rival EMS. A proposta foi feita na última segunda-feira, 21.
Em fato relevante enviado à Comissão de Valores Mobiliários (CVM), a companhia informou que a decisão foi baseada na análise de que o portfólio de produtos da EMS, focado em medicamentos genéricos, “não se alinha com os segmentos estratégicos da Hypera”. Além disso, o grupo disse considerar que a avaliação atribuída a ele na proposta subestima significativamente seu valor.
Segundo a Hypera, há diferenças significativas em cultura organizacional e práticas de governança corporativa entre as duas empresas. “A Hypera, uma companhia aberta com ampla dispersão acionária desde 2008, contrasta com a EMS, uma empresa familiar de capital fechado”, afirma.
“A companhia lamenta que a proposta lhe tenha sido enviada ao mesmo tempo em que divulgada pela imprensa e ainda com o pregão em curso”, disse a Hypera, destacando que sua administração continua focada na estratégia de “otimização de capital de giro” anunciada em 18 de outubro de 2024, “visando à criação de valor para os acionistas de longo prazo”.
De acordo com a Hypera, os principais acionistas da companhia - João Alves de Queiroz Filho, fundador da empresa com 21,38% das ações, e a Maiorem, detentora de 14,74% das ações -, apoiaram a decisão do conselho.
Nova proposta?
Para analistas do mercado financeiro, porém, a EMS não deve desistir de combinar seus negócios com a Hypera, mesmo após a recusa da concorrente. A avaliação é que a fusão continua a fazer sentido para a EMS, que se encontra em uma posição financeira estável, com resultados positivos. Além disso, o negócio teria potencial para dobrar o tamanho da empresa sem desembolsar um alto valor, considerando que o preço das ações da Hypera está em baixa.
Essa é a segunda proposta feita pela EMS para a combinação de negócios. Em 2022, os controladores da Hypera já haviam negado a proposta de fusão com a EMS porque teriam menos de 50% de participação na nova empresa. A proposta desta semana, por sua vez, previa a Hypera com uma fatia 40% da empresa combinada.
Diante da negativa, a expectativa de analistas de mercado é que EMS adote outras táticas para adquirir a Hypera, como aumentar a sua posição acionária, por exemplo, como já tem feito nos últimos meses, sem alarde. “A EMS não vai desistir da compra, apesar da recusa ‘deselegante’ da Hypera. A EMS pode tentar outras táticas, como revisar sua oferta, comprar ações no mercado, criar alianças com acionistas da Hypera ou aguardar mudanças no mercado que possam tornar a oferta mais atraente para o conselho”, avalia o analista da Levante Inside Corp, Fernando Henrique Magalhães.
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Ele lembra que a insistência no negócio tem como base os ganhos consideráveis que a EMS conseguiria em uma eventual fusão. Além de a Hypera estar bem “descontada”, com a relação entre valor da empresa e Ebitda(geração de caixa) próximo de 9 vezes, ante uma média de 13,4 vezes dos últimos cinco ano, Magalhães avalia que os fundamentos da empresa continuam positivos, apesar de todas as discussões travadas nesta semana, após a companhia descontinuar seu guidance (orientação de resultados) para este ano e divulgar nova política para melhorar o capital de giro.
Apesar de a Hypera ter demonstrado certa resistência a um acordo, Marcelo Inoue, analista da Perfin, avalia que o grande problema foi como a proposta foi feita. “A transação não foi bem recebida pela Hypera e o controlador, o que reduz a chance de uma transação, mas eu continuo achando que o momento é propício do lado da EMS para propor uma transação”, diz, apontando que a nova abordagem deve ser feita de uma forma mais tranquila, com mais conversas e negociação com controladores, além de oferecer um prêmio maior pelas ações.
Apesar disso, Inoue avalia que o timing continua bom do lado da EMS, pois além de estar desalavancada, a companhia está entregando bons resultados e poderia dobrar de tamanho comprando a Hypera. “Os concorrentes não estão em condições de balanço (financeiras) de fazer uma oferta pela Hypera, então a EMS está sozinha nessa disputa atualmente. Ao mesmo tempo, as ações da Hypera estão no menor nível em muitos anos. Isso tudo joga a favor da aquisição”, diz Inoue.
O analista da Nova Futura, Marcos Duarte, aponta ainda que a aquisição aumentaria a dominância de EMS no mercado em relação a concorrentes como a Eurofarma, uma das maiores farmacêuticas brasileiras, com forte atuação no mercado de genéricos e de marca. A Teuto, que tem forte presença no setor de genéricos e medicamentos similares, a Neo Química (pertencente ao grupo Hypera), e a Prati-Donaduzzi, especialista em genéricos com grande volume de produção, também são concorrentes diretas da EMS. “A fusão ampliaria a participação da EMS no mercado, com capacidade de competir tanto local quanto internacionalmente, melhorando a posição estratégica das empresas”, diz Duarte.
Embora uma possível fusão de EMS e Hypera fosse vista como positiva pelo mercado, considerando que ambas teriam sinergias consideráveis, vale lembrar que o mercado já se mostrava cético sobre a concretização do negócio, considerando que o preço oferecido pela EMS.
A proposta de R$ 30 por ação já era vista como um grande empecilho para a continuidade do negócio, destacou o Itaú BBA. Além disso, os analistas Marcio Osako e Valeria Parini, do Bradesco BBI, também já previam a rejeição, considerando que a falta de prêmio de controle, o recente anúncio de um plano de otimização de capital de giro que pode gerar valor significativo para a empresa eram fatores que pesavam contra, assim como o fato de a oferta de R$30 por ação em dinheiro estar 40% abaixo do preço mais alto da ação em 2023.
Procurada, a Hypera destacou que não daria maiores informações além do já divulgados ao mercado. A EMS não respondeu ao pedido de comentário até o fechamento da reportagem.
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