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IA pode criar algo razoável, mas não como a inteligência humana, diz autor de ‘A Startup Enxuta’

Para Eric Ries, que participou de painel na Rio Innovation Week, o empreendedorismo recompensa quem é original de fato

Por Leandro Becker
Atualização:

Valorizar mais a inteligência humana do que a artificial, colocar as pessoas no centro do negócio e ser original ao empreender por estar conectado com a realidade foram alguns dos conselhos compartilhados nesta quarta-feira, 14, por Eric Ries, durante painel na Rio Innovation Week, evento de tecnologia e inovação que está sendo realizado esta semana no Rio (até sexta-feira). Ries é autor do best-seller A Startup Enxuta, que discute como essas empresas podem alocar seus recursos de forma mais eficiente.

Para Ries, a crescente onda da inteligência artificial (IA) generativa traz oportunidades de negócio, mas tem fragilidades, como uma linguagem “vazia de significado”. “Essa nova tecnologia revelou algo muito importante. Afinal, esses modelos podem criar algo razoável, mas não há nada parecido com a inteligência humana”, disse. “É simplesmente o processamento de uma linguagem inconsciente. São palavras sem alma nem curiosidade.”

'Quando você está vivo e percebe a realidade da vida, as grandes ideias vêm', disse Ries Foto: Pedro Kirilos/Estadão

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Provocado pelos mediadores Erick Bretas, CEO da S.A. O Estado de S. Paulo, e Carlos Jr., CEO do grupo de inovação e investimento Sai do Papel, Ries disse defender uma dinâmica de empreendedorismo baseada em experiências reais. “Quando você está vivo e percebe a realidade da vida, as grandes ideias vêm. Aquelas que dão medo, que levam a perguntar ‘quem sou eu para tentar algo tão maluco?’. O empreendedorismo recompensa quem é original de fato”, disse.

Segundo ele, as ondas são naturais no mundo dos negócios, mas nem tudo que é novo ou está viralizando será duradouro. “Nas últimas décadas, não houve tantas ondas significativas e duradouras. Tivemos os softwares, os PCs, o celular, os serviços de internet e as redes sociais, entre outras. Ou seja, não acontece com tanta frequência assim. Muitos entram por medo de perder, mesmo que depois se descubra que não era uma onda de fato. Foi assim com o metaverso”, explicou.

Diante desse cenário, Ries recomendou que empreendedores e investidores foquem no trabalho consistente com visão de médio e longo prazos, pois é isso que tende a facilitar o aproveitamento dessas ondas, tanto em timing quanto em consistência. “Se hoje eu quiser criar algo como o ChatGPT, é muito tarde, só se eu entrar em uma máquina do tempo e voltar para o momento certo. O ponto é que, mesmo sendo tarde demais para algumas coisas, você pode começar hoje para estar preparado para outras”, observou.

Gestão com ‘ser humano no centro’

Ao comentar sua trajetória em startups e sua experiência como empreendedor, Ries ressaltou o peso de uma gestão eficiente para maximizar resultados. “Tem gerentes que focam em produzir a qualquer custo ou de uma forma que sobrecarregue as pessoas. Mas isso é totalmente antiprodutivo. O que faz as startups crescerem é colocar o propósito e o ser humano no centro. E, se não inserir isso na governança, independentemente do sistema de gestão, os resultados não serão alcançados como poderiam”, salientou.

No bate-papo, o escritor ainda respondeu a perguntas sobre como estimular o espírito de startup dentro de grandes empresas e como a criação de spin-offs (empresas que nascem de outras) podem abrir caminhos atraentes para novos negócios. “Há muitas empresas grandes que querem inovar e não têm medo de correr riscos. E ainda contam com muitas e excelentes pessoas empreendedoras capazes de tornar isso real”, enfatizou.

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Carlos Jr (E), CEO da Sai do Papel, Eric Ries (C) e Erick Bretas, CEO da S.A. O Estado de S. Paulo, durante painel na Rio Innovation Week  Foto: Pedro Kirilos/Estadão

Para Ries, um ponto crucial para essa estratégia avançar é os gestores reconhecerem que, às vezes, eles são o principal problema. “Não dá para contratar um consultor e querer implantar mudanças se não houver abertura, pois é um processo complexo e que envolve diferentes camadas, tanto na gestão quanto na estrutura organizacional. Requer compromisso em todos os níveis. Mas, se a empresa tiver comprometimento em fazer esse trabalho, vejo um sucesso tremendo”, destacou.

Resiliência para empreendedores e investidores

Sob olhar de uma plateia que incluía muitos empreendedores, alguns inclusive com exemplares de seus livros em mãos, Ries fez questão de normalizar o fracasso e as incertezas no caminho de quem atua com startups. Ele também reforçou a importância de experimentar rápido e validar o produto para não perder tempo. “E, às vezes, se algo der errado, você tem de olhar no fundo do poço e ver que aquilo ali foi uma boa experiência de aprendizado”, disse.

O especialista ainda observou que, em geral, a incerteza e o caos podem beneficiar quem atua no ramo das startups, especialmente porque a forma de lidar com esses cenários costuma ser feita com uma mentalidade diferente das corporações mais tradicionais. “Há situações em que é possível criar algo significativo que não seria viável em um ambiente mais burocrático. Mas isso só acontece se a startup for como um experimento científico, ou seja, com rigor, clareza e capaz de estruturar um produto mínimo viável em uma versão simples, rápida e barata”, ressaltou.

Questionado sobre como o fator dinheiro é decisivo para o avanço das startups, Ries relatou que sua experiência mostra que só capital não garante sucesso. “No Vale do Silício, há empresas com muito recurso que não têm nem sequer um produto. Às vezes, ter muito dinheiro pode ser tão perigoso quanto ter pouco dinheiro. É por isso que ter uma startup enxuta ajuda a definir prioridades e gerenciar melhor aquilo que se tem. Não precisa ser perfeito, desde que haja diretrizes claras e ações na direção correta”, frisou.

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Ele também comentou sobre como a relação entre investidor e fundador é decisiva para a consolidação de uma startup. “É essencial que o fundador e o investidor compartilhem a convicção sobre o que se está tentando fazer. E devem se importar um com o outro, ter um ‘match’. Isso é muito valioso tanto para criar oportunidades de negócio quanto para amplificar a confiança e o talento do fundador”, disse.

Ao reforçar que ser bem-sucedido ao investir em uma startup é uma questão de probabilidade, pois não há 100% de certeza, Ries deu mais um conselho para os empreendedores: entender a si mesmo. “É perguntar o que pode ser feito e estar alinhado com seu compromisso e interesse mais profundos, sua paixão. Assim, é muito mais provável que seja um sucesso, mesmo que a onda do momento não seja tão duradoura.”

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