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Como o Itaú conseguiu consolidar a liderança entre os bancos em meio a um cenário de turbulências

Com perfil mais conservador na concessão de crédito, banco teve seu desempenho descolado do mercado nos últimos três anos

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Foto do author Luciana Dyniewicz
Foto do author Carlos Eduardo Valim
Atualização:

Apesar do cenário de inadimplência recorde no País, o Itaú, o maior banco brasileiro, conseguiu se destacar e atravessar um período desafiador para o setor bancário com resultados muito positivos. Com uma estratégia que se provou bem-sucedida, o banco chega a 2024, o ano de seu centenário, com rentabilidade superior à dos concorrentes. A tendência, segundo analistas, é de que isso se mantenha nos próximos meses.

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Entre janeiro e setembro do ano passado, o Itaú registrou um lucro líquido de R$ 24,9 bilhões, um crescimento de 9,9% na comparação com os nove primeiros meses de 2023. Foi a terceira alta consecutiva para o período. Apenas em 2020, primeiro ano da pandemia, o banco havia tido queda no indicador.

Já os números de seus principais concorrentes caíram em 2023. O lucro do Santander recuou 36% nos nove primeiros meses do ano, e o do Bradesco, 29,7%. Foi o segundo ano consecutivo de queda nas duas instituições financeiras.

O descolamento do desempenho do Itaú na comparação com os concorrentes privados vem ocorrendo há cerca de três anos, período em que a taxa básica de juros, a Selic, escalou até ultrapassar a casa dos dois dígitos. Com o juro em alta, grandes bancos repassaram esse aumento aos clientes que buscavam empréstimos, mesmo sendo correntistas de maior risco. O Itaú, porém, enquanto segurava um pouco esse repasse, concedia crédito apenas ao cliente de menor risco.

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“Os competidores acabaram tendo problemas. Quem pegou crédito com taxa mais alta foi só quem já estava muito endividado e precisava demais do dinheiro. Acabou havendo um efeito adverso aos bancos, que viram as taxas de inadimplência aumentarem”, diz o analista Thiago Batista, do UBS BB.

Lucro do Itaú cresceu 9,9% nos primeiros nove meses de 2023; banco também registrou alta nos ganhos no mesmo período de 2021 e de 2022 Foto: Nilton Fukuda/Estadão

Os efeitos dessas estratégias — tanto do Itaú como dos concorrentes — devem se estender, pelo menos, por mais este ano. Isso porque, quando um banco é afetado pelo aumento da inadimplência, a recuperação é lenta, dado que a concessão de créditos cai e cresce a necessidade de fazer provisões no balanço para empréstimos que podem não ser pagos, segundo Batista. “O banco fica limpando as contas do passado”, diz. Enquanto isso, o Itaú “começa 2024 em outra velocidade.”

As boas perspectivas para o Itaú também são percebidas pelos analistas de ações do Citi, que, em relatório divulgado na terça-feira, 16, colocaram, em sua carteira ideal sugerida, os papéis do banco brasileiro com o maior peso, ao lado da Vale (15% para cada um).

O diretor financeiro do Itaú, Alexsandro Broedel Lopes, credita o desempenho do banco às transformações digitais e culturais que estão em andamento. As mudanças digitais têm dado maior agilidade e eficiência no atendimento ao cliente. E as culturais têm feito os funcionários se adaptarem a esse novo cenário promovido pela tecnologia.

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“Toda essa mudança é focada em uma única coisa, que é melhorar a qualidade do atendimento ao cliente”, diz. “Mas, se você tiver uma tecnologia melhor sem transformar sua organização culturalmente, você não gera fluxo.”

Entre as mudanças promovidas na cultura da empresa estão a redução de níveis hierárquicos e a adoção de uma maior velocidade na tomada de decisões. Os diretores também deixaram de olhar para os produtos separadamente, como “cartões” ou “crédito imobiliário”, e passaram a ser responsáveis por unidades de negócios como “pessoa física” e “pessoa jurídica”.

“Os executivos não estão hoje olhando a maximização do resultado do produto. Eles estão olhando isso de uma forma mais transversal. Essa é uma mudança cultural enorme”, afirma Lopes, que acrescenta que a estratégia não muda para os próximos anos.

Para Lopes, resultados positivos são consequência de transformação cultural e digital do banco Foto: TABA BENEDICTO/ ESTADAO

Na visão dos analistas, no entanto, os fatores que realmente favoreceram o Itaú nos últimos anos foram o perfil de correntista do banco e a estratégia de risco adotada. Com maior poder aquisitivo, o cliente do banco já costuma ter uma inadimplência mais baixa em relação à média do mercado. Ao mesmo tempo, por, historicamente, já ser mais conservador na concessão de crédito, a instituição financeira não esteve tão exposta ao risco quando a taxa Selic subiu.

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O banco até mesmo se mostrou menos vulnerável ao rombo divulgado pela rede de varejo Americanas, que afetou todo o mercado de crédito em 2023. Os empréstimos do Itaú para a varejista eram relativamente baixos. Dentre os pelo menos R$ 14,2 bilhões que os grandes bancos separaram para proteger os seus balanços de um possível calote da Americanas, a instituição precisou provisionar R$ 1,3 bilhão. Dessa forma, apesar do seu porte, o Itaú foi apenas o sexto banco que mais tinha empréstimos para a varejista.

De acordo com Lopes, essa estratégia mais conservadora o protegeu da volatilidade dos resultados do setor. “O banco é um dos menos expostos à variação da Selic, porque operamos ´hedgeados´ (com proteção contra variações contrárias à aposta principal de investimentos)”, afirma. “Então, não somos o banco que mais ganha quando a Selic sobe, nem o que mais perde quando ela cai.”

Dessa forma, segundo ele, não se deve esperar uma mudança de postura do Itaú, para compensar o fim do lucro mais fácil, agora que a taxa de juros está em trajetória de baixa. “O nosso apetite por risco não vai necessariamente aumentar por conta de uma Selic menor”, diz Lopes. “Mas podemos nos beneficiar, mesmo assim, da baixa dos juros, porque o espaço para o crescimento de nossa carteira deve aumentar. Se a Selic ficar menor, isso significa que, provavelmente, a inflação estará sob controle, então, a renda disponível das pessoas aumenta, e os juros vão consumir menos dela.”

Portanto, vai abrir um espaço para o crescimento da carteira de crédito e de serviços, o que pode beneficiar os negócios de seguros, banco de atacado e a indústria de fundos, por exemplo, defende o executivo.

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Lopes: 'Nosso apetite por risco não vai necessariamente aumentar por conta de uma Selic menor' Foto: TABA BENEDICTO/ ESTADAO

A possibilidade de ganhos em outras pontas acontece por conta do conceito que o Itaú chama de banco universal. “Não é uma estratégia de agora. Mas temos uma gestora de recursos fortíssima, um banco de investimentos extremamente importante, uma área de seguros em franco crescimento e operações de crédito em todos os segmentos”, diz. “Então, quando a Selic cai, até aumenta a possibilidade de ganhos em algumas operações que anteriormente estavam limitadas por conta dos juros altos.”

Essa atuação mais ampla também é uma característica que pode proteger o banco para quando os conceitos de Open Banking e Open Finance entrarem em franca operação no País. Os termos, que em inglês significam “banco aberto” e “finanças abertas”, representam a oportunidade de clientes de serviços financeiros autorizarem o compartilhamento de seus dados entre diferentes instituições. Ao permitir esse trânsito de informações, o cliente pode escolher o aplicativo de qualquer empresa, possivelmente uma startup, para acessar todas as informações sobre as suas diferentes contas e investimentos e para cotar os mesmos serviços em diversas instituições ao mesmo tempo.

Há ainda, para o Itaú e o resto do setor, um fator positivo para os negócios que estaria sendo subestimado, segundo relatório do Citi de 8 de janeiro. A lei 14.467, aprovada pelo Senado em dezembro de 2022, vai entrar em vigor em 2025 e deve tornar possível ampliar a oferta de crédito ao mesmo tempo que vai permitir uma compensação tributária mais rápida de créditos que não serão recuperados. Com essa mudança, os bancos podem ampliar entre 4% e 12% os seus lucros, entre 2025 e 2028, segundo contas do analista Renato Frade, do Citi.

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