RIO - O megainvestidor José João Abdalla Filho, o Juca Abdalla, quer um assento no conselho de administração da Eletrobras, mas enfrenta questionamentos por já integrar o colegiado da Petrobras e não querer deixá-lo, disseram ao Estadão/Broadcast pessoas com conhecimento do assunto. A empresa também confirmou a candidatura de Abdalla em fato relevante enviado ao mercado.
Pelo menos desde o ano passado, Eletrobras e Petrobras se consideram formalmente concorrentes, sobretudo depois que a petroleira anunciou planos de transição energética, que envolvem um aumento do negócio de geração de energia elétrica. Isso tem criado dificuldades práticas para executivos que desejam manter um pé em cada canoa.
Abdalla, apurou o Estadão/Broadcast, não assinou nenhum documento se comprometendo a deixar a Petrobras, caso seja aprovado para o conselho da Eletrobras. Esse procedimento foi adotado, por exemplo, pelo atual diretor de Transição Energética da Petrobras, Maurício Tolmasquim, um dos três nomes indicados pelo governo, na quinta-feira, 27, ao colegiado da Eletrobras.
Caso receba de fato os votos do governo na assembleia de acionistas do próximo dia 30 de abril e seja aprovado na Eletrobras, Tolmasquim se comprometeu por escrito a deixar a petroleira, como mostrou o Estadão/Broadcast.

A Eletrobras exige conformidade dos indicados com os critérios presentes na lei das SA (6.404), que tem expresso no seu artigo 147 a proibição da eleição do conselheiro que “ocupa cargos em sociedades consideradas concorrentes no mercado, em especial, em conselhos consultivos, de administração ou fiscal” — o caso de Abdalla. Mas o próprio texto abre exceção para aquele que tiver “dispensa da assembleia-geral”, prerrogativa na qual o empresário se apoia.
A Eletrobras confirmou que o investidor é candidato ao conselho de administração da companhia e pediu uma espécie de “waiver” (dispensa) das regras de elegibilidade para disputar vaga no colegiado.
Em fato relevante enviado à CVM, a Eletrobras tornou pública a justificativa de Abdalla para pleitear a vaga no conselho de administração e acumular as posições nos colegiados das duas companhias que hoje se consideram concorrentes.
No documento, Abdalla reconhece que sua eleição está condicionada à “eventual dispensa prévia pela assembleia geral” dos critérios de elegibilidade previstos na Lei das S/A (6.404) seguidos pela Eletrobras.
Ele defende o seu pleito sob o argumento de que é investidor de longo prazo da empresa com participação relevante e se compromete a não participar de discussões que possam se relacionar à Petrobras, onde pretende seguir atuando.
“Sou um investidor da Eletrobras de muitos anos, detenho uma participação relevante. Além disso, me comprometo a não participar de decisões que possam se relacionar com a Petrobras ou que gerem algum contexto concorrencial”, diz Juca Abdalla.
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Cemig
Ainda que não abra mão de estar no board da Petrobras, Abdalla renunciou à cadeira que mantinha no conselho de administração da Cemig, para reduzir o estresse de uma candidatura na Eletrobras. A avaliação é de que a companhia tem concorrência mais marcada com a Eletrobras.
Formalmente, o Fundo de Investimento em Ações Dinâmica, controlado pelo Banco Clássico, de Abdalla, indicou ao conselho de administração da Eletrobras tanto seu nome quanto o do advogado Marcelo Gasparino, que já integra o colegiado e poderia ser reconduzido. Segundo pessoas a par do processo eleitoral, o FIA Dinâmica não tem votos suficientes para eleger os dois executivos.
Quem é Juca Abdalla
O bilionário José João Abdalla Filho – ou Juca Abdalla – é um dos maiores investidores individuais no País. Aos 77 anos, ele nunca é visto nas rodas da elite carioca. Recluso, de poucos hobbies, muito discreto e distante dos luxos comuns para quem tem bilhões de reais, é o nome por trás do Banco Clássico. Abdalla é também o maior acionista individual brasileiro da “nova” Eletrobras. Sua posição só é inferior à da gestora 3G Radar – que tem entre seus sócios a 3G Capital, de Jorge Paulo Lemann.
Abdalla é o único dono do Banco Clássico, instituição com R$ 2,8 bilhões de patrimônio líquido e ativos de R$ 14,5 bilhões, conforme dados do Banco Central. O banco também tem um único cliente: o próprio Abdalla, funcionando como uma holding de seus investimentos.
Na sua carteira de investimento, que começou a montar há mais de duas décadas, aparece uma preferência pelas empresas do setor energético e estatais, tradicionalmente boas pagadoras de dividendos. Engie, Cemig (na qual também tem cadeira no conselho de administração) e Kepler Weber são algumas das ações selecionadas. Também investe na Naturgy, controladora da Companhia Estadual de Gás (CEG), do Rio.