A linha que produz nada menos de 2 milhões de unidades do chocolate KitKat por dia é o primeiro passo da Nestlé rumo à criação da “fábrica de chocolate inteligente”. A internet 5G – cujo tempo de resposta é mais rápido, permitindo um nível de automatização muito maior em processos fabris – já é utilizada na fábrica da suíça em Caçapava, no interior de São Paulo. (Veja vídeo abaixo)
É graças à internet ultrarrápida, que começa a dar os primeiros passos no Brasil, que a Nestlé conseguiu colocar em marcha seu carro-robô, que tem uma função para lá de nobre: é ele que transporta o wafer até a estação de chocolate, para criar o KitKat. O carro-robô tem uma antena que responde aos comandos de uma central. Ele pode circular mais rápido porque, com o 5G, seu tempo de resposta é instantâneo: ele pode frear rapidamente caso algum funcionário ou obstáculo apareça em seu caminho.
A fábrica de Caçapava, na região de São José dos Campos, é uma espécie de referência global para a Nestlé: é a primeira a receber uma rede 5G própria. A multinacional suíça, que tem fábricas em 79 países, escolheu o polo do munícipio paulista para o teste, uma vez que ali já funciona seu centro de pesquisa para soluções tecnológicas. Quando o que é aplicado por ali dá certo, a experiência é replicada para outras unidades do País e do continente americano.
Testes com o 5G se multiplicam em indústrias
O projeto que a Nestlé acaba de ativar em Caçapava vem para engrossar a lista de empresas no Brasil que estão testando a nova tecnologia para ganhar mais capacidade e autonomia em suas linhas de produção. Companhias como Gerdau, Stellantis e Weg também já têm projetos com 5G em conjunto com as fornecedoras da tecnologia Ericsson, Nokia, Huawei, Embratel, IBM, NTT, entre outras.
A Confederação Nacional da Indústria (CNI) estima que o impacto do uso do 5G no Brasil será de até R$ 80 bilhões até 2030. Segundo levantamento da consultoria Frost & Sullivan, a adoção da rede ultrarrápida deve elevar o faturamento global do mercado de automação de US$ 3,5 bilhões, em 2021, para US$ 5 bilhões, em 2026.
É como se a fábrica agora pudesse pensar sozinha
Marcelo Melchior, presidente da Nestlé Brasil
A rede da Nestlé é uma parceria com Ericsson e a Embratel, e a faixa utilizada é a de 3,5 Ghz, onde há o melhor tráfego para o sinal. A velocidade média de navegação chegou a 700 megabytes por segundo, enquanto a latência (tempo de resposta entre os equipamentos) foi de apenas 8 milissegundos – mais rápido que um piscar de olhos, que dura 50 milissegundos.
A rede também permitiu a conexão de vários dispositivos ao mesmo tempo. Isso tudo vai ajudar a desenvolver a inteligência artificial, internet das coisas, realidade aumentada, armazenamento de dados na nuvem, entre outras funcionalidades. Em suma, a fábrica vai evoluir do padrão automatizado para autônomo. “É como se a fábrica agora pudesse pensar sozinha”, diz o presidente da Nestlé no Brasil, Marcelo Melchior, em entrevista ao Estadão/Broadcast.
Por exemplo: a estação poderia identificar um estoque baixo de cacau e dar a ordem, de forma independente, para iniciar o reabastecimento. “Ela não está pensando, claro, está seguindo uma programação, uma diretriz. Mas isso tudo pode evoluir. É até bem preocupante não decidirmos sozinhos mais o nível de produção”, brinca o executivo. “O 5G abre uma possibilidade enorme de inovação. E olha que ainda não sabemos tudo que podemos fazer.”
Tudo sobre a internet 5G
Óculos de realidade aumentada
A nova rede da Nestlé também está sendo empregada nos óculos de realidade aumentada com imagens fiéis da planta que ajudam a treinar funcionários sem parar a linha de produção. Os óculos também servem para manutenção remota. Ou seja: um técnico especializado de outro país pode dar uma olhadinha no problema da linha sem ter de pegar um avião para essa tarefa.
A riqueza de detalhes permite até calcular o ritmo de desgaste futuro dos componentes e trocá-los antes de uma eventual pane. Mais uma vantagem: a rede 5G tem sensores sem fio, ligados a equipamentos sem cabo e menores, deixando mais espaços livres no edifício.
“Vamos ter mais flexibilidade de layout. Uma área que foi montada para produzir o chocolate A no dia seguinte poderia ser reorganizada para produzir o chocolate B”, conta Gustavo Moura, gerente do Programa de Transformação Digital para Operações da Nestlé. Isso é importante porque dá mais liberdade para criação de novos produtos, explica Moura.
O que dizem as parceiras da Nestlé
As fornecedoras de tecnologia para a rede da Nestlé, Ericsson e Claro/Embratel, dizem que esta foi a primeira rede 5G inteiramente privativa e customizada do País, com todos os componentes da infraestrutura – antenas, núcleo e servidor – localizados dentro da companhia, o que garante maior velocidade, menor latência e inibe riscos de segurança com acessos externos.
O presidente da Embratel, José Formoso, conta que a conversa para instalar a rede na fabricante de chocolates começou há cerca de dois anos, e os primeiros testes antes da instalação definitiva ocorreram há seis meses. “Quando se fala em 5G, todo mundo quer logo um celular. Mas, entre as indústrias, não é bem assim. É complexo porque estamos falando de segurança e logística, mas as aplicações ainda não estão prontas”, explica.
O vice-presidente de Negócios da Ericsson para o Cone Sul da América Latina, Murilo Barbosa, conta que há um interesse crescente no mercado pela nova tecnologia. “A indústria quer entender os diferenciais do 5G na prática. Temos recebido muitos contatos”, afirma, citando ainda que o caso da fabricante de chocolates vai servir como uma vitrine para outras corporações. A previsão da Ericsson é que os produtos e serviços ligados ao 5G superem aqueles do 4G a partir do ano que vem. Hoje, já somam 25% do faturamento com vendas.
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