São Paulo - Há menos de uma década, os milhares de pequenos e médios produtores rurais brasileiros eram atendidos por literalmente milhares de outros pequenos e médios revendedores de insumos agrícolas espalhados pelo interior do País. Geralmente ex-vendedores de grandes indústrias, como Bayer, Basf e Syngenta, eles abriam lojas locais para vender agroquímicos e sementes, fertilizantes e outras especialidades.
“O empreendedor típico do interior do País tem de duas a quatro lojas que ele fundou e ainda gere”, afirma Ruy Cunha, presidente da Lavoro Agro, a distribuidora de produtos agrícolas que o Pátria começou a formar em 2016 e hoje é a maior da América do Sul. O fundo de private equity (que compra participações em empresas) enxergou nessa pulverização uma oportunidade e começou a fazer aquisições para criar um competidor sul-americano da área.
Em agosto de 2017, comprou o colombiano Grupo Gral. Na sequência, foi a vez da mato-grossense Lavoro - de onde veio o nome do grupo. De lá para cá, foram mais de 30 aquisições, sendo a grande maioria distribuidoras e revendas. Assim, em vez das pequenas lojas locais, têm se tornado mais comuns nas maiores cidades do interior do País unidades padronizadas de redes como as da Lavoro.
Com receita de US$ 1,5 bilhão (cerca de R$ 7,5 bilhões pela cotação de terça, 24) nos primeiros nove meses deste ano, a Lavoro tem 215 revendas espalhadas no Brasil e na Colômbia e uma trading no Uruguai. Há outros fundos fazendo o mesmo movimento, como mostrou o Estadão/Broadcast.
“Temos em torno de 80 empresas em algum ponto da nossa fila de fusões e aquisições”, afirma Cunha. “Temos olhado Peru, Chile e Paraguai, mercados que nos interessam eventualmente entrar com nosso modelo de negócios, e sermos líderes da América do Sul.”
Parte dessas aquisições foi feita com recursos de uma Spac, como são chamadas as “empresas cheque em branco”, criadas com o propósito de se fundirem e aportarem capital em companhias emergentes e com alto potencial de crescimento. Ao se unir com a Spac The Production Board (TPB), em março, a Lavoro abriu capital na bolsa Nasdaq. Foi avaliada em US$ 1,2 bilhão e captou US$ 225 milhões.
“A ideia inicial era fazer um IPO (oferta pública de ações, na sigla em inglês), mas no meio do caminho encontramos o time do TPB e criamos uma parceria estratégica”, afirma. “Eles são especialistas em agro, investem em empresas de tecnologia agrícola e testes de solo, que inclusive estamos trazendo para o Brasil.”
A estrutura da Lavoro é um pouco diferente das concorrentes. Além da distribuição via lojas, que é o negócio principal, a empresa fabrica produtos de marca própria, que também vende para outros grandes clientes e empresas. “A fabricação de insumos está crescendo bastante dentro do grupo”, afirma Cunha.
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Há uma linha de negócios, dentro da holding Crop Care controlada pela Lavoro Limited, que junta fabricantes de defensivos biológicos, fertilizantes especiais e adjuvantes, compostos que prometem aumentar a eficiência dos produtos. Entre elas, está uma empresa na área de defensivos biológicos, a Agrobiológica, na qual estão quadruplicando a capacidade de produção.
Atendimento local
A intenção, com toda a gama de produtos, é ter em mãos um arsenal para oferecer ao cliente em várias frentes. “O grande produtor, mais sofisticado, é atendido diretamente pela indústria”, afirma. “Já o pequeno e médio são bem capitalizados, jovens e têm um gap de tecnologia para suprir, o que os torna muito interessantes do ponto de vista dos negócios”.
Assim, apesar da oferta nas lojas, a venda é feita na fazenda - e a prestação de serviços está embutida no negócio. São mais de mil especialistas para 72 mil clientes. “Esses produtores precisam de alguém que dê recomendações técnicas e apoiem o crescimento”, afirma. “Mais do que vender o insumo, quero ser o conselheiro preferencial e fazer com que seja mais produtivo. Meu negócio não é ficar empurrando o produto, mas olhar, entender a operação e recomendar alguma coisa que vá fazer sentido pra ele.”
Por isso, na hora das aquisições, a Lavoro busca empresas tradicionais em uma região, que já se relacionam e têm bom nome com o produtor. “Compramos uma posição majoritária, em geral 85% da empresa, e mantemos o dono como sócio”, afirma. “Em geral, ele fica na operação por um ou dois anos na área comercial, para a transição com o modelo Lavoro.” O nome original é mantido e mesmo quando a loja é transformada em Lavoro, ele permanece como uma submarca.
Na Nasdaq, a Lavoro tem sofrido desde a abertura de capital. Seus papéis caíram mais de 36% desde março. Entre os motivos, está o pouco volume negociado, bem como a variação no preço das commodities, que tem impactado o setor de maneira geral. “Faço negócio com grãos mas, para mim, é uma forma de vender insumos”, diz Cunha.
“O produtor que compra com a Lavoro para a próxima safra pode pagar à vista ou a prazo, com dinheiro ou grãos. Mas a posição é travada.” Outro motivo é a alta no preço dos fertilizantes, que impactou os produtores quando as commodities despencaram. Isso gerou inadimplência cíclica no setor.
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