Dono de uma transportadora de combustíveis, Márcio Takao gasta por ano cerca de R$ 30 mil em serviços de seguro ambiental, de carga e do caminhão, além de equipamentos de monitoramento em tempo real, câmeras de seguranças e outros itens para conseguir trafegar com a matéria-prima que leva para abastecer os postos na região noroeste do Estado de São Paulo.
Mesmo sem nunca ter sido alvo de criminosos, ele precisa desembolsar o montante por pura “precaução”. Ele tem negócios no Estado com o maior número de casos de roubo de carga no País. “Pagar esse serviço custa muito caro. Às vezes, algumas empresas preferem perder um caminhão ou dois no ano do que pagar o seguro de toda a frota”, diz.
A preocupação de Takao não é à toa, já que, segundo o relatório anual de roubos de cargas da Overhaul, São Paulo foi o Estado com o maior número de ocorrências no País em 2023, representando 42% do total de casos — um resultado 4% superior ante o ano anterior. Procurada, a Secretaria da Segurança Pública de São Paulo afirmou que adota políticas que têm se mostrado eficientes no combate ao roubo de cargas e que reduziu o número de ocorrências do tipo em 4,8% em 2023, na comparação com o ano anterior.
O destaque negativo para o Estado mais rico do Brasil acompanha o desempenho da região em que está localizado. Segundo o levantamento da consultoria, o Sudeste se manteve como a área com o maior número de roubos de cargas, sendo responsável por 76% das ocorrências. Em seguida, as regiões Sul (10%), Nordeste (8%), Centro-Oeste (5%) e Norte (1%) fecham o mapa desse tipo de crime no Brasil no ano passado.
Conforme os resultados do relatório, as sub-regiões com maior ocorrência de criminalidade continuam sendo aquelas localizadas nas regiões metropolitanas de grandes cidades.
Destaques negativos
Um dos pontos mais importantes para o escoamento de produtos no Estado de São Paulo, a região da Baixada Santista, que engloba o Porto de Santos, apareceu no levantamento com um dos destaques negativos em 2023. O documento aponta que, em cidades como Praia Grande, São Vicente, Guarujá e Cubatão, os casos de roubos de cargas quadruplicaram na comparação ano a ano.
“As empresas que têm carregamentos nessa região começam a tomar mais cuidado com os produtos”, diz o gerente de inteligência da Overhaul no Brasil, Reginaldo Catarino. “Às vezes, o custo de segurança da carga pode impactar diretamente a escolha do modal de transporte para as companhias.”
Para o presidente do grupo BBM, um dos maiores operadores logístico do Mercosul, Antonio Wrobleski, as empresas enfrentam um grande problema na região portuária que atende ao maior mercado nacional, que é a região de São Paulo. “É uma área que merece uma atenção especial quanto ao investimento em segurança no transporte.”
Questionada, a Autoridade Portuária de Santos (APS) afirmou à reportagem que não se pronuncia sobre o assunto.
A Secretaria da Segurança Pública de São Paulo afirmou que está atenta aos indicadores na Baixada Santista e que tem concentrado esforços para combater os casos com uso de “inteligência, tecnologia e operações integradas”. “Prova disso foi uma ocorrência recente na região, que resultou na recuperação de uma carga de cigarros avaliada em R$ 7,2 milhões, no dia 23 de janeiro deste ano, em Cubatão. Na ação, a Polícia Militar prendeu 15 criminosos em flagrante e apreendeu dois adolescentes”, disse o órgão, em nota.
O governo de São Paulo também afirma desenvolver estratégias de enfrentamento à criminalidade em conjunto com as polícias Civil, Militar e outros órgãos por meio do Programa Pró-Carga e diz que vistoriou 425 locais suspeitos em todo o Estado, “enfraquecendo atividades ilícitas”.
“O policiamento segue intensificado pela Polícia Militar em todo o território paulista, por meio da Operação Impacto, com o objetivo de combater o crime organizado, incluindo quadrilhas especializadas nessa modalidade criminal”, afirmou a secretaria, em nota.
Aumento na criminalidade
Outro endereço que começa a apresentar aumento no número de casos de roubos de carga é o Sul do País. Ao longo dos últimos anos da pesquisa, Estados sulistas costumavam aparecer na terceira posição em número de casos. Em 2023, a microrregião subiu uma posição e ficou em segundo lugar, atrás apenas do Sudeste.
Segundo Catarino, da Overhaul, uma possível explicação para os casos pode estar relacionada com o desenvolvimento do mercado de agronegócios nessa localidade e também com o choque de oferta de defensivos agrícolas, devido à escassez do produto e pico nos preços após o início da Guerra da Ucrânia. “Foi um número bastante relevante de casos”, diz o executivo.
Um estudo da Federação das Indústrias do Estado do Rio de Janeiro (Firjan) mostra que esse tipo de crime é bastante concentrado. No Estado do Rio, acontece principalmente em 22 dos 92 municípios, e em regiões específicas. No ano passado, aproximadamente 97% dos casos registrados foram na Região Metropolitana, sendo que mais da metade ocorreu em oito das 137 Circunscrições Integradas de Segurança Pública (CISP) do Estado.
O pico dos roubos de cargas no Estado aconteceu em 2017, o que levou o Rio a superar São Paulo como o mais impactado por esses crimes, mesmo tendo um volume menor de transporte de mercadorias. Desde então, os casos vêm caindo, fazendo o Estado perder a liderança. Mas a situação ainda preocupa. Considerando o valor médio das cargas roubadas nas estradas fluminenses, o prejuízo foi de R$ 283 milhões.
Segundo o vice-presidente da Comissão de Transportes da Federação Nacional de Seguros Gerais (FenSeg), Marcos Siqueira, as quatro regiões com maior incidência de roubos no País são Itapecerica da Serra (SP), área próxima de Campinas (SP), Rodovia Fernão Dias, que liga São Paulo a Minas Gerais, e Pavuna, bairro do Rio de Janeiro. “Os locais com índices mais altos de casos têm muito a ver com a rota, com tráfego de produtos”, diz Siqueira.
A Secretaria de Segurança Pública do Estado do Rio informou que, em 2023, houve o menor número de ocorrências de roubo de cargas desde 1999.
“As reduções dos crimes contra o patrimônio e contra a vida são resultado do forte investimento - R$ 2,5 bilhões - que o governo do Estado do Rio vem fazendo em tecnologia, inteligência e treinamento das forças policiais e do trabalho integrado das polícias Civil e Militar”, afirmou a secretaria, em nota.
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