O imbróglio envolvendo as discussões para a troca de controle da gigante sucroalcooleira Atvos, a antiga Odebrecht Agroindustrial, para o fundo Mubadala Capital, de Abu Dhabi, poderá cair no colo do Tribunal de Contas da União (TCU), conforme fontes consultadas pelo Estadão. O TCU poderia entrar na jogada porque tanto o Banco do Brasil quanto o Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) são credores da Atvos.
Uma das razões seria um desconto dado para a dívida da empresa, que está em recuperação judicial, em um momento em que ela estaria em retomada diante do ciclo positivo do mercado. Além disso, movimento acontece às vésperas da troca do comando das estatais após a troca do governo federal.
Como a reunião realizada na semana passada para discutir o assunto terminou sem uma decisão, foi definido um novo encontro na próxima quarta-feira, 28, para tentar selar o futuro da companhia. O holofote está voltado para a possibilidade de o TCU barrar a assembleia para analisar os números. A ideia é analisar se as perdas para os bancos com o desconto na dívida podem ser significativas. Procurado, o TCU disse que somente se manifesta por meio de seus acórdãos e que não localizou processos relativos a esse assunto.
Um dos argumentos que está sendo apresentado pela Atvos aos credores é de que não seria necessária a entrada de novo dinheiro na empresa. Não é o que está acontecendo dentro do acordo com o Mubadala, que terá a obrigação de injetar R$ 500 milhões no negócio. Em troca, ganhará um desconto de cerca de R$ 2 bilhões no valor da dívida da Atvos, com três anos para começar a pagar e prazo total de 20 anos para acertar todo o débito. Além dos R$ 500 milhões, o cálculo de uma fonte ligada ao assunto é de que a Atvos demandaria ainda mais R$ 1,5 bilhão em três anos.
Na reunião que poderia ter dado a chancela para a mudança de controle, na última sexta-feira, 16, foi apresentado um laudo econômico-financeiro aos credores, que apontou que a empresa seria “econômica e financeiramente viável e sustentável, sem qualquer necessidade de capitalização ou captação de novos recursos”.
O documento destacou ainda que o acordo de recuperação judicial da empresa seria “economicamente melhor e mais vantajoso, sob o ponto de vista de recuperação de crédito para os credores, do que o acordo (com o Mubadala), o qual irá gerar perdas financeiras e econômicas no montante de R$ 2,2 bilhões”, segundo o documento obtido pelo Estadão e assinado pela MS Cardim & Associados. Os credores, contudo, explicou uma fonte, não viram valor do laudo, por considerá-lo “sem credibilidade técnica”.
Além disso, chama a atenção os bancos públicos aceitarem o desconto da dívida da Atvos muito perto da troca de suas administrações pelo governo Lula. Da dívida de aproximadamente R$ 12 bilhões da empresa, o BNDES e Banco do Brasil concentram cerca de 70%.
Na reunião de sexta-feira, o representante do BNDES disse acreditar que o acordo com o Mubadala era a melhor solução para a empresa e seus credores. Na mesma reunião, conforme ata do encontro obtida pelo Estadão, a representante da Caixa afirmou que não concordava com qualquer liberação de garantia, incluindo as garantias dadas pela Novonor (antiga Odebrecht), como previsto no acordo com o Mubadala. Para analisar o caso, a Caixa pediu um prazo de 60 dias.
Relembre o caso
Troca de controle
Pelo acordo desenhado entre Mubadala e os bancos, o fundo passaria a deter 31,5% da Atvos, em troca de um aporte de R$ 500 milhões na empresa. Os bancos credores, que também inclui Itaú Unibanco, Bradesco e Santander, ficariam com uma participação de 60% na empresa. O fundo americano Lone Star, que hoje controla a empresa, e a Novonor (ex-Odebrecht), dividiriam uma fatia de 3,5%. Ricardo K., executivo conhecido por recuperar empresas, também terá uma pequena participação.
Hoje controlador da Atvos, o fundo americano já reagiu contra a operação e tenta reverter a decisão na Justiça. Solicita que ao menos tenha direito de preferência. Segundo fontes, no entanto, a ação do fundo poderia ser facilmente rebatida porque o plano de recuperação judicial não estabeleceria esse direito.
Procurado, o Lone Star diz que a “transação proposta ignora a significativa virada operacional e financeira da empresa”. “Essa desnecessária transação reduzirá significativamente o valor da dívida da Atvos mantida por seus credores. Foi fechada sem um processo competitivo e sem consulta à administração da Atvos em relação ao desempenho, condição financeira ou perspectivas da empresa. Não entendemos como os demais credores poderiam concordar com tal transação sem um devido processo ou diligência.”
BNDES, BB e Mubadala não quiseram comentar.
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