A nova regra do Banco Central para transações com cartões pré-pagos fez derreterem as ações do Nubank (-4,45%) e da PagSeguro (-7,96%) nesta segunda-feira, 26. As duas empresas são vistas como as mais prejudicadas pelas mudanças, enquanto, do outro lado da moeda, nomes “puros” de maquininhas, como Cielo e Stone, devem se beneficiar.
O BC limitou a 0,7% a tarifa de intercâmbio que pode ser cobrada em transações feitas com cartões pré-pagos. Também determinou que a liquidação financeira dessas operações aconteça em até dois dias. Atualmente, o intercâmbio da modalidade é livre, e o prazo de liquidação chega, na média, a 28 dias.
A norma reduz receitas dos emissores de cartões pré-pagos, que além do maior intercâmbio, ganham com o chamado “float” (aplicação dos recursos das vendas até a data de liquidação). “Enquanto o emissor do cartão de débito recebe um intercâmbio de 0,5%, os emissores de pré-pagos recebem até 2%, além de liquidar 30 dias depois”, diz Edson Luiz dos Santos, especialista no mercado de pagamentos e fundador e sócio da Colink Business Consulting.
As duas fontes de receita são especialmente importantes para bancos digitais e fintechs, que emitem mais cartões pré-pagos que os bancos tradicionais e usam o intercâmbio para compensar isenções de tarifa em uma série de produtos. Nubank e PagSeguro seriam, sob este aspecto, os primeiros da lista.
As duas companhias tentaram acalmar o mercado. O Nubank afirmou que suas receitas nos 12 meses encerrados em junho seriam 2,9% menores se a regra estivesse em vigor desde 2021. A PagSeguro, por sua vez, calcula que o lucro pode variar 1% para cima ou para baixo: além de emissora, a empresa também é credenciadora, e paga intercâmbio a outros emissores.
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Efeito dominó
Analistas acreditam que o problema é o efeito dominó das mudanças sobre os resultados financeiros. Otavio Tanganelli, do Bradesco BBI, calculou que o lucro operacional da PagSeguro pode ficar 15% abaixo da atual estimativa para o ano que vem, mesmo com uma redução bem menor (de 3%) na receita.
No caso do Nubank, o banco vê uma possível frustração de expectativas. “Embora entendamos que a mudança não produziria um impacto material, ela reflete nossa visão de que a monetização dos clientes será desafiadora, e em consequência, a alta rentabilidade esperada será difícil de atingir”, disse Gustavo Schroden.
Eduardo Rosman, do BTG Pactual, espera uma perda maior para a PagSeguro no caso das receitas com float. “É de nosso conhecimento que o Nubank usa a trilha do débito para o cartão pré-pago, enquanto a PagSeguro usa a trilha do crédito”, escreveu. Ou seja: o Nubank já seguiria norma semelhante à criada pelo BC, mas a PagSeguro não.
No outro lado da moeda, empresas puramente de maquininhas ganhariam rentabilidade, dado que seus custos de transação cairiam. O BTG espera um aumento de até 5% no lucro operacional estimado para a Cielo, e de 10% para a Stone.
O Citi, por outro lado, acredita que a PagSeguro deve se ajustar à nova realidade. “O limite para o pré-pago está em discussão por quase um ano, e podemos inclusive dizer que o limite de 0,7% veio melhor do que o esperado (pensávamos em um limite de 0,5%, similar ao débito)”, disse o analista Gabriel Gusan.
Expectativa versus realidade
O sócio de Bancário e Inovação Financeira do TozziniFreire Advogados, Pedro Eroles, afirma que mesmo acima do que o BC havia proposto, o limite não atende às fintechs. “Nos comentários da consulta pública, ficou claro que os emissores de pré-pago não queriam uma regulação imposta pelo BC”, diz ele.
Na consulta, entidades como a Zetta afirmaram que não era possível equiparar o intercâmbio dos cartões pré-pagos ao débito porque as contas de pagamento, a que os pré-pagos estão atreladas, são mais limitadas que as contas de depósito. Não permitem, por exemplo, o uso dos depósitos para conceder crédito.
Havia a expectativa de uma regulação de acordo com o volume transacionado pelas empresas, o que também não aconteceu. Para Felipe Prado, sócio da área de Mercados Financeiro e de Capitais do BMA Advogados, o único “alívio” foi no prazo de implementação da nova regra, que passa a valer em abril.
“Com esse prazo, o regulador espera que aquelas instituições de pagamento que dependem da receita oriunda principalmente do float façam uma adequação”, pontua. A partir de agora, o relógio está rodando.
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