Para aumentar a cobertura de seguros no Brasil vale tudo, até oferecer apólices de graça

Hoje, somente 20% dos brasileiros têm alguma apólice de seguros; para ampliar o mercado, grandes seguradoras e startups apostam nos microsseguros, que são oferecidos sem custo ou por valores muito baixos

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Por Andre Jankavski e Lucas Agrela
Atualização:

Após mais de oito décadas, a Porto decidiu realizar uma grande mudança na sua marca: retirou o “Seguro” do seu nome. Foi uma tática para ser vista pelo consumidor como mais do que uma seguradora - para isso, passou a oferecer novos produtos. Muitos deles, aliás, serão derivados de sua atividade principal. De olho na simplificação que a Superintendência de Seguros Privados (Susep) tem feito no setor nos últimos anos, a companhia quer oferecer novos tipos de apólices, indo além do público “endinheirado” que já tem o hábito de comprar seguros.

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Um exemplo é o lançamento de um seguro por assinatura, que tem como meta convencer os donos de veículos mais antigos a fazer uma apólice. O Azul Seguro Auto funciona no mesmo modelo dos serviços de streaming: pode ser pago mensalmente e ser cancelado a qualquer momento, além de terpreços cerca de 40% menores do que o modelo convencional. Porém, á cobertura é mais limitada, com a devolução apenas de 90% do valor do veículo em caso de acidente ou furto..

“Esse tipo de produto faz com que as pessoas percebam que ter um seguro mais simples é melhor do que não ter nada. E descobrem que contratar um seguro é mais barato do que imaginam”, afirma Marcelo Picanço, presidente da área de seguros da Porto. Entre os produtos de “entrada” ele cita seguros para celulares, bicicletas e o que garante pelo menos um guincho em caso de pane no veículo. Outra área em crescimento é a voltada a animais de estimação, área na qual a empresa tem parceria com a Petlove. 

Marcelo Picanço, CEO da vertical seguros da Porto, acredita que mesmo um seguro mais simples seja melhor do que nada Foto: Divulgação/Porto/Fernando Marinho

A Porto Seguro não está sozinha na tentativa de popularizar o setor de seguros – hoje, apenas 20% da população têm algum tipo de cobertura no País. Empresas como PicPay e Santander já oferecem o seguro para golpes do Pix, que protege contra transferências feitas sob coação. Já a American Life oferece a casais do mesmo sexo um seguro de vida que inclua proteção contra ataques homofóficos. E a Youse tem apólice para proteção de pintura de veículos. Esses seguros partem de preços muito baixos (abaixo de R$ 5) e alguns são até ofertados gratuitamente.

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Esses lançamentos vêm sendo acelerados por causa de um movimento recente da Susep. Desde o início da pandemia, a autarquia vem buscando simplificar a regulação do setor, especialmente com a redução de custos regulatórios, tornando a atuação mais próxima da vista em países desenvolvidos. Para este ano, estão em estudo nove revisões, atualizações ou elaborações de nove tipos de regulamentações de seguros diferentes (como o rural, habitacional e o de coberturas por sobrevivência).

Algumas mudanças já facilitam a vida de quem quer comprar uma apólice. Até pouco tempo atrás, por exemplo, não era possível uma pessoa contratar seguro funeral em grupo para a família inteira, somente cônjuge e dependentes. Agora, outros familiares podem entrar na conta. “A Susep quer permitir e incentivar que o mercado possa inovar em produtos e canais e permitir a livre iniciativa”, afirma Carlos Roberto Queiroz, diretor da Susep.

Concorrência

Esse movimento de simplificação das regras ajuda a criar um ambiente de concorrência que facilita a entrada de novas empresas. Entre elas está a ThinkSeg, criada por Andre Gregori, ex-presidente da área de seguros do banco de investimentos BTG Pactual, que vende um seguro para automóveis que pode ser “ligado” e “desligado” conforme o uso, reduzindo os custos tanto para a empresa quanto para o cliente.  Por meio de um aplicativo para celular, é possível, por exemplo, desligar a proteção contra assaltos enquanto o motorista está a 100 km/h em uma estrada ou a proteção contra batidas e danos a terceiros quando o veículo está parado na garagem de casa.

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Criada por Andre Gregori, ThinkSeg vende um seguro para automóveis que pode ser “ligado” e “desligado” conforme o uso, reduzindo os custos tanto para a empresa quanto para o cliente Foto: Divulgação/ThinkSeg/Felipe Gabriel

“O grande diferencial não é ser digital, mas oferecer experiência fluida e marketing forte. Isso é perfumaria. Buscamos criar um produto completo, com 100% das coberturas tradicionais, a um preço mais barato.O segredo é que eu passei um ano modelando o negócio pensando no indivíduo”, afirma Gregori. Devido ao seu modelo de negócios, a empresa tem taxa de sinistralidade de 49%, abaixo do mercado, que é de cerca de 70%.

Insurtechs

A Thinkseg é uma insurtech, como são conhecidas as startups de seguros. De acordo com o estudo Latam Insurtech Journey, o Brasil tem 129 empresas no setor, o que representa 32% do total da região.  Uma das que conseguiram maior destaque é a Pier. A companhia recebeu um aporte de R$ 108 milhões em 2021 e tem 120 mil clientes, oferecendo seguros oferecidos para automóveis e celulares. Com o uso de tecnologia para análise de fraudes, a empresa já conseguiu liberar o reembolso de um cliente em apenas um segundo.

Toda a contratação é feita pelo site ou aplicativo da startup, mas também há parcerias com empresas, como a montadora Jeep. Nos veículos da montadora, os dados de quilometragem e tempo de uso são enviados para a startup, que cria um plano de seguro individual. A Pier foi pioneira no registro de seguradora digital da Susep, viabilizando pagamentos mais velozes e contratação por canais digitais.

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“Buscamos entender os motivos da falta de contratação de seguros com pesquisas, e os resultados mostram que o problema é de custo alto e de falta de sentido do produto para suas necessidades”, afirma Igor Mascarenhas, CEO da Pier. “Fizemos um produto que permite que o consumidor esteja protegido em poucos cliques, sem pegadinhas nas letras miúdas.”

Em outro segmento, a Amar Assist quer popularizar o seguro de vida de uma maneira diferente: para isso, oferece o serviço de maneira gratuita por um ano. Para ter acesso ao produto, que dá indenização de até R$ 20 mil em caso de morte, basta o usuário ter o aplicativo da empresa instalado em seu celular.

A ideia da companhia é que o usuário tenha o primeiro contato com o seguro para depois migrar para outros produtos de baixo custo, como o seguro funerário, de internação hospitalar e de jazigos. "É um investimento nosso em aquisição de clientes e por meio da análise de dados dos usuários podemos oferecer os melhores serviços para eles", afirma Bruno Gallo, presidente da Amar Assist.

Mercado

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Apesar de ser o maior mercado da América Latina, com R$ 306,4 bilhões em faturamento, a maior parte dos brasileiros não tem um seguro para chamar de seu. O mais popular é o de automóvel, com cerca de 30% da frota segurada, enquanto os de residência e de vida mal chegam a 10% da população. Na visão de Antônio Penteado Mendonça, especialista no setor e sócio da Penteado Mendonça e Char Advocacia, esse movimento de insurtechs e novos seguros de entrada é válido, mas ele não transforma o mercado como deveria – e nem deve ampliar tanto assim o faturamento do setor.

“Não é com o microsseguro que o mercado vai mudar. Se forem 20 milhões de pessoas pagando R$ 14 ao ano, isso não fará grande diferença no faturamento do mercado. O pulo do gato está na modernização do seguro de vida, incluindo opções como o resgate em vida e a cobertura para doenças graves. Nos automóveis, coberturas parciais ou intermitentes podem mexer bastante no setor.”

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