Se o Brasil quiser recuperar pastagens degradadas de seu território terá de desembolsar um total de R$ 383,77 bilhões, revela estudo inédito do Centro de Bioeconomia da Fundação Getulio Vargas (FGV), ao qual o Estadão teve acesso com exclusividade. O levantamento mostra que 18,94% da área total do País – 160 milhões de hectares – é composta por pastos, sendo que mais da metade (52%) apresenta algum nível de degradação, especialmente em biomas como Amazônia e no Cerrado. O Brasil é um dos maiores produtores de carne bovina do mundo, sendo que 95% da produção nacional vêm de bois criados em pastos.
Uma pastagem mais saudável permite uma produção mais eficiente por parte da pecuária, menos emissão de carbono – uma das grandes críticas ao setor – e reduz a probabilidade de o pasto avançar em florestas, afirma o professor da FGV Eduardo Assad, um dos responsáveis pelo estudo. Um vazio que o estudo preenche, segundo ele, é o cálculo do valor financeiro envolvido, algo fundamental para sentar com os produtores e tratar o assunto de forma mais prática.
O estudo ainda responde a uma demanda dos defensores da pauta “ESG” (ambiental, social e governança, na sigla em inglês), além de dar uma resposta às críticas de investidores estrangeiros, em especial os europeus, que cobram mais responsabilidade do Brasil em relação às florestas. Além disso, pode colocar mais pecuaristas na rota de exportação de carne, visto que uma produção sustentável pode abrir novas portas ao produto nacional.
Estava faltando ter um valor. O pecuarista sempre perguntava o que ele ganharia com isso (recuperação da pastagem).”
Eduardo Assad, professor da FGV e um dos responsáveis pela condução do estudo
“Estava faltando ter um valor. O pecuarista sempre perguntava o que ele ganharia com isso (recuperação da pastagem). Agora, com o dado, colocamos a área da sustentabilidade econômica na discussão, que deixa de ser apenas social e ambiental”, afirma Assad.
A recuperação das áreas não significa que o local deixará de ser uma pastagem. Pelo contrário: a ideia é garantir que mais cabeças de gado possam ser criadas dentro de um espaço já existente. Com o uso de tecnologia, inclusive de sementes, o objetivo é adubar o solo para resgatar sua fertilidade, para que as chamadas forrageiras, que são as plantas que servem de alimento aos animais, possam ocupar a superfície do solo.
Além dos números financeiros, o estudo mostra a perda relevante de produtividade de solos muito degradados. Por exemplo: a pastagem considerada com um nível de degradação muito forte, que é aquela com predominância de solo descoberto e com sinais evidentes de erosão, o nível de produtividade despenca 80% em relação a uma pastagem saudável. Alem disso, a emissão de gás carbônico em uma pastagem nessa situação é muito elevada, ao passo que em um solo bom pode haver, até mesmo, captura de gás de efeito estufa da atmosfera.
Para convencer o setor que a recuperação da pastagem é um bom negócio, o estudo demonstra que, se o Brasil decidir recuperar 15 milhões de hectares, por exemplo, o custo seria de R$ 21,17 bilhões, ao passo que as receitas advindas deste processo somariam R$ 36,77 bilhões. Na hipótese de se recuperar 30 milhões de hectares de pastagens, algo já indicado no Plano Agricultura de Baixo Carbono (ABC), o investimento seria de R$ 42,51 bilhões, com faturamento de R$ 75,55 bilhões, de acordo com o estudo da FGV.
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“A rentabilidade seria maior do que o investimento, algo muito positivo, isso sem contar a possibilidade de se vender o crédito de carbono. O que não se sabia até aqui era qual seria o investimento e quanto iria ganhar com isso”, afirma o professor da FGV. Com esses dados embaixo do braço é possível ainda se sentar com instituições financeiras para se definir possibilidade de financiamentos para os projetos.
O documento aponta ainda que a recuperação de pastagens é uma forma de proteger as florestas. Um número que chama atenção é que os Estados de Pará, Rondônia e Tocantins concentram 89% das áreas de pastagens degradas na região Norte do País – se essas áreas fossem recuperadas, isso poderia impedir o avanço da atividade na Amazônia.
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