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Prada, Chanel e Hermés: marcas de luxo se rendem ao e-commerce em busca de ‘ricaços do interior’

Marcas demoraram para aderir ao comércio eletrônico por causa do desafio de transportar a experiência premium de consumo das operações físicas para o mundo virtual, sem perder a principal característica que é a exclusividade

Foto do author Wesley Gonsalves
Foto do author Lucas Agrela
Atualização:

A diretora de marca Joana Laprovitera passou a comprar tudo online logo que surgiram os primeiros sites de venda de artigos de moda. Com o tempo, também passou a comprar mercadorias de alto valor, incluindo itens de luxo, como acessórios e vestimentas. “Sem dúvida, o que me leva a comprar de forma online, seja em e-commerce, Instagram ou WhatsApp, é a comodidade e o ganho de tempo”, diz ela, que também gosta das lojas físicas. “É uma parte complementar da experiência de compra, gosto do contato humano e do atendimento mais humanizado.”

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O caso de Joana ainda é uma exceção no mercado de luxo, que concentra a maior parcela de vendas nas lojas físicas no País. Depois de ver marcas de fast fashion se digitalizarem na pandemia para operar no mundo virtual, agora, nomes do mercado de luxo começam a desbravar o e-commerce em busca dos “ricaços”, seja nas principais capitais ou no interior do Brasil.

No País, nomes como Chanel, Hermés, Prada, Dior, Hugo Boss, Estée Lauder e outras etiquetas estreladas abrem seus sites para o mercado nacional. Para especialistas ouvidos pelo Estadão, os nomes grifados esperaram o momento de maior maturidade dentro do varejo virtual para iniciar operações. Para eles, o principal desafio das grandes “maisons de luxo” é transportar a experiência premium de consumo das operações físicas, que vão de cafés a taças de champanhe nas lojas, para o mundo virtual, tudo isso, sem perder a principal característica deste mercado de luxo: a exclusividade.

Agora, consumidores de alto e altíssimo luxo podem consumir direto de casa os itens mais exclusivos, e caros, do mundo da moda.  Foto: Henry Nicholls/ Reuters

No mercado global, o nicho de produtos de luxo deve faturar US$ 354,8 bilhões neste ano, um crescimento de 13,5% em relação a 2022, de acordo com dados da consultoria Statista. Porém, no Brasil, o crescimento estimado será mais modesto, chegando a 4,2% neste ano, indo a US$ 2,85 bilhões, 0,14% do PIB do Brasil em 2022.

No mundo, o gasto médio anual com produtos de luxo é de R$ 228,87 por pessoa e no País, R$ 65,15. Enquanto a média mundial de faturamento com produtos de luxo vendidos online é de 22,4% do total de vendas, no Brasil o número ainda é inferior, sendo de apenas 4,8% do total.

Foco na experiência

Quando o assunto é consumo de luxo, a questão em torno da experiência de compras é um dos grandes desafios dessas marcas, porque afinal, como transportar para uma compra no site algo como a estética de uma marca, seus diferenciais e ideal de exclusividade, ou até as regalias dos clientes endinheirados como taças de champanhe durante as compras ou a cordialidade dos atendentes?

Para a coordenadora do hub de moda e luxo da ESPM, Katherine Sresnewsky, o sucesso desse modelo de negócio, para as grifes, dependerá de como seus sites de compras conseguirão mimetizar as experiências oferecidas nas unidades físicas, ao mesmo tempo que garantam um bom serviço de entrega desses produtos, seja pela experiência de abrir os pacotes em casa, ou pela velocidade de entrega das compras. “O e-commerce de luxo que entender a dinâmica do varejo físico e transportá-lo para o universo virtual, com certeza, terá sucesso”, diz.

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Katherine lembra que nas lojas físicas cabe aos vendedores e vendedoras explicarem sobre os produtos, mostrar combinações e reforçar a qualidade dos itens e a história dos logos, o que nos sites pode ser feito através das ferramentas oferecidas pela tecnologia, como o uso das fotos, vídeos, chatbots e espaços para descrições detalhadas dos itens. ”Para se ter uma experiência luxuosa é preciso apresentar bem os produtos”, afirma.

Luxo silencioso?

A exemplo do que narra a especialista de luxo da ESPM, no site da francesa Hermés, conhecida pela exclusividade dos produtos feitos à mão e por exigir que suas clientes tenham um relacionamento com a marca para só então ofertar suas bolsas cobiçadas, os endinheirados podem escolher entre os mais diversos produtos da grife, tudo exposto virtualmente com uma imensidão de detalhes, do tipo de material a relação daquela determinada peça com a história da marca.

Na plataforma, é possível comprar desde uma gravata feita à mão, por meros R$ 2 mil, uma bolsa de couro pela bagatela de R$ 60 mil e até um par de brincos de ouro rosa e cravejados em diamantes por nada menos que R$ 200 mil. “Com corpo flexível em contraste com as abas rígidas, a bolsa 24/24 joga com as artes da ambiguidade e da estrutura”, descreve a marca sobre a bolsa feminina. “Todos os nossos produtos são enviados em nossa caixa laranja amarrada com a fita Bolduc”, explica o site de compras.

Seja nos e-commerces populares, como Shein e Ali Express, ou em sites de luxo, as formas de pagamento virtuais também foram exportadas para as plataformas de compra. Porém, diferentemente das “concorrentes” asiáticas que parcelam no Brasil suas compras em até 12 vezes no cartão de crédito, no caso da Hermés Paris, quem quiser arrematar o par de brincos de ouro rosa e diamantes, por exemplo, terá de pagar através do Pix, ou dividir sua compra em no máximo 6 vezes sem juros.

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Para algumas marcas, a chegada ao universo virtual ocorre tanto no e-commerce, quanto na divulgação sobre o site de compras nas redes sociais. No caso da Hermés, a companhia vem impulsionando anúncios nas redes sociais, convidando os consumidores a visitar a plataforma. A especialista em luxo explica que, para essas companhias, toda a estratégia de presença nas redes sociais é uma forma de atrair novos clientes, reforçar o posicionamento de exclusividade e também criar uma base de consumidores para o futuro, já que, uma das características do luxo é justamente o fator aspiracional do consumo.

Clientes mais exigentes

Uma das principais empresas de implementação de serviços e-commerce no País, a Corebiz foi a responsável por criar sites de compras de diversas marcas do mercado de moda no Brasil. Recentemente, a companhia gerenciou os projetos das plataformas virtuais de nomes como Chanel, Estée Lauder e Carol Bassi, entre outros.

O vice-presidente de vendas da Corebiz na América da Latina, Galba Junior, conta que os sites de compra focados nos mais ricos têm uma diferença “abissal” em comparação àqueles voltados ao público de massa, o que passa pela escolha de cores, imagens exibidas, design das plataformas e, principalmente, a usabilidade dos sites.

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O executivo da Corebiz pontua que os negócios do segmento de luxo têm uma preocupação muito maior com as questões envolvendo a percepção de marca. Galba acredita que, diferentemente do varejo massivo, no luxo, o desgaste de uma compra mal executada para a imagem da grife pode ser superior ao que seria caso ocorresse com uma loja de moda popular, o que faz com que grandes grifes olhem com uma “lupa” seus sites de compra, para evitar qualquer possível ruído na experiência de consumo.

“Feito é melhor do que perfeito? Para as marcas de luxo é preciso fazer essa equação, porque elas não querem se arriscar, mas não estar no e-commerce é ignorar essa fatia importante do mercado consumidor”, avalia.

‘Figital no luxo’

Dona de um brechó especializado em itens de grifes, Gabrielle Carvalho, foi uma das consumidoras que se rendeu, parcialmente, aos e-commerces de luxo, como Farfetch, Iguatemi 365 e agora, os sites das próprias marcas. A empresária conta que desde que o site da Hermés foi inaugurado no País, ela tem se aventurado na plataforma para conhecer a cesta de produtos disponíveis no e-commerce brasileiro.

Dona de um breché de peças de grife, a empresária Gabrielle Carvalho é uma das consumidoras que se rendeu ao e-commerce de luxo para consumir algumas das etiquetas mais cobiçadas sem ter que, necessariamente, se deslocar até as lojas físicas.  Foto: Daniel Teixeira/Estadão

Antes disso, ela já havia feito compras na plataforma de vendas da também francesa Dior. “No caso da Dior, o que me fez consumir no e-commerce foi o fato deles venderem as maquiagens, o que acabou sendo minha primeira compra. O que me levou a comprar lá também foram os mimos que o site oferecia nas compras acima de R$ 1 mil”, lembra.

No entanto, Gabrielle pontua que apesar de nomes estrelados da moda abrirem suas versões digitais, em alguns casos, ela deve manter o foco das compras na versão física, seja para manter o relacionamento com as marcas que operam em um segmento de maior exclusividade, o que demanda um relacionamento de compras na loja física, ou pela experiência premium, que ainda é muito diferente nos endereços físicos. “Entre comprar no e-commerce e na loja, eu prefiro ir numa loja, pela questão da experiência de consumo, que é totalmente diferente”, afirma a empresária.

Para clientes como Gabriela, uma estratégia utilizada pelos e-commcerces de luxo tem sido oferecer nos seus sites a possibilidade de se conectar com um consultor de vendas de uma das lojas físicas das marcas. No site da Chanel, por exemplo, os clientes podem fazer suas compras virtuais para itens de maquiagem, perfumaria e tratamento de pele, mas no caso de vestuário, os usuários do site são direcionados para um vendedor físico, que continua o atendimento iniciado de maneira virtual.

Expandindo o público

Se de um lado as grandes marcas internacionais estão de olho no e-commerce, por aqui, marcas nacionais focadas no público com maior poder aquisitivo também veem no varejo virtual uma forma de ampliar a sua carteira de clientes. Há nove meses operando seu site próprio, a marca Carol Bassi - adquirida em 2021 por R$ 180 milhões pelo grupo Arezzo&Co - é um dos exemplos de companhias voltadas para a alta renda que decidiu apostar no e-commerce. Com três lojas físicas, hoje, cerca de 20% do faturamento do negócio já ocorre pelas vendas virtuais.

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Após ser adquirida pelo grupo Arezzo&Co, por R$ 180 milhões, a marca Carol Bassi, que leva o nome da sua fundadora, tem apostado nas vendas no e-commerce de luxo para ampliar vendas no País.  Foto: Alex Silva/Estadão

Para criar o projeto do site Carol Bassi, o grupo Arezzo utilizou a sua experiência prévia com a marca de sapatos Alexandre Birman, focada no público A e B, para executar os seus planos de ampliar a base de consumidoras da marca.

O diretor de e-commerce do grupo, Flávio Spacca, explica que, atualmente, cerca de 60% das clientes que compram no site da marca são de uma nova base de consumidoras que não utilizavam as unidades físicas, enquanto 40% delas são usuárias de Estados onde a marca não têm filiais. “Nós tentamos trazer toda a experiência de consumo do mundo físico para o nosso site, desde o atendimento até o design da plataforma que se parece com a nossa loja”, afirma. “O cuidado com a experiência é a nossa prioridade”, complementa o executivo.

Para Katherine Sresnewsky, da ESPM, o amadurecimento do serviço de e-commerce de luxo no País ainda traz a possibilidade de descentralizar o consumo voltado ao público de alta renda, que até então, estava concentrado majoritariamente em cidades como Rio, São Paulo e Brasília, garantindo um crescimento exponencial das vendas no segmento no País.

“O Brasil tem uma demanda de luxo em todo o País, porque tem gente no Amazonas e na Bahia querendo consumir o luxo”, avalia. “O Brasil ainda tem muito espaço para crescer neste mercado. Nós temos consumidores chegando ao mercado de luxo todos os dias.”

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