Processos contra a Hurb na Justiça disparam em meio a queixas de clientes e hotéis

Agência de viagem é alvo de reclamações por não entregar pacotes contratados; hotéis parceiros alegam problemas de pagamento desde o início do ano

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Foto do author João Scheller
Foto do author Lucas Thaynan

O número de reclamações contra a agência de viagens Hurb vem crescendo nos últimos meses e tem causado preocupação sobre o futuro da empresa e sua capacidade de honrar contratos futuros com clientes e parceiros. Só nos primeiros quatro meses deste ano, o número de processos contra a companhia na Justiça paulista é 46% maior do que o registrado em todo o ano de 2022. Nesta segunda-feira, 24, o fundador da companhia, João Ricardo Mendes, renunciou ao cargo de CEO.

De janeiro a abril foram registradas ao menos 1.328 ações contra a agência, enquanto no ano passado foram 908 processos, segundo levantamento feito pelo Estadão com dados do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP).

Além disso, a empresa vem apresentando dificuldade em honrar o pagamento de hotéis parceiros e enfrenta uma crise de imagem nas redes sociais, onde os usuários passaram a classificar as práticas da empresa – de oferecer pacotes de viagem abaixo do preço de mercado – como “golpe da Hurb”. À reportagem, a empresa afirma não poder garantir datas específicas de viagem e diz estar tratando os problemas com os hotéis caso a caso.

Clientes não conseguem viajar

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A cineasta Giovana Ribeiro comprou um pacote para Curaçao com a Hurb ainda durante a pandemia, para viajar em 2022. No prazo limite para o envio das informações de voos e hospedagem, nada aconteceu. Ribeiro então teve de contatar a empresa, que ofereceu as opções de adiar a viagem para 2023 ou fazer o reembolso do valor pago.

“Como a gente já sabia que havia muitos problemas com a Hurb, decidimos pedir o reembolso completo”, explica Ribeiro. Ela diz que havia se preparado durante meses para sua primeira viagem internacional, o que incluiu emissão de passaporte, economia do valor da bolsa de estágio que recebia à época e o pagamento das vacinas necessárias para visitar o país caribenho. “Atrapalhou muito o meu planejamento pessoal”, conta.

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Depoimentos como esse se acumulam nas redes sociais desde que a Hurb – antigo Hotel Urbano – passou a focar na comercialização de pacotes de viagem flexíveis, principalmente durante o período da pandemia de covid-19.

Muitas das reclamações se referem à não entrega dos pacotes vendidos na modalidade flexível. Nela, os clientes devem sugerir três possíveis datas de viagem para que a empresa selecione uma delas – ou uma data próxima. A flexibilidade dada pelos clientes para a companhia buscar as melhores ofertas no mercado, aliada à tecnologia usada pela Hurb no processo, seriam os motivos para os valores baixos.

Porém, cada vez mais clientes têm aguardado até a data limite e ficado sem uma resposta da empresa. Em seguida, entram em contato com o SAC da companhia, que oferece a opção de adiar a viagem mais uma vez – e repetir o processo novamente – ou pedir o reembolso.

A economista Julia Borges havia comprado três pacotes de viagem com a Hurb durante a pandemia, para Cuba, Tailândia e Pernambuco. Perto da data de envio das informações de viagem, ficou sem uma resposta de empresa e, após tentativas frustradas de contato, decidiu expor a situação nas redes sociais.

O ex-CEO da Hurb, João Mendes, que renunciou após xingar clientes em redes sociais Foto: Hurb

“Quando viralizou, a Hurb entrou em contato comigo e ofereceu inverter as datas da viagem de Tailândia e Cuba e aí eu viajei para Cuba”, conta Borges. Em Havana, porém, descobriu que sua reserva no hotel havia sido cancelada por falta de pagamento da agência. “Não consegui contato com eles”, conta, citando que teve de alugar uma acomodação no Airbnb às pressas, pelo qual ainda aguarda estorno da empresa.

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Segundo o advogado Kristian Rodrigo Pscheidt, sócio do escritório MV Costa Advogados, caso haja uma falha na prestação do serviço dentro do prazo contratado, o consumidor pode pedir o dinheiro de volta ou exigir o cumprimento do que fora acertado.

Reclamações se acumulam

Na Justiça paulista, a empresa acumula mais de 1,3 mil processos em 2023. Os valores pedidos em todas as ações somam mais de R$ 42 milhões, números referentes a todos os processos abertos contra a empresa no TJSP em 1.ª instância.

As queixas contra a agência de viagens se acumulam também em plataformas como Reclame Aqui, onde a empresa possui mais de 29,5 mil reclamações e uma nota de 5,8/10, classificada como “ruim”.

Os clientes também têm recorrido ao Procon de diferentes Estados e até mesmo à Secretaria Nacional do Consumidor (Senacon), órgão vinculado ao Ministério da Justiça e Segurança Pública. No ano passado, a Senacon chegou a pedir esclarecimentos à Hurb sobre a não entrega de pacotes contratados durante a pandemia.

Além dos problemas com os clientes, a companhia tem apresentado dificuldades de honrar os pagamentos a hotéis parceiros. Representantes do setor devem se reunir com a empresa ainda esta semana para discutir uma possível solução para o problema.

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“Nosso entendimento é de solidariedade”, afirma Ricardo Roman Junior, presidente da Associação Brasileira da Indústria de Hotéis do Estado de São Paulo (ABIH SP). Segundo ele, os problemas de pagamento começaram a partir do começo do ano.

Companhia diz não poder garantir data específica

Em nota, a Hurb afirma que não pode garantir uma data específica para as viagens no momento da compra e que voos e hotel são definidos “de acordo com a disponibilidade do tarifário promocional”. Segundo a empresa, o pacote seria uma oferta a ser executada dentro do período válido e “não sendo vinculada a um mês ou a qualquer data específica”.

Sobre as reclamações dos hotéis, a Hurb afirma que “está conduzindo, de forma individualizada, um diálogo com cada parceiro de rede hoteleira que fez algum tipo de reclamação, independente da sua natureza.” A empresa ainda alega que o setor do turismo vem enfrentando grande instabilidade “na relação ‘oferta x demanda’ com redução da malha aérea” e destaca a indisponibilidade de tarifas promocionais.

Em meio à onda de críticas, o ex-CEO da empresa, João Mendes, publicou um vídeo onde aparece usando um banner com reclamações contra a Hurb como tapete do escritório da empresa. Já no último final de semana, ele xingou e expôs dados de pelo menos um cliente em um grupo de WhatsApp. Nesta segunda-feira, ele deixou o comando da companhia.

Em sua carta de renúncia, Mendes afirma que as críticas à Hurb “foram erros do ‘João Ricardo Mendes’ e não de uma companhia inteira que é muito maior do que eu”. “Dizer que estou envergonhado é um eufemismo extremo. Meu trabalho como líder é liderar, e isso começa com um comportamento que deixa nosso time e clientes orgulhosos. Não foi isso que fiz e não posso dizer que não vou manter certos princípios sagrados”, escreveu.

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