Quem está por trás da Leitura, que substituiu Saraiva e Cultura como a livraria dos shoppings

Companhia de Minas Gerais foi fundada em 1967 e tem mais de 100 unidades no País; estratégia é manter fluxo de caixa positivo e fechar lojas que não dão lucro no segundo ano

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Foto do author Lucas Agrela
Foto do author Wesley Gonsalves
Atualização:

Com as crises financeiras que levaram a Livraria Cultura à falência e a Saraiva à recuperação judicial, o papel de ser a livraria dos shoppings centers ficou vago e abriu a oportunidade que a livraria Leitura precisava para expandir sua atuação nacional.

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A empresa começou o ano de 2023 com 99 lojas físicas e previsão de abertura de seis unidades - mesmo número de lojas fechadas pela Saraiva neste ano. Para manter a rentabilidade do negócio, todos os anos a companhia analisa os indicadores de desempenho de vendas e fecha a loja menos rentável, normalmente, no seu segundo ano de existência. No Estado de São Paulo, a previsão é terminar o ano com 25 unidades, com uma inauguração em Sorocaba e duas na capital, nos shoppings Plaza Sul e Marketplace.

A história da Leitura começou em 1967. Fundada em Belo Horizonte (MG) pelo jovem Emídio Teles, de 18 anos, o negócio era voltado ao comércio de livros didáticos novos e usados, quase um sebo. A primeira unidade foi na Galeria do Ouvidor, no centro da capital mineira, local conhecido pelo comércio de livros na cidade. Na época, o nome era outro: Livraria Lê.

Inicialmente, a companhia traçou seu plano de expansão dentro do território mineiro, com unidades em cidades importantes do Estado, como Ipatinga, Betim, Contagem, Sete Lagoas, Nova Lima, Governador Valadares, Juiz de Fora e Uberlândia. Em 1975, oito anos depois da inauguração, a livraria mudou de nome e passou a se chamara Livraria Leitura.

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A expansão para além das fronteiras de Minas ocorreu apenas em 2000, com a inauguração de uma unidade em Brasília. Daí em diante, a empresa fincou sua bandeira em vários locais e hoje está presente em 22 Estados, onde emprega cerca de 2.200 funcionários.

Ao contrário do início da livraria, em que vendia apenas livros novos e usados, hoje oferece uma infinidade de produtos aos clientes. No catálogo da empresa, há itens de papelaria, CDs, DVDs, vinis, produtos de informática, brinquedos e games.

O negócio é liderado por Marcus Teles, irmão de Emídio, que está na livraria há mais de 40 anos. Logo que começou a trabalhar na empresa, ganhou participação de 10% como sócio. O modelo, até hoje, é replicado nas unidades: os líderes regionais que se destacam recebem a oferta para se tornarem sócios minoritários da companhia e encabeçar a abertura de uma nova loja.

Leitura, de Minas Gerais, assumiu o posto de maior livraria do País após derrocada da Saraiva Foto: Dione Alves/Livraria Leitura

“A Leitura sempre cresceu com capital próprio. Não temos dívidas, sempre mantivemos o caixa positivo e uma reserva. Mais de 90% dos investimentos são com caixa próprio. Isso permitiu o crescimento em tempos de instabilidade. Neste ano, com o varejo em crise, também devem aparecer novas oportunidades para nosso crescimento”, diz Teles. “No ano que vem, nossa previsão é de abrir mais 10 lojas no País. Já temos o caixa para isso.”

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O presidente da Leitura afirma que o momento atual do consumo, que sofre com erros estratégicos e com o aperto do juro alto, facilitou a negociação de espaços de aluguéis em shoppings por haver menor concorrência. Ainda assim, os espaços são menores do que aqueles antes ocupados por outras livrarias, como Cultura e Saraiva, que chegaram a ter cerca de 3 mil metros quadrados.

O sócio-diretor da Gouvêa Malls, Luiz Alberto Marinho, afirma que a manutenção e o aluguel de lojas dessa dimensão nos shoppings podem tirar a margem de lucro do negócio. As maiores unidades da Leitura têm 1.500 metros quadrados, enquanto outras têm menos de 1.000.

Na avaliação de Jaime Troiano, da Troiano Branding, o processo de expansão da livraria Leitura deve olhar para erros do passado cometidos por outras marcas do setor, que ao longo do anos, acabaram não sustentando seus planos de ampliação da rede, ao adicionar itens que fogem ao mundo da literatura e, segundo Troiano, dispersam os leitores.

Para ele, uma espécie de “vaidade corporativa” levou negócios como Cultura, Saraiva e Siciliano a escolherem endereços e espaços muito maiores do que seriam sustentáveis para o negócio. “Livraria pequena é para quem gosta de ler, grande é para quem gosta de fazer compras”, avalia. “Ser grande, para uma livraria, não significa muita coisa. A livraria tem de ser um lugar comprometido com o desenvolvimento humano.”

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Competição

Segundo Marcus Teles, a venda de livros no Brasil não teve grandes quedas ao longo do tempo. “O que ocorreu foi que algumas redes estavam concorrendo com grandes empresas internacionais da internet que vendem abaixo do preço de custo, com prejuízo, o que não é exatamente permitido por lei.”

Ele se refere a Amazon, que chegou ao Brasil vendendo só livro digital, depois começou a vender o livro físico e passou a comercializar de tudo. “O livro é o ‘boi de piranha deles’”, diz Teles. A Leitura tem operação online, mas o foco é a loja física.

A chegada da empresa ao mercado brasileiro na última década gerou um impacto nas livrarias do País por causa dos livros vendidos a preços baixos. Sem os custos inerentes aos pontos físicos e com venda de todo tipo de produto, a empresa se destaca globalmente como o maior site de venda de livros.

A livraria física confirma sua relevância para o mercado como ponto de visibilidade das obras e experiência do consumidor, que não ocorre da mesma forma na compra online”

Dante Cid, presidente do Sindicato Nacional dos Editores de Livros

Segundo especialistas ouvidos pelo Estadão, a chegada da varejista americana foi um fator que levou as livrarias nacionais a revisarem suas estratégias, e aquelas que não conseguiram um novo rumo para a rentabilidade acabaram fechando as portas ou reduzindo consideravelmente a presença no mercado.

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O papel das livrarias continua importante no Brasil. Mesmo dez anos depois do livro digital, os livros físicos ainda são 9 a cada 10 vendas. “A livraria física confirma sua relevância para o mercado como ponto de visibilidade das obras e experiência do consumidor, que não ocorre da mesma forma na compra online”, diz o presidente do Sindicato Nacional dos Editores de Livros, Dante Cid.

É de olho nessa relevância que se baseia o plano da Leitura para os próximos anos. No ano que vem o objetivo é abrir lojas em Estados onde a livraria ainda não está. Mas a austeridade contábil continuará no centro da estratégia. Teles e os sócios-gerentes da livraria levam muito a sério a gestão de cada unidade, chegando a ficar no balcão para atender os clientes.

“A Leitura vai se manter com os pés no chão e com uma operação muito próxima da gestão, com gerentes e diretores dentro das lojas. Somos livreiros, ficamos no balcão de atendimento das lojas. Por isso, estamos preparados para crescer nos próximos anos”, afirma Teles.

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