Vale, Vivo, Renner, Azul: queda das ações leva empresas a recomprarem papéis para manter valor

Montante estimado de programas lançados na B3 subiu 300% e chegou a R$ 11,4 bi em março deste ano

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Foto do author Lucas Agrela
Atualização:

A forte queda da Bolsa nos últimos meses desencadeou um movimento de recompra de ações por grandes empresas no Brasil para tentar manter o preço dos papéis. Até meados do mês de março, 16 companhias tinham aberto programas de recompras de ações na B3 ante 11 de igual período do ano passado. Em valor, o número teve aumento de mais de 300%, indo de R$ 2,9 bilhões para R$ 11,4 bilhões, segundo estimativa da Economatica, feita a pedido do Estadão.

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O objetivo da operação - adotada por empresas como Vale, Vivo, Renner e Azul - é gerar interesse nas ações para garantir o valor de mercado em fase de baixa da Bolsa, usar os papéis para remunerar a diretoria ou para obter lucro no futuro. Em 2022, foram 71 programas de recompras anunciados, com um valor estimado em R$ 76,2 milhões, salto de quase dez vezes ante 2021. Neste ano, devido ao amplo prazo para a realização da recompra, normalmente de 18 meses, o total de programas abertos passa de uma centena, ou seja, cerca de 20% de todas as companhias listadas.

Em valores, o maior programa hoje em vigor é o da mineradora Vale. Anunciada em abril do ano passado, a recompra de 500 milhões de ações equivale a 10% do total em circulação e é estimada em R$ 41 bilhões (nos valores da época). Gustavo Pimenta, vice-presidente executivo de finanças e relações com investidores da empresa, diz que os papéis recomprados ficam em tesouraria e são posteriormente cancelados. Foram realizados três cancelamentos de ações desde o início do primeiro programa de recompra, em 2021.

“A recompra de ações demonstra nossa confiança no potencial de criação e compartilhamento de valor da Vale e é uma das melhores opções de investimento para a companhia. A Vale já realizou duas recompras de ações desde abril de 2021 e anunciou a terceira em abril de 2022. Esse terceiro programa de recompra havia alcançado 43% de sua totalidade até fevereiro de 2023. Ao todo, os três programas de recompra executados desde 2021 acumularam um total de 683 milhões de ações recompradas. Com isso, os proventos por ação se concentraram em 15%”, afirma.

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Em casos como o da Vale, quando a empresa cancela as ações e reduz a quantidade disponível no mercado, o valor porcentual pago em dividendos por ação sobe. Em outras palavras, quem tem uma ação e recebe R$ 1 em dividendos pode passar a receber um valor maior por causa da redução de ações em circulação. É uma forma de a empresa recompensar o acionista e até elevar o seu valor de mercado. Para Jennie Li, estrategista da XP, o movimento é positivo para os investidores e chega a ser visto como uma forma de remuneração para quem tem ações da empresa na carteira de investimentos.

A operadora Vivo fez movimento similar. Os papéis comprados no ano passado foram cancelados e a empresa já iniciou um novo programa de recompra neste ano. “A robusta geração de caixa da Vivo nos permite entregar uma atrativa remuneração aos acionistas, tanto por meio de dividendos e juros sobre capital próprio como recomprando as nossas ações. Apenas no ano de 2022, recompramos R$ 607 milhões em ações para incrementar o retorno aos investidores”, afirma David Melcon, diretor de finanças (CFO) da Vivo.

Além de cancelar ou remunerar executivos com as ações tiradas do mercado, as empresas podem usar programas de recompra para geração de caixa. “As companhias podem recomprar ações e deixá-las em tesouraria para vender futuramente com lucro”, afirma Isabel Lemos, gestora de renda variável da Fator Administração de Recursos.

Não só empresas de grande porte na B3 têm programas de recompra de ações. A Sinqia, considerada uma Small Cap (empresa de baixa capitalização), também anunciou um programa de recompra de 7,4 milhões de ações, totalizando R$ 118,4 milhões. “Não temos perspectiva de emissão de novas ações porque o preço não vale a pena. Pagamos o valor mínimo de dividendos exigido pela lei porque direcionamos o valor para investimento na própria empresa. Temos 77 mil acionistas e mais de 76 mil são pessoas físicas. Elas sabem que a Sinqia é uma ação de crescimento”, diz Emerson Faria, diretor de relações com investidores da companhia.

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Emerson Faria, diretor de RI da Sinqia, diz que empresa fez aquisições que melhoraram a margem EBITDA do negócio em 2022 Foto: Anna Carolina Negri/Sinqia/Divulgação

Gustavo Harada, chefe de renda variável do escritório BlackBird Investimentos, afirma que a alta da taxa de juros observada desde 2021 no País é um dos fatores que as empresas levam em conta antes de pensar em fazer investimentos mais ousados. “É o custo de oportunidade. A taxa de juro alta encarece um projeto de expansão dos negócios. O juro deve continuar alto, faz sentido ser mais cauteloso. A recompra de ações é um investimento mais seguro nesse cenário macroeconômico complexo”, diz.

Henrique Castro, economista da FGV EESP, fez um estudo sobre as recompras de ações feitas por empresas brasileiras nos últimos anos. A conclusão é que o movimento é um bom negócio para lucrar. “Quando uma empresa fez recompra, houve alta em até três anos. Não foram em todos os casos, mas a média mostra isso”, diz.

Recompra de ação ou investimento em expansão?

Os críticos dos programas de recompras de ações argumentam que as empresas deveriam utilizar o caixa para ampliar sua capacidade produtiva ou adentrar novos segmentos de mercado, desse modo, fomentando a economia e gerando empregos. Essa é a visão do presidente americano Joe Biden, que pressiona o Congresso a quadruplicar o imposto sobre a recompra de ações, que chegaram a quase US$ 1 trilhão em 2022.

O megainvestidor Warren Buffett criticou a posição dos democratas em uma carta para os acionistas da Berkshire Hathaway. “Quando lhe dizem que todas as recompras são prejudiciais para os acionistas ou para o país, ou particularmente benéficas para os CEOs, você está ouvindo ou um analfabeto econômico ou um demagogo eloquente (personagens que não são mutuamente excludentes)”, escreveu.

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Para Gabriela Joubert, analista-chefe do Inter, o investimento para ampliação dos negócios nem sempre é a melhor opção. “É uma troca de caixa por ações, não faz a empresa crescer. É preciso avaliar se o caixa gerado vale ser gasto para expandir a estrutura, mas se o horizonte não for tão favorável, como não é hoje nos Estados Unidos, os empresários não vão expandir operações se não houver expectativa de aumento de demanda. Se a empresa já é líder, por exemplo, pode não haver motivo para expandir a sua capacidade de produção”, afirma.

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