Com mais de três semanas de atraso, a nova fábrica de celulose da Suzano, em Ribas do Rio Pardo (MS), acaba de entrar em operação. Maior linha de produção de fibra curta de eucalipto do mundo, a unidade tem previsão de fabricar 900 mil toneladas neste ano. A partir de abril, ao fim da “curva de aprendizagem” (espécie de fase de testes operacionais) de nove meses, entrará no ritmo pleno da capacidade anual de 2,55 milhões de toneladas por ano. O investimento total no projeto foi de R$ 22,2 bilhões, o maior do País nesse período de dois anos e meio em um empreendimento industrial.
”Em um projeto dessa magnitute, que teve 30 meses de implantação, esse atraso é pouco, é insignificante”, ressalvou o ex-presidente e atual conselheiro da Suzano, Walter Schalka, em entrevista ao Estadão. O executivo, depois de 11 anos à frente da diretoria executiva da companhia, passou o bastão a João Alberto (Beto) Abreu em 1.º de julho. O novo CEO, que veio do grupo Cosan, teve um período de transição de três meses na empresa, a partir do começo de abril, antes de assumir o leme.
Conhecido como Projeto Cerrado, em referência ao principal bioma da região de Ribas do Rio Pardo, o novo empreendimento adiciona 20% à atual capacidade de produção de celulose da Suzano no País, que está pouco acima de 10 milhões de toneladas anuais. A empresa é a líder mundial na produção desse tipo de celulose e exporta a maior parte do que faz. O que fica aqui é usado na fabricação de papéis de imprimir, papel cartão, papéis tissue e outros.
Schalka ressalta que o novo empreendimento tem uma importância significativa na indústria papeleira, para a Suzano, o Brasil e para o mundo. “Foi montado no ‘estado da arte’, tem uma visão ambiental e social única, não usará combustíveis fósseis e ainda exportará para o sistema elétrico 180 MW da energia gerada com a biomassa. Do lado social, fizemos hospital e outras obras para a comunidade local.”
O executivo informa que é a planta industrial de celulose de menor custo-caixa do mundo, de US$ 100 por tonelada, valor 40% abaixo da média atual da Suzano, de US$ 170 a tonelada. O raio médio de transporte da madeira da floresta de eucalipto até a fábrica é de 65 km. A média da companhia, atualmente, é de 201 km. “É a planta mais competitiva do mundo”, diz o conselheiro.
A ideia do projeto surgiu em 2019, relata Schalka, e teve aprovação no conselho administrativo da Suzano em 2021. O tempo até o início da instalação, em janeiro de 2022, foi dedicado aos projetos de engenharia básica e detalhada do empreendimento - que fica às margens da BR-262, em Ribas do Rio Pardo - e ao plantio das florestas de eucalipto na região para suprir a unidade fabril. O município de 23 mil habitantes está 102 km distante de Campo Grande.
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Da produção prevista para este ano, a previsão é comercializar 700 mil toneladas. O executivo diz que o mercado vai absorver esse volume excedente sem dificuldade. “Não imaginamos nenhuma disrupção de preços. A demanda mundial está positiva neste momento”, afirma. Ele diz que na América do Sul não terá nenhuma outra fábrica entrando em operação nos próximos 30 meses. Se confirmados os anúncios de novos projetos, somente de 2028 em diante.
Reinvestimento
O conselheiro da Suzano reafirma que a filosofia da companhia é reinvestir 90% da geração de caixa. Os alvos são tanto aquisições de ativos, como os que ocorreram no período de construção do Projeto Cerrado e os fora do País recentemente (Áustria, 15% da Lenzing, e Estados Unidos, fábricas de embalagens). Ele cita ainda modernização de fábricas existentes, novos plantios ou compra de florestas de eucaliptos (três nos últimos dois anos) e até fábricas novas. “Não estão estão descartadas novas fábricas no futuro.”
O balanço financeiro da empresa, diz, está saudável e garante suporte para o crescimento, orgânico e inorgânico. Ele destaca que a dívida da empresa não subiu muito com o dispêndio no Projeto Cerrado, pois houve uma geração de caixa relevante na empresa. “É a primeira vez que isso ocorre na América do Sul. Fizemos a nova fábrica, compramos ativos da International Paper (no Brasil), fizemos retrofits das fábricas de Aracruz (ES) e Jacareí (SP) e a terceira compra, relevante, de ativos florestais.”
Com a conclusão da fábrica neste mês, o volume de investimentos da companhia vai, naturalmente, ter redução em 2025. Para este ano, o montante previsto é de R$ 17,6 bilhões, um pouco abaixo dos R$ 18,5 bilhões alocados em 2023.
A estratégia de investimentos da companhia, diz Schalka, está centrada em dois pilares: disciplina de alocação de capital e financeira. Em razão disso, afirmou, quando se atingiu um certo patamar de valor no processo de oferta recente pelo controle da International Paper, a Suzano decidiu parar. “Ficou um preço inadequado para nós.”
A empresa leva avante o plano ‘fiber to fiber’, de ganhar participação em mercados de produtos à base de fibra longa - em especial da América do Norte, com árvores naturais - a partir de aplicações de fibra curta da Suzano. Por exemplo, o setor têxtil. Mas também produção de cartões nos EUA, celulose fluff. “Isso cria valor para os acionistas”, afirma. Ele lembra que a Suzano vai inaugurar duas fábricas em 2025: uma de tissue (papéis higiênicos, toalhas, lenço) e outra de celulose fluff (usada na fabricação de absorventes higiênicos femininos, fraldas infantis e geriátricas e lenços umedecidos).
Com vendas de 10,21 milhões de toneladas de celulose e 1,3 milhão de toneladas de papéis em 2023, a Suzano obteve receita líquida de R$ 39,75 bilhões, lucro líquido de R$ 14,1 bilhões e geração operacional de caixa de R$ 11,56 bilhões. A fabricante encerrou o ano com dívida líquida de US$ 11,5 bilhões (R$ 55,6 bilhões). A alavancagem financeira terminou em 3,1 vezes na relação da dívida líquida sobre o Ebtida ajustado na moeda americana no final do ano passado.
Sobre sua nova fase, a de conselheiro, afirma: “Faz pouco mais de uma semana que comecei. Ainda estou ajudando o Beto em algumas coisas, nos detalhes finais da operação da fábrica. Mas todo o comando passou a ser dele e da diretoria”, diz Schalka. De agora em diante, diz, estará olhando a empresa na perspectiva de alocação de capital e de desenvolvimento de pessoas.
Engenheiro formado pelo ITA (Instituto de Tecnologia da Aeronáutica) e pós graduado na FGV-SP, em sua carreira, até chegar à Suzano em 2012, teve passagens pelo Citibank, grupo Maepar, Dixie Lalekla, Dixie-Toga e Votorantim Cimentos.
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