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Herança de Samuel Klein: Justiça de SP arquiva inquérito de disputa entre herdeiros da Casas Bahia

Saul Klein acusava o irmão mais velho Michael de fraudar assinaturas do pai; depois da decisão, advogado de Michael promete processar Saul por calúnia e difamação

Foto do author Carlos Eduardo Valim
Atualização:

A 1ª Câmara de Direito Criminal do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) julgou extinto e determinou o arquivamento do processo em que Michael Klein, primogênito do fundador da Casas Bahia, era acusado por seu irmão, Saul Klein, de supostos crimes de falsidade ideológica e estelionato. A decisão, assinada pelo desembargador Alberto Anderson Filho, foi publicada em acórdão na sexta-feira, 10.

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No processo, Saul acusava Michael de quatro alterações do contrato social da empresa da família, o Grupo CB. Essa empresa ficou com os ativos imobiliários da varejista Casas Bahia depois que ela teve o seu controle vendido pelos Klein, em 2009, para o Grupo Pão de Açúcar, assumindo o nome de Via Varejo - na década seguinte, ela ainda acabou sendo controlada pelo grupo francês Casino antes de voltar a ter Michael Klein de volta como seu principal acionista em 2019.

Segundo a acusação, as quatro mudanças societárias no Grupo CB teriam causado a diluição de capital e o cancelamento de parte das ações do patriarca Samuel Klein, morto em novembro de 2014, permitindo a Michael se tornar o maior acionista do grupo, além de repassar mais quotas do negócio a empresas que seriam ligadas a seus filhos. Assim, alega que Saul teria ficado com herança inferior em relação a quel teria direito.

Michael Klein, dono do grupo CB e maior acionista da Casas Bahia  Foto: Felipe Rau/Estadão

Os advogados de Saul também alegavam que essas alterações teriam acontecido por meio de documentos com indícios de falsificações de assinaturas de Samuel Klein, e que até o testamento do empresário estaria sob suspeitas de fraude, segundo laudos técnicos encomendados por eles.

A nova decisão, do dia 10, declara que os casos pelos quais Michael é acusado pelo irmão já estariam prescritos. Os advogados de Saul agora dizem que, mesmo que o seu irmão não possa ser condenado, os efeitos de qualquer possível falsificação em doações ou no inventário de Samuel deveriam ser anulados.

Esse acórdão referenda um habeas corpus pedido pelos advogados de Michael e que foi acolhido pelo TJ-SP no mês passado, no dia 15 de abril. Os desembargadores consideraram que a punibilidade do empresário pelos crimes a ele atribuídos por Saul está prescrita, uma vez que os ilícitos sob suspeita somam penas máximas de cinco e seis anos de reclusão e teriam sido praticados antes de fevereiro de 2014.

“Tendo em conta que tanto o possível estelionato como as possíveis falsificações teriam ocorrido há mais de 10 anos e considerando que o paciente, contra quem foi requerida a instauração do inquérito tem mais de 70 anos, eventuais ações penais estariam irremediavelmente prescritas, pois o prazo prescricional para o paciente é contado pela metade”, escreveu o relator.

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Após o habeas corpus, o Ministério Público, provocado pelos advogados de Saul, alegou obscuridade no acórdão anterior e pediu embargos de declaração, requisitando “aclaramento” da decisão. Frente a isso, o novo documento reitera que foi julgada extinta a punibilidade de Michael e o arquivamento do inquérito contra ele.

“Com a determinação do arquivamento, não cabe mais nenhum recurso”, afirma o advogado Daniel Bialski, representante de Michael. “Este processo nunca teve justa causa e os desembargadores reconheceram que o fato era extemporâneo, e sem razão para continuar.”

Segundo nota enviada pelo advogado Alberto Toron, que representa Saul, o inquérito policial está trancado em relação a Michael Klein, pela ocorrência da prescrição, “a questão ali delimitada não pode ser objeto de apuração, sem prejuízo de que outros potenciais fatos criminosos, não contidos nessa investigação, possam ser objeto de novo inquérito”. Dessa forma, o trancamento do inquérito tem relação exclusiva a Michael Klein, “que obviamente não aproveita aos seus filhos, que poderão continuar a ser investigados pelos crimes lá apontados”, uma vez que eles também teriam sido beneficiados pelas alterações nos documentos com assinatura de Samuel.

Segundo o advogado Ricardo Zamariola Junior, do escritório Luc Advogados, que também defende Saul, a decisão não significa que “os atos questionados sejam válidos”. “São atos nulos de pleno direito, porque não foram praticados pelo senhor Samuel, e essa nulidade deverá ser reconhecida no inventário e em demandas cíveis que serão instauradas para isso por Saul”, diz.

Desdobramentos

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O advogado João da Costa Faria, advogado de longa data de Michael e que representou por décadas Samuel Klein, também afirmou que agora vai mover processo de calúnia e difamação contra Saul. “Vou entrar com ação de perdas e danos contra o Saul, em razão de sua estultice em oferecer esse tresloucado inquérito policial”, diz.

“Este inquérito fictício servia apenas para dar suporte aos processos que foram abertos nos Estados Unidos”, afirma Faria. Ele se refere a duas ações movidas pelos advogados de Saul com pedidos de revelação de informações no país. Eles entraram com um pedido em Nova York para que bancos baseados nos Estados Unidos revelem recursos que não teriam sido incluídos no inventário de Samuel. Já em Delaware, pediram esclarecimentos sobre transferências de ativos para empresas que pertenceriam a membros da família.

Saul Klein, filho do fundador da Casas Bahia, Samuel Klein Foto: Divulgação

A disputa familiar envolve ainda uma série de outros processos. Há até uma tentativa de reconhecimento de paternidade por parte da família de um suposto herdeiro adicional de Samuel.

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O foco de Saul está em diversas reclamações de que recursos do pai teriam sido escondidos por Michael e que bens recebidos pelo primogênito deveriam ser distribuídos igualitariamente entre os filhos, incluindo ações da varejista Via Varejo, o grupo que incorporou a Casas Bahia depois que a operação foi comprada pelo Grupo Pão de Açúcar e que desde o ano passado adotou de volta o nome Grupo Casas Bahia.

Nova acusação

Ao mesmo tempo em que contesta os recursos e ativos que seu irmão recebeu de seu pai e que alega que o pai teria mais bens do que o listado no seu inventário, Saul tem sido acusado por diversas partes na disputa pelo testamento de Samuel Klein de ter alienado fiduciariamente - ou seja, repassado para terceiros - os direitos que poderia ter à herança.

Segundo Zamariola, advogado de Saul, não houve venda de quinhão, mas sim uma “mera modalidade de garantia de obrigações”, e o empresário permanece como titular na disputa pela herança. O contrato prevê a alienação como garantia de dívidas de Saul.

A acusação é feita tanto pelos defensores de Michael quanto pelos representantes do suposto herdeiro de Samuel, que seria fruto de uma relação fora do casamento do empresário. Chamado Moacyr Ramos de Paiva, e morto em 2021, o possível herdeiro pediu em 2011 o seu reconhecimento por parte de Samuel, e depois exigiu ser incluído na herança. Agora, a sua família continua requisitando uma parte do quinhão.

No dia 2 de abril, o advogado do espólio de Moacyr escreveu, em petição para 4.ª Vara Cível da Comarca de São Caetano do Sul (SP), que Saul estaria agindo como laranja da empresa 360 Graus Intermediação de Negócios Ltda, que teria assumido os direitos da parte que o herdeiro poderia conseguir no inventário. Sediada em Barueri (SP), segundo o seu contrato social, a empresa tem como sócios ex-executivos da Casas Bahia na época que em Saul era responsável pelo departamento de compras da varejista.

Procurado, o advogado de Moacyr, não respondeu à reportagem. Já Faria, advogado de Michael, afirmou que “Saul não poderia ceder a ninguém os seus direitos sem oferecer primeiro aos outros herdeiros”.

O contrato entre Saul e a empresa 365 foi registrado, no dia 11 de abril de 2023, no 1.º Oficial de Registros de Títulos e Documentos da Comarca de São Paulo, e prevê a alienação fiduciária em garantia dos direitos hereditários na sucessão de Samuel Klein.

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A informação de que Saul teria alienado os seus direitos também já havia sido levantada por Márcio Casado, ex-advogado de Saul, nos autos do inventário. Casado não representa mais o seu ex-cliente e cobra o pagamento de honorários.

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