Segundo o presidente da associação de refinadores independentes de petróleo Refina Brasil, Evaristo Pinheiro, o Brasil não será autossuficiente em combustíveis, mesmo se conseguir realizar os projetos para completar as obras da Refinaria do Nordeste (Rnest, antiga Abreu e Lima) e do polo Gaslub (antigo Complexo Petroquímico do Rio de Janeiro – Comperj).
Esses projetos vão adicionar 250 mil barris de produção por dia aos atuais 650 mil barris. Mas a defasagem poderá ser de 1 milhão em 2035. Por isso, não faria sentido o governo promover que a Petrobras pratique preços abaixo do mercado internacional, estrangulando as refinarias independentes, uma vez que elas continuarão sendo necessárias no futuro para garantir o abastecimento.
Para ele, o setor continuará passando por “maus bocados” mesmo depois de a Petrobras aumentar os preços da gasolina no início de julho, a primeira vez em mais de oito meses. A defasagem para os preços internacionais caiu para uma faixa em torno dos 10%, frente aos cerca de 20% que eram praticados antes do reajuste, de acordo com as associações do setor. “Havia a possibilidade de atrair R$ 60 bilhões de investimentos privados de refino que não estão no PAC (Programa de Aceleração do Crescimento)”, diz Pinheiro, ao Estadão, citando a possibilidade de negócios se a Petrobras não sufocar as refinarias independentes.
Já é possível perceber alguma mudança na política de preços da Petrobras com a troca do seu comando?
A política de preços não mudou da transição da presidência de Jean Paul Prates para a de Magda Chambriard. A empresa continua descolada dos preços internacionais. Mesmo que a diferença para os preços internacionais tenha baixado de quase 20% para em torno de 10%, ainda existe uma defasagem brutal. Ainda é muito difícil para as refinarias independentes operarem nessas condições, porque a margem de lucro do refino é muito baixa. A Petrobras pratica preços anticoncorrenciais. Se ela fosse só uma refinaria, não conseguiria cobrar isso. Mas ela usa a margem de lucro do petróleo para estipular preços de refino, algo que é vedado pela Lei das Estatais.
De que forma essa lei não permite a prática?
Uma empresa estatal não pode fazer política pública. Isso está na lei. É uma catástrofe. A gente pressiona para que isso não aconteça, mas não muda nada.
Mas essa diminuição da defasagem para em torno de 10% não melhorou a situação?
Com a diferença de 10%, estamos passando por maus bocados. Quando estava em 20%, era uma catástrofe. O pior que essa estratégia é sem racionalidade. O governo está buscando espaço fiscal, mas está subsidiando a gasolina. E isso não é para ajudar o pobre, como gosta de dizer o presidente Lula. As pessoas com mais poder aquisitivo estão ganhando subsídio no combustível. É uma forma de subsídio sem passar pelo orçamento. Isso congela qualquer plano de investimentos das empresas privadas no setor. Ninguém vai investir sem saber se a política vai influenciar no mercado.
Como o governo perde com essa estratégia?
É um sistema em que todos os lados perdem. Além de não receber mais dividendos com a prática de preços de mercado, a empresa privada deixa de investir. Além disso, o Brasil está cada vez mais dependente de importações no setor. Hoje a produção nacional, por dia, é de 650 mil barris. Pelas minhas expectativas de que a transição energética não será alcançada plenamente até 2035, a defasagem será de 1 milhão de barris neste ano. O Brasil não será autossuficiente em refino de petróleo, mesmo com todo o investimento em completar refinarias como a Rnest e a Comperj. Esses projetos vão ampliar em 250 mil barris a produção do País. E, tornando o ambiente hostil para investimentos, o Brasil não vai conseguir atender à sua demanda. Havia a possibilidade de atrair R$ 60 bilhões de investimentos privados de refino que não estão no PAC (Programa de Aceleração do Crescimento). O que pedimos, para investirmos, é acesso a petróleo, preço competitivo, e que o formador de preço venda a preços de mercado.
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E, dado o tamanho desses projetos do PAC, existe o risco de que eles não sejam completados?
Isso aconteceu no passado, e não só por causa da corrupção. As refinarias grandes são complexas de se fazer. São obras difíceis. Por isso, defendemos pequenas e médias refinarias. E também elas trazem mais facilidade para serem convertidas em biorrefinarias no futuro.
Como o setor está se virando no momento?
A gente vai se virando, tentando buscar petróleo em outros lugares, passamos a calibrar a produção, para fazer produtos que estejam mais rentáveis, e buscamos exportar mais. Quando a defasagem fica muito alta, a saída é reduzir a produção.
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