PUBLICIDADE

Publicidade

As formas ancestrais de produzir vinho natural ganham novos fãs

Bebida produzida com uvas orgânicas, sem herbicidas, e às vezes até esmagadas com os pés, tem visto aumento da procura nos EUA, mas sofre com falta de regulamentação

Por Associated Press

Sonoma, Califórnia - O vinho produzido de forma ancestral está ganhando novos fãs. O vinho natural - que enfatiza a sustentabilidade e o processamento mínimo - está despertando um interesse crescente nos Estados Unidos, embora o consumo geral de vinho tenha diminuído desde 2015, de acordo com a IWSR Drinks Market Analysis, uma empresa de pesquisa.

PUBLICIDADE

Embora os vinhos naturais e outros vinhos sustentáveis tenham representado menos de 1% das vendas em 2021, a demanda aumenta mais rapidamente do que a categoria de vinhos como um todo, de acordo com o site de entrega de bebidas alcoólicas Drizly.

Em geral, o vinho natural é produzido com uvas orgânicas colhidas à mão que não foram pulverizadas com herbicidas ou pesticidas. Depois de esmagadas - às vezes com o pé, como faziam os antigos romanos -, elas são fermentadas naturalmente sem adição de água, fermento ou outros ingredientes. Alguns produtores de vinho natural adicionam sulfitos, uma substância química encontrada naturalmente nas uvas, como conservante; outros não. Alguns filtram seus vinhos; outros os deixam turvos e cheios de sedimentos.

O resultado são vinhos terrosos, saborosos e menos previsíveis do que muitos dos vinhos feitos por grandes produtores.

Estagiários da Pax Wines, em Sebastopol, Califórnia, esmagam as uvas orgânicas com os pés para produção de vinho natural Foto: Haven Daley/AP

“Na primeira vez que você prova o vinho, percebe-se que ele está vivo”, disse John Keller, proprietário e enólogo da Neu Cellars, no norte de Michigan.

Mas o vinho natural precisa superar alguns obstáculos que podem estar impedindo seu crescimento. Ao contrário do vinho orgânico - que deve ser certificado pelo governo -, o vinho natural não tem uma definição nos EUA. Não é fácil encontrá-lo, pois a maioria dos vinhos naturais não tem a palavra “natural” em seus rótulos.

“Natural soa bem, mas o vinho convencional também é bastante natural”, disse Anita Oberholster, professora do Departamento de Viticultura e Enologia da Universidade da Califórnia, em Davis. “Se a ideia de vinho natural vai crescer, devemos pesquisar e definir essa ideia.”

Publicidade

Vinhos naturais vêm de uvas orgânicas, cultivadas sem uso de herbicidas  Foto: Haven Daley/AP

Keller, que é formado em bioquímica, começou a trabalhar para um grande produtor de vinho na Califórnia. Mas ele ficou desiludido com toda a manipulação química necessária em cada garrafa. Há dezenas de aditivos usados regularmente no setor de vinhos, incluindo gelatina, pó de carvalho e claras de ovos.

Em 2019, Keller e seu pai abriram a Neu Cellars para se concentrar na produção de vinhos naturais. No ano passado, eles produziram 3 mil garrafas.

A produção de vinhos naturais é “100% assustadora”, disse Keller. Ele só tem a chance de praticar uma vez por ano, e não pode recorrer a aditivos se as coisas derem errado.

“É como a vida acontece. Não se pode realmente controlá-la. Você só precisa dar a ela as melhores condições para obter o melhor resultado possível”, disse.

O vinho natural não é tanto uma moda passageira quanto um retorno à tradição, disse Erin Coburn, proprietária do Minimo, um bar de vinhos naturais em Oakland, Califórnia. Em alguns países, como a Geórgia, os produtores de vinho nunca deixaram de fazer vinho natural; eles ainda fermentam as uvas nos potes de barro em forma de ovo que usam há milhares de anos.

Erin Coburn, dona da loja de vinhos Minimo, na Califórnia Foto: Haven Daley/AP

Mas outros dizem que a linha que separa os vinhos naturais dos convencionais é muito tênue, especialmente para os vinhos mais sofisticados, feitos com boas uvas.

Muitos aditivos, como a levedura - que ajuda na fermentação - são substâncias naturais que já são encontradas nos vinhedos, disse Oberholster. E muitos vinhos convencionais são produzidos sem aditivos.

Publicidade

Alguns membros do setor gostariam que fossem adotados padrões para o vinho natural. Foi o que aconteceu na França, onde o setor de vinhos aprovou o rótulo “vin method nature” e o processo de certificação em 2020. Mais de 430 safras usaram o rótulo desde então, de acordo com a União para a Defesa dos Vinhos Naturais.

Brian Gelb, vice-presidente de vinhos da Total Wine, uma rede de varejo com 257 lojas nos EUA, tem adicionado vinhos naturais às prateleiras das lojas nos últimos dois anos para atender à crescente demanda. Mas ele não tem certeza de quanto do estoque da Total Wine já era considerado “natural”.

Vinhos naturais à venda na Minimo Wino Shop Foto: Haven Daley/AP

“Eu gostaria apenas de ter um conjunto consistente de termos e frases que possam ser universalmente compreendidos”, disse Gelb.

Anthony Zhang, cofundador e CEO da Vinovest, uma empresa de investimentos em vinhos, disse que algumas marcas de vinho estão se aproveitando da falta de padrões e usando imagens naturais sem serem transparentes sobre como definem “natural”.

Isso pode enganar os consumidores, que geralmente pagam mais por vinhos naturais porque eles são produzidos por produtores menores. O Absentee Red, uma mistura de vinho tinto natural da Califórnia, custa cerca de US$ 26 por garrafa. A Vivino, uma loja de vinhos online, diz que garrafas semelhantes de vinho convencional custam a partir de US$ 14.

Ainda assim, os produtores de vinho nem sempre aceitam bem os padrões, que vêm com custos e regras significativos. Keller usa uvas orgânicas, mas diz que não consegue justificar o custo de inspeções repetidas para obter um rótulo orgânico.

Cheryl Stanley, professora sênior de gestão de alimentos e bebidas da Universidade de Cornell, disse que a padronização seria um desafio, pois há muitas percepções sobre o que torna o vinho “natural”. Ela questiona se algum vinho é realmente natural; afinal, há intervenção humana em cada etapa, desde a forma como as uvas são plantadas até a data em que são colhidas.

Tudo Sobre
Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.