Quem é o guitarrista da banda Blood Monday que se tornou o 1º presidente brasileiro da Volkswagen

No comando da montadora no Brasil há seis meses, Ciro Possobom se divide entre duas bandas: uma criada para shows exclusivos nas fábricas e outra que se apresenta em bares

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Foto do author Cleide Silva
Atualização:

A banda formada por sete integrantes subiu ao palco montado no pavilhão do Expo SP, na capital paulista, e abriu o show com a vibrante Rock and Roll All Nite, do Kiss.

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A plateia de cerca de 700 funcionários da Volkswagen do Brasil, presente em um evento de premiação anual do grupo, ficou curiosa. Aquele grupo não estava na programação. Como em anos anteriores, a agenda previa apresentações apenas das quatro bandas formadas por trabalhadores das três fábricas de automóveis e uma de motores no País.

A apresentação surpresa foi ideia do então vice-presidente de Finanças e Estratégias de TI, Ciro Possobom, que quatro meses depois assumiu a presidência da Volkswagen, o primeiro brasileiro a ocupar o cargo em 70 anos da montadora no País.

Depois da abertura, Possobom tocou seus solos em sucessos das bandas Capital Inicial (A Sua Maneira), Paralamas do Sucesso (Meu Erro) e Barão Vermelho (Pro Dia Nascer Feliz).

A estreia da banda batizada de Vibes at Work VW contou, além de Possobom, com os executivos Henrique Mendes Araújo, diretor de Relações Institucionais e Governamentais (vocal); José Carlos Pavone, Head de Design para a América do Norte e América do Sul (guitarra); Fabrício Valério, gerente executivo de Planejamento de Manufatura na América do Sul (bateria) e Douglas Pereira, vice-presidente de Recursos Humanos (contrabaixo). Gabriela Ramos Paterlini, da área de Compras, e Pedro Danthas, fotógrafo que atende o grupo, fizeram participações especiais como vocalistas.

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Ciro Possobom, presidente da Volkswagen, toca guitarra desde os 13 anos  Foto: Tiago Queiroz/Estadão

Possobom chegou à companhia alemã em 2019, depois de passar mais de duas décadas nas empresas da aliança Renault/Nissan, onde trabalhou no Brasil, na França e no Japão. Em 2022, foi promovido a diretor de Operações e, em março deste ano, assumiu a presidência.

“Foi muito bacana tocar para os funcionários; ao final, muitos vieram me abraçar e tirar fotos”, lembra o executivo. Roqueiro desde os 13 anos, quando criou sua primeira banda, ele gostou do resultado e quer manter o grupo.

Para a próximo evento, no fim do ano, o executivo busca outro vocalista. Uma das opções é promover testes para escolher alguém entre o pessoal das fábricas. Mas não é só nas festas da firma que ele toca.

Atualmente, Possobom participa da banda Blood Monday, com seis integrantes, sendo só ele da Volkswagen. O grupo faz apresentações às segundas-feiras numa escola de música, na Vila Mariana. Apesar da vida agitada, faltar ao show só se for por motivo muito urgente. “No domingo à noite, sento no sofá, pego a guitarra e decido qual será o solo do dia seguinte.”

O presidente da Volkswagen também faz shows aos finais de semana, normalmente em eventos de amigos. O último foi em 16 de setembro, no Stones Music Bar, na Vila Prudente. No repertório, músicas que vão de Bon Jovi e Skid Row a Van Halen e AC/DC. “É mais uma diversão, somos amadores”, diz.

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Banda Vibes at Work VW, criada por Possobom (segundo à esq.) fez sua estreia em evento da empresa Foto: Divulgação/Volkswagen


Piano aos sete anos

Seu primeiro contato com instrumentos foi aos sete anos, quando a mãe o colocou para aprender a tocar piano e, depois, órgão. Aos 13, optou pela guitarra e logo montou a banda de rock Utopia, com amigos de Curitiba (PR), onde nasceu. A mãe apoiou, cedendo a sala da casa para os ensaios.

Dos 17 aos 18 anos, tocou em shows de uma cantora profissional da cidade, mas foi demitido porque faltava aos ensaios às quartas-feiras. “Eu trabalhava no comércio de dia e estudava à noite; só podia ensaiar aos sábados à tarde”, conta Possobom, que na juventude exerceu várias atividades, incluindo as de cortador de grama e auxiliar de serviços gerais.

Eu acho que a música conecta as pessoas e minha intenção é deixar o Ciro presidente mais humanizado, sem a barreira da hierarquia

Hoje com 51 anos e presidente da terceira maior fabricante de veículos no País (em 2022, foram 346,4 mil unidades), Possobom vê na música uma forma de se conectar com as pessoas. Seu antecessor, o argentino Pablo Di Si, que na juventude foi jogador de futebol, usava o esporte para essa aproximação e costumava jogar bola com os funcionários.

“Eu acho que a música conecta as pessoas e minha intenção é deixar o Ciro presidente mais humanizado, mais próximo das pessoas. Não precisa ter formalidade”, diz Possobom. “Acredito que, sem a barreira da hierarquia do cargo, podemos ser mais ágeis, o que vai ajudar nos processos.”

Volta ao lucro

Com essa visão e com sua expertise em finanças, ele pretende manter a Volkswagen no azul, condição que a empresa retomou em 2021, após mais de uma década de prejuízos. Também vai coordenar o início da produção do primeiro carro eletrificado da marca no Brasil, começando com um híbrido flex em data ainda não divulgada.

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O grupo trabalha com um plano de investimento de R$ 7 bilhões entre 2022 e 2026, montante que deverá ser ampliado para incluir o projeto do híbrido flex. Para os dois anos seguintes, a previsão é de mais € 1 bilhão (cerca de R$ 5 bilhões), segundo informações do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC, que negocia o novo plano com a companhia.

Depois de tocar piano e órgão, guitarra virou a paixão do presidente da Volkswagen Foto: Divulgação/Volkwagen

Mais velho entre quatro irmãos de uma família de classe média, Possobom sempre estudou em escola pública. Aos filhos, seu pai deixou claro que, quem quisesse fazer curso superior teria de entrar na Universidade Federal do Paraná (UFPR), pois não havia outra opção.

E foi lá que ele conseguiu uma vaga após concluir o curso de eletrotécnica em uma escola técnica. “Eu nem gostava (dessa profissão), mas a escola era muito boa”, conta ele. Na UFPR, escolheu Administração de Empresas. Depois fez pós-graduação e MBA em Finanças pelo IBMEC, sempre na cidade natal. Até então, não pensava em sair de Curitiba.

Segunda banda

Após a dispensa do grupo profissional, Possobom criou sua segunda banda, que foi abandonada no início dos anos 2000 quando foi convidado para trabalhar na fábrica da Renault, então recém-inaugurada em São José dos Pinhais, na Grande Curitiba. Vendeu a guitarra e não tocou mais por uma década e meia.

Naquele período, Possobom trabalhava no fundo de pensão da estatal Itaipu e a montadora francesa lhe ofereceu uma vaga na área da Tesouraria, com salário inferior. Disposto a enfrentar o novo desafio, aceitou o convite, mesmo após ouvir do pai que “não deveria sair de uma empresa como a Itaipu para trabalhar em uma que ninguém ouviu falar”.

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Começou como supervisor e, em seis meses, foi promovido a gerente. A partir daí, escalou degraus mais altos no grupo francês. Em 2005, foi trabalhar na sede da Renault, na região de Paris, acompanhado da família, então formada pela esposa e um filho de dois anos. “A recepção foi ruim, pois eu era um cara de fora, não falava francês direito e o inglês era médio; me deram um trabalho que poderia ser feito por um estagiário”, lembra.

O curitibano foi mostrando seu talento e chegou ao posto de tesoureiro para a Europa, responsável por 400 filiais. Três anos depois, voltou ao Brasil como subdiretor de Finanças, num momento em que a Renault acumulava dívidas.

“Nossa equipe fez um trabalho tão legal que, na crise de 2008, éramos a única empresa do grupo no mundo que tinha dinheiro em caixa e até emprestamos para a matriz”, conta ele. Por esse desempenho, aos 37 anos ganhou o prêmio O Equilibrista 2009, do Instituto Brasileiro de Executivos e Finanças (Ibef-PR), uma espécie de Oscar para o setor financeiro.

Em 2012, foi chefiar a divisão financeira da unidade de baterias da Nissan, no Japão, a convite do executivo franco-brasileiro Carlos Ghosn, na época um guru do setor automotivo e comandante da aliança Renault/Nissan/Mistsubishi. Mesmo pressionado por familiares para não ir (o acidente nuclear em Fukushima tinha ocorrido no ano anterior), convenceu a esposa sobre mais esta oportunidade e seguiram para lá, já com duas crianças.

De volta ao rock

Foi nessa estadia no Japão que se uniu a dois amigos, um americano e um indiano, e criou uma mini banda que se apresentava em um “bar esquisito, próximo a uma estação de metrô”, às quintas-feiras, após o trabalho.

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Possobom afirma que aprendeu muito com Ghosn e também sobre carros elétricos, mas três anos depois retornou à França como vice-presidente da Renault global, cuidando de várias parcerias e programas, inclusive o da compra da escuderia Lotus, que levou a Renault de volta à Fórmula 1.

Foram mais 3 anos e meio no país, e a família decidiu retornar ao Brasil, dessa vez com Possobom como vice-presidente da área de Finanças da Nissan para a América Latina. Ficou no cargo pouco mais de um ano até ser sondado por um headhunter para uma vaga de vice-presidente de Finanças e Estratégias de TI na Volkswagen do Brasil e América do Sul.

Como sempre, consultou familiares e amigos e ouviu que a empresa alemã estava com dificuldades e perdendo muito dinheiro. Ele conta que realmente ficou assustado ao ver os resultados da montadora, mas, num trabalho conjunto com Pablo Di Si, que comandava o grupo na América do Sul, e uma “boa equipe de profissionais”, os resultados positivos voltaram a partir de 2021.

Deixar de ser tradicional

Atualmente, além da transformação tecnológica e energética da empresa, que ele quer endereçar cuidando do negócio, dos empregos, das pessoas e da cadeia do setor, Possobom trabalha com a transformação da própria Volkswagen.

Campanha polêmica com Elis Regina recriada digitalmente colocou empresa em foco  Foto: Volkswagen/Reprodução

“Somos uma empresa muito tradicional em seus processos, e precisamos mudar, acelerar, tomar decisões mais rápidas”, afirma ele, que já vê uma companhia mais ágil do que há três anos, processo que também ocorre após a matriz ter dado mais autonomia à subsidiária brasileira.

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A decisão de voltar ao meio musical roqueiro ocorreu após a Volkswagen retomar patrocínio ao Rock in Rio 2022, evento que já havia patrocinado em 2011, 2013 e 2015 e que será mantido em 2024. Neste ano, a companhia apoiou a primeira edição do The Town, em São Paulo.

Ele reforça que, independentemente de seu gosto pessoal, a empresa acredita que os eventos musicais são importantes e dão bom retorno de visibilidade. No The Town, por exemplo, a marca somou 155 milhões de visualizações de suas campanhas nas redes sociais.

A campanha publicitária dos 70 anos da marca, que colocou a cantora Maria Rita ao lado da mãe, por meio de inteligência artificial, gerou polêmica em todo o País. “Eu achei bacana a discussão, mas o mais interessante foi ver milhares de jovens e pessoas de mais idade cantando a música Como Nossos País quando a campanha aparecia nos nossos telões no The Town.”


MATÉRIA ATUALIZADA EM 29/12/2023 COM INCLUSÃO DE VÍDEO COM APRESENTAÇÃO DE CIRO POSSOBOM EM EVENTO DE FIM DE ANO

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