RIO - A Neoenergia decidiu se antecipar à aprovação do marco regulatório da geração eólica offshore e iniciou há dois meses as medições do vento e do mar do seu projeto eólico offshore no litoral Norte do Estado do Rio de Janeiro, instalando no local um inédito sistema com certificação internacional, o LiDAR (sigla em inglês para Light Detection and Ranging), com classificação máxima de desempenho nível três. A ideia é se preparar para as futuras licitações que irão ocorrer no País, disseram executivos da companhia ao Estadão/Broadcast.
Foram necessárias dez horas para transportar o sensor flutuante do cais do Porto do Açu, no município de São João da Barra, até o local de instalação em alto-mar, a cerca de 40 quilômetros da costa. O LiDAR fica protegido por uma boia com quase três metros de diâmetro. Entre outras funções, o sensor é capaz de medir remotamente, por feixes de laser, a velocidade e a direção do vento, a partir da movimentação de partículas do ar, em faixas que variam de 10 a 300 metros de altura.
“Também é possível obter informações relacionadas a correntes marítimas, aspectos das ondas, temperatura da água do mar, pressão e umidade, entre outras referências”, informou a diretora-executiva de Renováveis da Neoenergia, Laura Porto.
O conjunto de aparelhos tem quase 7,5 metros de altura, da base da quilha até a ponta da antena, e conta também com módulos de placas solares, entre outros recursos. Com o LiDAR, a Neoenergia terá acesso, via satélite, a relatórios específicos sobre as condições do vento e do mar da região, com dados transmitidos em tempo real pela internet.
Dona de 4 gigawatts (GW) em empreendimentos de energias renováveis no Brasil, a Neoenergia, planeja instalar no longo prazo mais 9 GW em três parques eólicos na costa do País, cada um com 3 GW cada um, localizados no Ceará, Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul. A medição no Rio de Janeiro deve durar pelo menos um ano, de acordo com Porto, com chances de se estender por mais um ano ou mais.
“Vamos permanecer medindo porque, pela experiência que a gente tem no onshore (eólica em terra), um ano é diferente do outro. Vai ser uma decisão que tomaremos depois, para ver se permanece, se o ano 1 é diferente do ano 2. Isso vai reduzir incertezas, e certamente esses dados serão estratégicos”, afirmou Porto.
Tão estratégicos que nem os primeiros resultados serão divulgados, ou mesmo os investimentos realizados para a medição. “O LiDAR é um marco relevante, porque ele materializa o ponto de partida, o que é super importante na construção da eólica offshore”, explicou. “Um bom projeto tem que ter dados medidos localmente, além de satélite e outros dados para fazer a correlação e reduzir as incertezas”, complementou.
Leilão
De acordo com o diretor de Hidráulica e Offshore da Neoenergia, Marcelo Lopes, as medições no Rio de Janeiro são fundamentais para avaliar os melhores locais para os investimentos que serão feitos quando o marco regulatório for aprovado e o governo sinalizar com os leilões de áreas.
Segundo os executivos, uma das exigências nesses leilões deverá ser pelo menos um ano de medição dos ventos do projeto, como ocorre em outras licitações pelo mundo.
“Hoje, o que todo mundo tem são os dados de satélite, e com essa informação é possível traçar alguma estimativa. O que se sabe muito é sobre o litoral Nordeste, ali tem potencial tremendo de vento onshore e offshore, e o Sul também. O litoral do Rio de Janeiro, pelos dados do satélite, é uma região que tem bom potencial, não tão bom como no Nordeste, mas que tem um bom potencial, e por isso a gente resolveu medir aqui, para ter maior certeza em relação a esses dados”, disse Lopes.
A escolha do Rio de Janeiro para implantar um parque eólico offshore, segundo os executivos, se deve em grande parte à sinergia que poderá ser exercida com a indústria de óleo e gás, e à proximidade com o centro de consumo de energia elétrica do País. Projetos de hidrogênio, geralmente associados aos parques eólicos offshore, também estão nos planos da Neoenergia.
“No longo prazo, certamente o hidrogênio será o objetivo. A ideia é que a coisa seja realmente para fornecimento de energia, apostando inclusive na eletrificação da economia”, disse Porto.
A Iberdrola, controladora na Neoenergia, já tem parques eólicos offshore em operação e outros em construção e vem dando todo apoio para sua subsidiária brasileira explorar a tecnologia. A empresa espanhola planeja investir € 41 bilhões até 2026, com 15% desse total destinado à América Latina.
A empresa não abre os investimentos no Brasil em eólicas offshores, mas, segundo os executivos, existe apetite no longo prazo para a execução dos projetos, que ainda dependem do marco regulatório. Depois de ter sido aprovado na Câmara, o texto aguarda o Senado. “A gente acredita bastante que (a eólica offshore) será uma história de sucesso como foi o onshore (terra)”, declarou a diretora, estimando que o primeiro aerogerador no mar só deve virar realidade na próxima década.
Porto ressaltou que a indústria para fornecimento de equipamentos eólicos, no caso dos parques em terra, se desenvolveu bastante nos últimos anos, puxada principalmente pelos incentivos do Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). Mas para atender a indústria offshore, mais sofisticada e de maior porte, o teor nacional deverá ser mais baixo. Para ela, o marco regulatório deve estar claro e com premissas compatíveis, e será o primeiro passo para o governo organizar o leilão de áreas.
“Se o marco sair este ano, pode ser que se faça o leilão, mas acho que ainda tem muita coisa para ser feita. O projeto está no Senado, depois vai sair o decreto, depois vão ser as resoluções, tem ainda as DIPs (declarações de interferências prévias), que envolve vários ministérios e várias instituições. Tem muito dever de casa ainda para fazer antes do leilão de áreas”, concluiu.
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